24/09/2010 - 6:00
DINHEIRO ? Poucos setores foram tão afetados nos últimos dois anos com a crise internacional quanto o mercado de seguros. Há sinais de recuperação?
JOSÉ MANUEL DA FONSECA ? Como os países foram afetados de formas distintas, a recuperação também começa a surgir de maneira diferente. Na Europa, as economias mais prejudicadas pela recessão continuam ruins. A situação da Grécia é bem diferente da de Portugal, por exemplo. Na minha avaliação, até 2013 tudo voltará aos níveis normais, anteriores à crise, na maioria dos países desenvolvidos.
DINHEIRO ? Por que o grupo MDS se interessou pelo Brasil?
FONSECA ? O Brasil tem se comportado muito bem. Tem uma economia dinâmica e criativa. Por isso, projetamos que nossa operação cresça muito acima da taxa do PIB. É um país adulto do ponto de vista do seguro, muito melhor que a Índia e a China. A China cresce muito, mas é uma economia que não faz seguros.
DINHEIRO ? Por quê?
FONSECA ? Porque a China não está preparada para isso. Ainda é muito verde, não está madura. Enquanto o Brasil é uma economia muito mais interessante. Já a Índia até pouco tempo atrás não permitia a presença de companhias seguradoras ou corretoras estrangeiras. Mas aliviou um pouco as restrições recentemente. Mesmo assim, o governo da Índia hoje não permite que uma empresa estrangeira tenha mais de 29% do capital de uma seguradora indiana. Está em curso um projeto de lei para passar para 49%, mas há muita resistência interna. No Brasil não. Aqui, uma empresa que atua na área de seguros pode ser 100% estrangeira, o que dá uma abertura muito maior. É um mercado mais sênior, profissional. Além disso, está há mais tempo no mercado mundial. Do ponto de vista das multinacionais, principalmente para o setor de seguros, o Brasil é o melhor. Culturalmente, o brasileiro é mais aberto aos seguros do que os chineses e os indianos. Economicamente, o País é muito mais avançado. Por isso, para o setor de seguros o Brasil é seguramente a estrela dos BRICs.
“Copa e Olimpíada geram muitos seguros. Queremos tirar proveito disso”
Obras no Estádio do Maracanã, no Rio de Janeiro
DINHEIRO ? Com a crise, os mercados emergentes conquistaram mais destaque no campo dos seguros?
FONSECA ? Sim, com certeza. Por isso, a MDS acelerou o processo de crescimento global. Temos duas regiões em que pretendemos nos firmar. Uma das regiões é a ibero-americana. Em Portugal já somos líderes de mercado e estamos trabalhando por uma posição na Espanha. Por isso, na América Latina temos nos esforçado para crescer no Brasil, onde já somos o terceiro maior broker, atrás apenas da AON e da Marsh.
DINHEIRO ? Mas a MDS já atua em todo o mundo, não?
FONSECA ? O Grupo Sonae, principal acionista da MDS Holding, tem operações em praticamente todos os países europeus. Pela MDS, temos 32% da quinta maior corretora de seguro do mundo, a britânica Cooper Gay. Por meio dela, estamos na Alemanha, na Rússia, na França, na Grã-Bretanha, nos Estados Unidos,na China, no Canadá, na Austrália e em Cingapura, e muitos outros países.
DINHEIRO ? Por que o mercado de seguros foi tão prejudicado nos últimos anos?
FONSECA ? A atividade seguradora está muito relacionada ao nível da economia. Não havendo investimento, há menos procura por seguro. Por outro lado, com a crise as empresas têm problemas de caixa e, portanto, há uma atenção especial aos custos. E, quando há atenção particular aos custos, o seguro é um dos mecanismos usados para economizar. De duas formas: na questão dos preços, as empresas buscam valores menores de seguros, ou abdicam de certos tipos de cobertura.
DINHEIRO ? Seguro, então, é o primeiro custo reduzido em tempos de crise?
FONSECA ? Não o primeiro, mas é um dos caminhos para cortar custos. Existe um outro fator que afeta. Se as empresas demitem, se reduz a quantidade de emprego, se reduzem as coberturas de vida, de acidentes de trabalho, de seguros-saúde , etc. Esses são os impactos diretos.
DINHEIRO ? Além do emprego e do corte de custos, há outros fatores que afetam o mercado de seguros?
FONSECA ? Essencialmente, a redução do nível de atividade econômica.
DINHEIRO ? O plano de internacionalização da MDS será via clientes ou pela aquisição de concorrentes?
FONSECA ? A internacionalização será feita por meio das empresas que atendemos e também por aquisições. Estamos inseridos no Brokerslink, uma rede mundial de corretagem, pela qual estamos entrando em novas economias, inclusive as mais complexas. Se as empresas que atendemos decidem investir em alguma nação, vamos junto. Assim tem sido.
“A China cresce muito, mas é uma economia que não costuma fazer seguros”
Guindaste em obra na China
DINHEIRO ? Qual a perspectiva de crescimento para o setor neste ano?
FONSECA ? Seguramente o setor segurador vai crescer acima de dois dígitos, ao passo que as economias emergentes vão crescer um dígito. Portanto, há aqui uma reserva de crescimento interessante. Dentro da América Latina, temos parceiros na Argentina, no México, na Colômbia e no Chile. Todos esses mercados têm sido extremamente atraentes para investimentos em seguros.
DINHEIRO ? Quais segmentos têm maior potencial de expansão?
FONSECA ? A MDS é uma seguradora que atua em vários setores. Por questões históricas, temos uma presença muito forte no seguro industrial. Isso quer dizer no grande risco. Queremos manter esse DNA, de ser um corretor forte no risco industrial. Mas queremos nos firmar mais no varejo, no property, nas áreas massificadas.
DINHEIRO ? Até pouco tempo atrás, o mercado de resseguros no Brasil era fechado. Como a abertura foi recebida lá fora?
FONSECA ? Sim, era um monopólio estatal. A abertura foi um passo importante para o avanço da economia brasileira e, para nós que somos o quinto maior corretor de resseguros do mundo, fundamental. A abertura, de fato, tem gerado muita atratividade das grandes empresas estrangeiras no Brasil, que moderniza e profissionaliza ainda mais o setor segurador brasileiro. Portanto, criam-se novas alternativas. É agora um mercado que está internacionalizado. E esse é um dos nossos focos.
DINHEIRO ? No Brasil, o seguro vai crescer mais no varejo ou no grande risco?
FONSECA ? Em ambos. Na parte do varejo, há um visível aumento do consumo da classe média e um fortíssimo crescimento do poder de compra. Existe um ambiente muito propício também a investimentos na economia brasileira, o que traz oportunidades de fora para dentro. Por outro lado, existem várias empresas brasileiras a buscar mercados lá fora, fazendo aquisições e investimentos fora do Brasil. Essa movimentação amplia o potencial. Sentimo-nos preparados para acompanhar essas empresas e para aproveitar a evolução da economia brasileira.
DINHEIRO ? A MDS acaba de criar uma nova identidade no Brasil e fundiu operações de três empresas diferentes em uma só. Qual o tamanho dessa nova empresa?
FONSECA ? A MDS Brasil é fruto do crescimento próprio e também de algumas aquisições. No início de 2009, a Lazam-MDS, formada pela união do Grupo Suzano com a MDS, fez duas aquisições importantes. Juntou a operação em São Paulo e duas empresas, uma no Sul, chamada ADDMakler, e outra no Rio de Janeiro, chamada Miral. Então, hoje a MDS Brasil é resultado da fusão dessas três grandes empresas.
DINHEIRO ? Como se deu essa fusão?
FONSECA ? O processo de fusão das operações se iniciou em fevereiro de 2009. Em julho, aconteceu outra coisa importante, a criação de uma joint venture do Grupo Sonae com o Grupo Suzano. Então, até julho do ano passado a relação Sonae-Suzano era puramente brasileira. Nós tínhamos 45% da Lazam-MDS, e eles 55%. Estávamos no País há oito anos. No Brasil era complicado manter três marcas. Era complicado para o mercado, para os clientes, para os compradores. Ficou claro para nós que tínhamos que criar uma empresa única, uma marca comum. A decisão foi utilizar a marca que o grupo já tinha, a MDS. É um nome fácil de usar, reconhecido, sem conotação regional.
DINHEIRO ? Dentro do Brasil, quais são os planos de expansão?
FONSECA ? Queremos trabalhar bem nos mercados em que já estamos e que são os locais de maior atividade econômica. O Nordeste nos interessa, mas ainda temos que passar por Minas Gerais. Podemos fazer novas aquisições, de forma cirúrgica, para ampliar a posição.
DINHEIRO ? Qual o impacto da Copa e da Olimpíada no mercado segurador?
FONSECA ? São importantes porque geram muitos investimentos e seguros, na construção civil em eventos, etc. Temos uma posição forte no Rio de Janeiro e estaremos atentos as todas as oportunidades. Evidentemente, queremos tirar proveito disso.
DINHEIRO ? A MDS Brasil tem a ambição de assumir a liderança no ranking nacional?
FONSECA ? Olha, a AON e a Marsh são muito fortes. Tenho um grande respeito e admiração pelas duas. Mas se você me perguntasse quais eram as nossas ambições no mercado brasileiro alguns anos atrás, eu projetaria algo mais modesto do que a posição em que estamos hoje. Não sei exatamente o que vai ser daqui a três anos. Posso dizer que nossa posição será muito boa. Prefiro ser surpreendido do que projetar sonhos. Seguramente, queremos ser uma referência.