13/07/2011 - 21:00
Dá para contar nos dedos das mãos as marcas genuinamente brasileiras que conseguiram passar de meras fábricas de fundo de quintal a montadoras reconhecidas no mercado nacional. A Troller, de Horizonte, cidade a 37 quilômetros de Fortaleza, a capital do Ceará, é uma delas. Fundada em 1994, pelos irmãos Bill e Rogério Farias, a companhia quase quebrou. Sob a direção do cearense Mário Araripe, que comprou a montadora por R$ 600 mil em 1997, chegou a comercializar 1.020 unidades, em 2004.
Troller T4: a Ford manteve as principais características do jipe responsável pelo sucesso da Troller.
Mesmo assim, suas vendas estagnaram
Seu volume de vendas nunca foi muito expressivo, mas suficiente para chamar a atenção da Ford, que acertou sua compra em janeiro de 2007, por um valor estimado de R$ 400 milhões. Na ocasião, muito se falou sobre as intenções da montadora americana de ampliar sua participação no segmento de veículos off-road. Para tanto, usar as instalações e a imagem da já consolidada Troller como embrião para este novo rumo de negócios pareceu uma boa alternativa.
O peso e a força do sobrenome Ford, no entanto, até agora não se refletiram em crescimento. De acordo com dados da Fenabrave, entidade que representa as distribuidoras de veículos, a Troller comercializou 694 carros em 2006. O número subiu para 1.254, em 2010, um aumento de 80%. O desempenho seria excelente, não fosse o fato de o segmento de utilitários esportivos (SUVs) ter crescido 170% no mesmo período. No ano passado, enquanto as vendas de SUVs expandiram-se 24,5%, a Troller teve queda de 15%. A rede de concessionárias, que contava com 22 pontos de venda em 2006, tem atualmente 18. “Tivemos de colocar a casa em ordem”, afirmou à DINHEIRO Wilson Vasconcellos, gerente-geral da Troller.
“Tivemos de colocar a casa em ordem” Wilson Vasconcellos, gerente-geral da Troller
Sob a gestão da Ford, as principais características do jipe T4 foram mantidas. No entanto, a picape Pantanal e o jipe militar T4-M saíram de linha. Embora não revele o valor investido até aqui, Vasconcellos garante que a marca passou por um processo de aperfeiçoamento, com a padronização de fornecedores, investimentos na fábrica de Horizonte, e no próprio desenvolvimento do jipe. Tanto que o engenheiro Luc de Ferran, um dos responsáveis pela criação do EcoSport, chegou a atuar como consultor da Troller. A sinergia com a Ford na compra de componentes e no maior poder de barganha com fornecedores ainda não se refletiu em preços menores. O T4, por exemplo, custa atualmente R$ 92,5 mil, valor proporcional aos cerca de R$ 85 mil, cobrados em 2006. “O padrão de qualidade Ford é maior”, diz Vasconcellos.
Para José Roberto Ferro, presidente do Lean Institute Brasil, é compreensível que os resultados desse investimento ainda não tenham aparecido. “É como começar uma montadora do zero, trabalhando desde o processo produtivo até a área de distribuição do produto”, afirma. Segundo Ferro, outro fato importante é que a Troller não é prioridade para a Ford, como era para seus antigos donos. Ainda mais no período de crise que começou em 2008 e obrigou a montadora a desfazer-se de marcas como Land Rover, Jaguar e Volvo para gerar caixa. “Montadoras de nicho como a Troller nunca funcionaram bem dentro de grandes corporações”, afirma André Beer, consultor e ex-vice-presidente da GM Brasil. Já para Ferro, a venda faz parte do processo de crescimento. “Chega um estágio em que ou você vende a empresa ou ela deixa de crescer”, diz.
Timidamente, a Troller começa a trilhar um caminho para sair do atoleiro. Em 2011, o objetivo é produzir 1,6 mil carros. Se todos forem vendidos, significa um aumento de quase 10% sobre seu melhor ano de vendas. Está planejada, também, a abertura de mais sete concessionárias neste ano. Depois de cerca de dez anos afastada do Rally dos Sertões, a marca vai voltar à competição. “A Troller sempre foi uma montadora de nicho”, diz Vasconcellos. “Se quiséssemos atingir a massa, faríamos isso com a Ford.”