No fim de junho, a empresa de softwares de gestão Totvs anunciou uma reestruturação em sua diretoria. A principal mudança ocorreu  na área financeira e de relações com investidores (RI). José Rogério Luiz, até então vice-presidente financeiro e diretor de RI, deixou o cargo e passou a integrar um comitê de apoio ao conselho de administração, que não tem função executiva. Luiz é um nome de primeira linha da Totvs. Na empresa há dez anos, ele preparou e conduziu sua abertura de capital, em 2007. Movimentações como essa são corriqueiras em grandes empresas. A diferença, no caso da Totvs, é que os movimentos foram revelados aos investidores. O sucessor de Luiz ainda não foi escolhido, mas o processo de seleção corre a portas abertas. “Comunicar é sempre melhor do que ter que explicar ao mercado”, diz Laércio Cosentino, presidente da Totvs. “Ao tornarmos o processo de seleção mais aberto e transparente, evitamos especulações e rumores, e facilitamos a escolha do novo executivo.” A transparência compensa: embora as ações da empresa tenham sofrido com a crise atual e recuassem 9,2% desde julho,  elas caíram menos do que a média do mercado. Nesse período, o Índice Bovespa desvalorizou-se em 12,55%. 

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Tim no novo mercado: a empresa foi a primeira de telecomunicação a migrar as ações.
“Esse passo agrega valor aos papéis da companhia”, disse Luca Luciani, presidente da Tim

Manter comunicação aberta com os investidores, a chamada governança corporativa, pode representar mais dinheiro para os acionistas. “Essas práticas dão mais segurança aos investidores, que se dispõem a pagar mais”, diz Heloísa Bedicks, superintendente do Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC). Na ponta do lápis, os números comprovam. Desde o início do ano, até a quarta-feira 6, o Índice de Ações com Governança Corporativa Diferenciada, o IGC, caiu 14,5%. O desempenho é menos dolorido do que a queda de 18,3% do Ibovespa. No longo prazo, a diferença é mais evidente. Desde sua criação, em junho de 2001, o IGC acumula alta de 546%, ante 289% do Ibovespa (leia gráfico). Assim como a Totvs, outras companhias abertas estão se preocupando mais com esse assunto. Nomes como Ultrapar e TIM, migraram para o Novo Mercado, o nível mais alto de governança da Bolsa. Não é apenas apreço pela democracia: as boas práticas representam mais dinheiro. “Esse passo agrega valor aos papéis da companhia”, disse Luca Luciani, presidente da Tim, no dia da migração. Neste ano, os papéis da operadora de telefonia subiram 36,1%, ao passo que o índice setorial Itel valorizou-se 16,3%. No caso da Ultrapar, os papéis subiram 5% em 2011, ante queda de 15,8% do índice industrial. 

As boas práticas de governança não blindam o investidor contra prejuízos. Mesmo assim, a convicção de que será informado a tempo de tudo facilita o acesso da empresa ao capital. O investidor que buscar uma empresa com boas práticas de governança deve prestar atenção à maneira como essa companhia se comunica com o mercado. Ter suas ações listadas no Novo Mercado ou, pelo menos, no Nível 2 de governança corporativa da Bolsa é um bom começo, mas não basta. “A companhia que tem um departamento de relações com investidores eficiente, e cuja página de internet oferece informações claras e atualizadas, está no bom caminho”, diz Bedicks. Algumas empresas fazem um investimento extra na imagem. Um exemplo é a Eternit, que lida com a polêmica questão do amianto, matéria-prima das telhas de fibrocimento que produz. Pesquisas apontam que o amianto é cancerígeno, mas a empresa afirma que o tipo que usa, chamado crisotila, não oferece riscos à saúde. O debate está longe de uma conclusão. Assim, no topo da agenda de Élio Martins, presidente da Eternit, está um trabalho diário de comunicação. O esforço é necessário. Em 2004, a Eternit deixou a joint-venture com o grupo Saint-Gobain e partiu para voo solo. “Percebemos que era preciso investir primeiro em governança corporativa para depois expandir”, diz Martins.

 

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 Uma das principais medidas naquele momento foi criar um programa de portas abertas, no qual acionistas podem visitar as unidades da empresa. “Já recebemos mais de 47 mil visitantes”, afirma Martins. As mudanças sustentaram um crescimento da base de acionistas de 1.300, em 2004, para cerca de 7 mil. O valor de mercado da empresa cresceu de R$ 230 milhões para R$ 1 bilhão no período, ou 23% ao ano. “Sem o investimento na governança teríamos crescido cerca de 10% ao ano”, diz Martins. Outro indicativo de boas práticas de governança é a possibilidade de os investidores votarem pela internet, uma ferramenta regulamentada em 2008 pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM). A primeira empresa a utilizar  a tecnologia foi a Bematech. A sede da companhia de automação fica em Curitiba, no Paraná, mas a maioria dos investidores está em São Paulo ou no Rio de Janeiro. “Algumas decisões precisam de voto de 77% dos acionistas”, diz Marcel Malczewski, cofundador e presidente do conselho de administração da Bematech. “A falta de quórum poderia ser um problema, por isso adotamos o mecanismo.” Cerca de 12% dos acionistas votam pela web. “Grandes investidores deixaram claro que um dos pontos que os fez aplicar foram as práticas de governança da empresa”, diz Malczewski. Uma lição a que os pequenos investidores também devem ficar atentos. 

 

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