DINHEIRO ? A carteira de empréstimos do BB cresceu 21% no ano passado. Agora que o cenário mudou e o governo tomou medidas para controlar a expansão do crédito, qual é a estratégia do banco?


ALDEMIR BENDINE ? Houve uma mudança no perfil do crédito. O crédito para consumo, que cresceria de 23% a 24%, deve crescer 20% este ano. A retração foi de 40% nos desembolsos ao consumidor no primeiro bimestre. Mas isso deve diminuir com o tempo. No estoque, o impacto é pequeno. No crédito consignado, o impacto foi menor. Na média de veículos, consignado e crédito livre, o recuo foi de cerca de 15% e também deve diminuir ao longo do ano. A demanda forte agora é por financiamento de projetos. Começamos o ano com projetos no valor total de R$ 85 bilhões, valor inédito para início de ano, e devemos financiar cerca de R$ 20 bilhões. Este número deve subir ao longo do ano. Temos uma situação bastante confortável de liquidez, com espaço para emprestar R$ 120 bilhões. 

 

 

DINHEIRO ? E os negócios no varejo?


BENDINE ? Prevemos um crescimento grande em seguros e cartões. Vamos começar a colher os frutos das sinergias feitas nos últimos anos. No segundo semestre, iremos lançar produtos em conjunto com a Mapfre. O grande desafio é aprimorar o relacionamento com o cliente. Abriremos um número recorde de 600 agências. Esperamos poder nos reposicionar na virada do segundo semestre porque já tem indicadores de mudança nos juros futuros, de aumento da massa salarial e de uma atividade mais forte da economia. No crédito imobiliário, vamos dobrar a carteira, de R$ 3 bilhões para R$ 6 bilhões.

 

 

DINHEIRO ? Podem vir novas medidas para segurar a economia e evitar a inflação?


BENDINE ? Depende. Pode ser que até o segundo semestre as coisas mudem. Sou otimista, temos problemas bons. Largamos com R$ 85 bilhões em projetos de investimentos. É um negócio fantástico em termos de oportunidades. A pressão inflacionária no Brasil está muito mais ligada a commodities do que a fatores internos. A intervenção do governo, ao agir rapidamente aos primeiros sinais de inflação, foi muito benfeita. Vamos acompanhar o endividamento. A inflação já está dando sinais de recuo.

 

 

DINHEIRO ? Quais sinais?


BENDINE ? Não é uma coisa numérica. Mas pela própria atividade da indústria e em conversas com nossos clientes, percebemos que eles não estão mais com pressão tão forte de alta dos insumos. As empresas estão reclamando menos. O empresariado no Brasil evoluiu muito, percebeu que tem de ser o carro-chefe da mudança. Mas ainda temos alguns deveres de casa a ser feitos. Temos que tomar medidas para que o financiamento do crédito produtivo não fique como um ônus exclusivamente do governo. Acho que o sistema financeiro nacional tem que entrar nisso também.

 

 

DINHEIRO ? Como está a inadimplência?


BENDINE ? Muito boa. No ano passado, ficamos em 2,3%, enquanto o mercado está em 3,2%. Por duas razões: a evolução do mercado e o gerenciamento da carteira. Como temos um bom gerenciamento, não tivemos repique, a inadimplência se manteve estável. As famílias se endividaram mais, mas, como a renda aumentou, o comprometimento da renda se manteve igual. Olhamos para a frente com otimismo porque a massa salarial continua crescendo. Também está havendo uma melhor educação financeira das famílias brasileiras, que programam melhor a tomada de crédito.

 

 

DINHEIRO ? As mudanças que o governo fez no financiamento de longo prazo, em dezembro, surtiram efeito?


BENDINE ? São resultados positivos, mas ainda pequenos. Precisamos de alternativas de captação que suportem aplicações de longo prazo. Por enquanto, o BNDES continua o principal agente.

 

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“As empresas já não reclamam tanto da pressão de custos”
Produção de chapas de aço no Brasil, uma das matérias-primas que mais subiram nos últimos meses

 

 

DINHEIRO ? E qual é o tipo de projeto que o Banco do Brasil vai priorizar?


BENDINE ? Vai depender do projeto. A demanda forte é para projetos de infraestrutura. Eles geram uma grande rentabilidade porque são contratos de longo prazo e dá para negociar contrapartidas no varejo. Por exemplo, ao financiar um projeto de uma empresa podemos negociar folha de pagamento, preferências na venda especial de produtos para os funcionários, etc.

 

 

DINHEIRO ? Como está o crédito agropecuário?


BENDINE ? Estamos vivendo uma nova realidade na agricultura brasileira. Houve uma grande profissionalização do setor agropecuário. O investimento em tecnologia, inovação, vem aumentando a produtividade e vemos uma dependência cada vez menor de crédito subsidiado. Crescem as operações de seguro agrícola, hedge através da bolsa. Os pequenos também estão bem, atendidos pelo Programa Nacional de Agricultura Familiar (Pronaf). As duas pontas estão muito bem neste negócio.

 

 

DINHEIRO ? O ex-presidente da Febraban Fabio Barbosa disse recentemente que não é possível compatibilizar a bancarização com a redução do spread (diferença entre os custos de captação e de empréstimos). Qual é a sua opinião?


BENDINE ? Por isso é importante aprovar o mais rápido possível o cadastro positivo. Em parte eu concordo com o Fabio porque a queda de rentabilidade impede um crescimento neste mercado. Mas, por outro lado, os bancos têm que buscar uma maior eficiência para fazer a inclusão bancária com custos reduzidos. O Banco do Brasil está buscando fazer isso com agências complementares, onde não há escala para ter uma agência plena. É uma agência com custos menores, mas com todos os serviços. Queremos instalar agências deste tipo em todos os municípios brasileiros até 2014. Hoje temos agências em 3.566 municípios.

 

 

DINHEIRO ? O banco vai entrar na concorrência do Banco Postal?


BENDINE ? Se não for um valor muito elevado, temos interesse. É bom para aumentar a escala, já que os Correios estão presentes em todos os municípios.

 

 

DINHEIRO ? Como está o projeto do cartão Elo, parceria entre BB, Bradesco e Caixa?


BENDINE ? Criamos formalmente as empresas e estamos discutindo os detalhes. Estamos prontos para vender o cartão, mas não temos data para começar. Esse mercado vem crescendo acima do crescimento da economia brasileira e passou de R$ 600 bilhões no ano passado. Em cinco anos, queremos uma fatia de 15%, aumentando nossa presença especialmente na classe C. 

 

 

DINHEIRO ? A parceria com o Bradesco não elimina uma concorrência que poderia ser muito forte nessa área?


BENDINE ? A concorrência sempre vai haver, ela é salutar. Mas este é um mercado em que é fundamental ter escala. Sem ela, não se reduz custo e não se pode oferecer um produto competitivo. Houve uma concentração com a fusão Itaú-Unibanco. Para nós, como não havia a possibilidade de uma fusão, decidimos nos juntar com o Bradesco. 

 

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“Vamos investir cerca de R$ 20 bilhões em projetos de infraestrutura”
Obra de duplicação da rodovia dos Tamoios, em Jambeiro (SP)

 


DINHEIRO ? Até onde vai essa parceria? 


BENDINE ? A parceria existe há mais de 20 anos, quando criamos a Visanet. Essa proximidade tem a ver com a cultura das duas casas, que são bastante similares. Sempre deixamos claro o seguinte: estratégia a gente pode fazer em conjunto. Na hora da distribuição é cada um por si e é ali que a gente briga.

 

 

DINHEIRO ? Quando sai a compra do banco da Flórida?


BENDINE ? Está quase tudo pronto. Devemos anunciar em breve. O projeto de internacionalização é de longo prazo. É claro que o investimento forte vai continuar no mercado doméstico. Mas estamos preparando o Banco do Brasil para que, num futuro próximo, seja uma marca global. Ela segue três princípios: a presença de empresas brasileiras, de brasileiros e do comércio bilateral. Já estamos presentes em 23 países, com 44 dependências, além das aquisições recentes, como a do Banco da Patagônia, na Argentina. Temos também o Projeto África. Em dez anos, a atuação no Exterior estará bem consolidada e pode representar 10% de todo o ganho.

 

 

DINHEIRO ? Como é a estratégia em cada país?


BENDINE ? Nos Estados Unidos, vamos procurar os brasileiros, uma comunidade de 1,45 milhão de pessoas, muitas sem acesso a banco. Eles poderão abrir conta com documento brasileiro. Na África, temos um acordo com o Bradesco e o Banco do Espírito Santo para atuação em sete países: Angola, Cabo Verde, Moçambique, Argélia, Marrocos, África do Sul e Líbia. Por causa da situação na Líbia, que agora está fora, houve um atraso. O primeiro país será Angola, que deve sair nos próximos meses, mas ainda não temos uma data. 

 

 

DINHEIRO ? E nos outros países?


BENDINE ? No Japão, dos 300 mil brasileiros que vivem no país, metade já é de clientes nossos. Nos Estados Unidos, vamos seguir o mesmo modelo. Os próximos passos são de crescimento mais forte na América Latina. Temos uma discussão com uma instituição chilena. Estamos vendo oportunidades no Peru e na Colômbia. No Uruguai, ainda estamos avaliando se procuramos uma oportunidade no país ou se fazemos uma expansão via Banco da Patagônia. Assim que fecharmos Estados Unidos e África, o nosso foco será a América Latina.