30/03/2022 - 14:03
Mídia destaca o impasse em que a invasão da Ucrânia pela Rússia coloca o Brasil e os demais países integrantes do Brics; a censura eleitoral em torno do festival Lollapalooza; e o giro de Sergio Moro à Alemanha.Handelsblatt – Prova de resistência para o Brics (28/03)
Lealdade política a Moscou ou relações econômicas com o Ocidente? Os quatro parceiros da Rússia têm que decidir de que lado estão, em meio à guerra na Ucrânia.
Visitas para Sergei Lavrov se tornaram raras, nestes dias de guerra. Assim, tão mais prazeroso foi para o ministro do Exterior russo se econtrar com os embaixadores dos assim chamados “países do Brics”. Ele imediatamente utilizou o encontro para sinalizar ao Ocidente: a Rússia não está só.
“Os participantes dialogaram entusiasticamente sobre a evolução e fortalecimento de sua parceria estratégica”, tuitou o Ministério do Exterior após o encontro de Lavrov com os representantes do Brasil, Índia, China e África do Sul.
Desde a fundação de sua união, mais de dez anos atrás, os Estados do Brics, aos quais a Rússia pertence, se entendem como um contrapeso econômico ao Ocidente. A guerra de agressão do presidente russo, Vladimir Putin, contra a Ucrânia coloca o clube dos emergentes diante de uma prova de resistência: Brasil, Índia, China e África do Sul mantêm relações econômicas intensas com os Estados Unidos e a Europa. Com a cisão da economia mundial em blocos inimigos, pode ser que eles sejam forçados a se posicionar.
Ao contrário da China, que se colocou da forma mais explícita do lado de Putin, a Índia, Brasil e África do Sul tentam se esquivar: nada de ruptura com Moscou, mas tampouco apoio político à guerra de Putin. China Índia e África do Sul se abstiveram, quando, com grande maioria, as Nações Unidas condenaram a guerra ofensiva da Rússia. O Brasil, apesar de votar com a maioria, em seguida condenou as sanções econômicas do Ocidente.
O próximo teste de resistência para o clube do Brics já está previsto: o presidente americano, Joe Biden, propôs que se exclua a Rússia do G20, o grupo dos 20 maiores países industrializados e emergentes. O clube dos grandes países industrializados, o G7, que já exclui a Rússia após a anexação da Crimeia, em 2014, exigiu, num comunicado: “Organizações internacionais e fóruns multilaterais não devem mais continuar mantendo sua atividade na Rússia, num esquema de business as usual.”
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A Rússia é a principal acionista do Novo Banco de Desenvolvimento (NDB), com 19% do capital, no fim de 2021, e a instituição concedeu cerca de 13% de seu volume de crédito ao império de Putin. O Brasil, por sua vez, tem esperanças de obter mais créditos dos cofres do NDB. Por a Rússia ter sido submetida a sanções do Ocidente, no início de março o banco suspendeu seus empréstimos ao país.
Sérgio Suchodolski, que até 2019 foi o diretor do NDB em Xangai, conta com um aumento dos portfólios de crédito dos demais membros da união internacional Brics. Ele acaba de assegurar para a agência Desenvolve SP um crédito de US$ 200 milhões, partilhado entre o NDB e o Banco Interamericano de Desenvolvimento.
Frankfurter Allgemeine Zeitung – Festival de música se transforma em protesto contra Bolsonaro (29/03)
Tudo começou na sexta-feira, com o show da drag queen e cantora Pabllo Vittar. Ao deixar o palco após sua apresentação no festival de música Lollapalooza, em São Paulo, a artista pegou uma toalha. Não era uma toalha qualquer, mas sim decorada com o rosto do ex-presidente de esquerda Luiz Inácio Lula da Silva, que neste ano volta a concorrer nas eleições presidenciais. Além disso, Vittar fez um “L” com os dedos, como costumam fazer os adeptos de Lula.
Depois foi a vez da cantora britânica Marina, do grupo Marina and the Diamonds, que durante seu show insultou [o presidente da Rússia Vladimir] Putin e o presidente brasileiro, Jair Bolsonaro. O público aderiu: “Fora, Bolsonaro!”, ecoava sobre o terreno do Autódromo de São Paulo, onde se realizava o festival de três dias. Paralelamente também se escutavam-se palavras de ordem em coro a favor de Lula.
Na central do Partido Liberal (PL), a que Bolsonaro se filiou no início de 2022, o ocorrido não passou despercebido. Após a primeira noite do festival, os advogados da legenda apresentaram ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) queixa contra os organizadores por propaganda eleitoral irregular.
Um juiz acatou a queixa e exigiu, sob ameaça de uma de R$ 50 mil, que os promotores do evento impedissem manifestações políticas. Peritos jurídicos criticaram a intervenção, e os organizadores recorreram da sentença, argumentando não poder agir como censores privados, controlando as declarações dos artistas que se apresentavam.
Provou-se que tinham razão. No segundo e terceiro dia, os artistas expressaram suas opiniões de forma ainda mais decidida e enérgica. Entre os brasileiros, nenhum deixou de dar uma estocada em Bolsonaro. Em breve, o festival ganhava o apelido “Lulapalooza”.
Outros artistas se solidarizaram. Por exemplo, a cantora Anitta, que atualmente causa furor mundial com seu sucesso Envolver e o sensual vídeo que o acompanha, e que teve uma breve participação no festival ao lado da estrela americana Miley Cyrus.
Nas redes sociais, Anitta se mostrou desafiadora: “Cada um vota em quem quer, mas proibir a gente de expressar nossa insatisfação contra o atual governo é censura”, disse, prometendo assumir as multas de seus colegas. Quem quisesse lutar e se expressar, que o fizesse: “50 mil? Poxa… menos uma bolsa”, escreveu no Twitter.
Enquanto em São Paulo os artistas eram acusados de infringir leis eleitorais, em Brasília Jair Bolsonaro participava de uma convenção partidária cujo conteúdo era praticamente só as próximas eleições. A participação do presidente, de que seus próprios advogados tentaram demovê-lo, pode ser interpretada como campanha eleitoral antecipada, nos termos da lei.
Mas ao que tudo indica, Bolsonaro não liga para esse tipo de coisa. Para defender a liberdade, vai enfrentar tudo e todos, prometeu. O fim de semana deu um amargo gosto antecipado do clima político explosivo do Brasil, a caminho de uma campanha eleitoral polarizada entre Bolsonaro e Lula.
Handelsblatt – “Mais inimigos do que apoiadores” (28/03)
Sergio Moro, combatente da corrupção fracassado e ex-juiz federal, quer se tornar presidente do Brasil. Em visita à Alemanha, ele tentou incrementar a própria popularidade.
Na fase quente da campanha eleitoral brasileira, os três principais candidatos presidenciais viajaram para a Europa. Primeiro, em novembro, o ex-presidente Luis Inácio Lula da Silva foi recebido como um chefe de Estado pelo (na época indicado) chanceler federal alemão, Olaf Scholz, e por [presidente francês] Emmanuel Macron.
Jair Bolsonaro viajou pouco após a eclosão da guerra [na Ucrânia] até Vladimir Putin e se declarou solidário. E agora o juiz anticorrupção Sergio Moro tenta, com visitas ao setor político e econômico da Alemanha, incrementar seu peso na política externa.
A seis meses do pleito, o político de 49 anos ocupa o terceiro lugar entre os candidatos, com cerca de 9% dos votos. Quem encabeça a lista é Lula (44%), o presidente em exercício Bolsonaro está em segundo lugar (23%).
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A razão da queda de Moro na opinião pública, ao que tudo indica, foi o juiz ter cooperado próximo demais com o Ministério Público. Ele perseguiu politicamente o ex-presidente Lula, diz-se, foi parcial. Nesse ínterim, assim pensam não só muitos brasileiros: com esses argumentos, um ano atrás também o Supremo Tribunal Federal (STF) anulou as sentenças de Moro contra Lula.
“Com todo o respeito, eu considero o veredito do STF um grande erro”, defende-se Moro, “porque significa o retorno a impunidade.” O mesmo tribunal que confirmara a sentença contra Lula e ratificara sua prisão, três anos mais tarde de repente mudou de opinião: o sistema político teria se defendido com êxito da persecução criminal. “A partir de um determinado ponto, tínhamos mais inimigos do que apoiadores”, comenta Moro.
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Moro considera um desastre ético, se Lula voltasse a ser presidente, já que ele o Partido dos Trabalhadores (PT) não reconheceram, até hoje, sua cumplicidade nem na corrupção grassante, nem na desolação econômica [do país].
Ele considera uma vergonha Lula ser recebido na Europa como homem de Estado, enquanto se deixa de fora seu envolvimento na corrupção: “Para nós, brasileiros, que conhecemos os escândalos de Lula, é decepcionante.” Em relação a Bolsonaro, sua crítica é mais branda: Moro quer conquistar os votos dos adeptos do presidente decepcionados. Porém eles não vão passar tão facilmente assim para seu lado: para eles Moro, é hoje um traidor.
Nos meios políticos do Brasil, diz-se que, em termos de popularidade, será difícil Moro ultrapassar a marca do 10% – bloqueando assim a ascensão de outros candidatos alternativos. O assessor eleitoral de Moro diz que ele deveria se apresentar na campanha de forma mais relaxada, mais como candidato, e que se vai trabalhar nesse sentido. Cabe aguardar se, com sua visita à Alemanha, Moro aumentará seu cacife.
av (ots)