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ROCHA, SOBREVOANDO CENTRO DE LOGÍSTICA EM SÃO PAULO: meta de Flávio Rocha, herdeiro, é investir R$ 250 milhões em novas lojas

A cada 30 anos, o Grupo Guararapes vive uma grande transformação. Foi assim em 1979, quando deixou de ser “apenas” uma indústria têxtil para se aventurar no varejo com a aquisição da Lojas Riachuelo. Agora, a história se repete. Só que a bola da vez é o sistema bancário. O grupo potiguar acaba de receber o “sinal verde” do Banco Central (BC) para constituir uma financeira. A Midway nasce com a ambição de tornar ainda mais rentáveis as operações de crédito feitas por meio do cartão de compras Riachuelo. Hoje, esse “plástico” está nas mãos de 13 milhões de consumidores. Além de adquirir roupas, calçados, acessórios de moda e itens de cama e mesa, os portadores desses “plásticos” também podem fazer saques em dinheiro, uma transação que, até agora, era realizada por intermédio de parceiros como Bradesco, Alfa e Santander. Ao assumir essa função, a Riachuelo poderá ficar com uma fatia maior dos ganhos nessas operações. Montante que já é expressivo dentro das receitas do grupo.

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O QUE FAZ A DIFERENÇA: grupo opera com modelo diferenciado de atuação. Ao contrário das rivais, a Riachuelo produz os tecidos e parte das roupas (abaixo) vendidas em suas 89 lojas espalhadas por shopping centers e áreas de consumo popular

Uma boa amostra disso pode ser vista no balanço de 2007. No acumulado janeiro-setembro, essa vertente colaborou com 80% do lucro líquido, de R$ 117,7 milhões. O primeiro movimento da Midway será a transformação desses plásticos em cartões de crédito com as bandeiras Visa e Mastercard. E mais. Por meio da Midway, será possível ainda conceder empréstimos consignados, com desconto em folha de pagamento. Esse tipo de operação movimentou R$ 64,4 bilhões no ano passado. A empresa não confirma que seu objetivo é transformar a financeira em banco. Contudo, age fortemente nesse sentido.

Mas essa opção, no entanto, levanta uma questão: a Guararapes não corre o risco de perder o foco ao se arriscar em um segmento no qual a concorrência é bastante acirrada? Flávio Rocha, presidente da Lojas Riachuelo e herdeiro do grupo, garante que não. “Temos uma importante experiência acumulada nessa área. Além disso, nosso principal negócio é, e continuará sendo, a venda de roupas e artigos de cama, mesa e banho”, disse ele à DINHEIRO. E não poderia ser diferente. Afinal, esse nicho garante 80% do faturamento do grupo. O prestígio do varejo pode ser medido por outro indicador. Boa parte do orçamento de investimento para 2008, estimado em R$ 250 milhões, está comprometida com a abertura de novas lojas. Serão 15 unidades, mais que o dobro das inaugurações feitas no ano passado. O mesmo acontecerá na área de marketing. Longe da mídia nacional há dois anos, a marca vai apostar em campanhas cujo mote é a valorização da mulher – fatia da população que responde por 80% das compras na Riachuelo. O empresário conta que o projeto da financeira começou a ser concebido em 2005. Na época, a Guararapes havia mergulhado em uma espécie de introspecção corporativa. A empresa saiu da mídia e reduziu o ritmo de abertura de pontos-de-venda. O “freio de arrumação” foi necessário para preparar o grupo para uma nova fase de crescimento.

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Para emergir desse processo mais forte e mais competitivo em relação às rivais foi preciso reinventar o negócio. O principal pilar dessa estratégia foi a adesão ao conceito de fast-fashion. Criado pela espanhola Zara, ele prevê o rompimento da regra que prevê o lançamento das coleções apenas nos períodos primavera- verão e outono-inverno. Hoje, as vitrines das 89 lojas da Riachuelo são trocadas três vezes por semana. “Trata-se de uma visão moderna de atuação no varejo”, opina André Robic, graduado em marketing e diretor- executivo do Instituto Brasileiro de Moda. O sucesso desse modelo, ressalta, depende de uma bem estruturada cadeia de fornecimento de produtos, logística e marketing. “Mas essa equação tem de ser bem planejada para evitar que os custos anulem os potenciais ganhos”, completa Robic. Foi exatamente nisso que Rocha se concentrou. O primeiro ponto atacado foi o reforço da linha de produção. Apenas no ano passado, foram aplicados R$ 100 milhões no parque fabril. A compra de máquinas e a abertura de mais um turno de trabalho na tecelagem e na confecção resultaram na contratação de 3,5 mil funcionários para suas duas fábricas, em Natal (RN) e Fortaleza (CE). Essas unidades fabricam roupas para 17 grifes próprias (Pool e Omni, por exemplo), comercializadas principalmente na rede. Hoje, 77% da produção é destinada à Riachuelo, o que representa 35% das vendas da cadeia de lojas. “Com isso, temos um controle maior sobre a estrutura de custos”, destaca Rocha. “Tiramos vantagem do fato de fabricarmos em áreas que conjugam incentivo fiscal e mão-de-obra de qualidade”, completa o empresário.

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Os analistas, no entanto, se mostram divididos em relação à fórmula de crescimento adotada pelo Grupo Guararapes. O pomo da discórdia é a entrada da família Rocha na área bancária. “A financeira permite uma diversificação maior das fontes de ganhos dentro das lojas”, avalia Wagner Salaverry, da corretora Geração Futuro. Não é o que pensa Renato Prado, especialista em varejo da Fator Corretora. “O agravamento da crise americana e a possibilidade de aumento na taxa de juros pode inibir o consumo, afetando em muito a performance da companhia”, destaca. Segundo ele, melhor seria se a Riachuelo concentrasse seus esforços na atividade-fim. “A geração de caixa da empresa é baixa em relação às concorrentes”, diz. É fato. O ganho financeiro colaborou com 80% do lucro líquido. Percentual que cai para 50% no caso da Renner. O “mau humor” do mercado em relação à Riachuelo pode ser medido pela cotação dos papéis de sua controladora, o Grupo Guararapes. Neste ano, eles recuaram 21,1%, contra uma queda de 4,85% do Ibovespa. Rocha reconhece que os resultados, apesar do recorde tanto no lucro quanto nas receitas, ainda estão aquém da expectativa dos analistas. Mas garante que as correções de rota feitas desde 2005 permitirão que a Guararapes, no geral, e a Riachuelo, em especial, entrem em um novo patamar de crescimento. Credenciais para isso não faltam. Afinal, a rede sobreviveu à derrocada do setor, que afetou marcas de prestígio, como Mesbla e Mappin, além de ter saído intacta de um processo de concordata, em 1992. “A Riachuelo é uma sobrevivente”, define Salaverry.