DINHEIRO – O sr. se arrepende de ter assinado o AI-5?
Quando o futuro vira passado, você percebe as implicações. Suspender o habeas corpus não significa dar licença para fazer tortura. Pelo contrário. Significa que o Estado é obrigado a cuidar muito bem de quem ele tem sob sua custódia. Ter assinado o AI-5 não significa ter aprovado a tortura.

AKIHIRO IKEDA (sócio e ex-assessor do então ministro da Fazenda Delfim Netto) – De todas as suas passagens pelo governo, qual foi a mais difícil?
A situação mais delicada foi realmente quando nós tivemos de enfrentar a crise externa (após a segunda crise do petróleo). Nós trabalhávamos 24 horas por dia e graças ao [ministro da Fazenda], Ernane Galvêas, ao [presidente do Banco Central], Carlos Geraldo Langoni e ao [presidente do Banco Central], Affonso Celso Pastore, nós acabamos superando aquilo e terminamos 1984 com equilíbrio em contas correntes.

 

CARLOS ANTONIO ROCCA (diretor do Cemec e ex-assessor do então ministro da Fazenda Delfim Netto) – Não fosse o primeiro choque do petróleo, em 1973, qual teria sido a chance de continuidade do crescimento econômico visto no período do milagre (1969-1973)?
Total. Realmente, mesmo depois do choque do petróleo, nós conseguimos equilibrar o balanço de contas correntes. Se não tivesse havido essa mudança, eu creio que nós teríamos continuado naquele ritmo de crescimento. O Brasil seria hoje parecido com a Coreia do Sul.

 

AFFONSO CELSO PASTORE (ex-presidente do Banco Central) – Quando o sr. foi ministro da Fazenda, os Estados Unidos combatiam a inflação através de uma política de rendas – o controle de preços. Falhou nos Estados Unidos e também falhou no Brasil. Por que falhou? É possível controlar a inflação só com política monetária?
Eu duvido. Honestamente, eu duvido. Claro que a política monetária, incluindo a taxa de juros, é fundamental para controlar os preços, mas ela é uma das condições. Quando nós usamos a política de rendas, aquilo era um vício keynesiano que, depois, se mostrou equivocado. É interessante que o mundo inteiro usou isso – talvez a Alemanha tenha sido a única exceção. Naquele momento, erramos todos juntos. O Brasil não errou sozinho.

 

LUIS PAULO ROSENBERG (consultor e ex-assessor do então ministro do Planeja-mento Delfim Netto) – Algum de nós, “Delfim boys”, te decepcionou?
Não. Graças a Deus todos se revelaram profissionais de altíssima qualidade. Sem exceção. Não gosto muito dessa ideia de “Delfim boys”, mas foi uma equipe que começou na universidade, em seminários diários, e que construiu uma amizade muito forte. O grande inspirador disso tudo foi o professor Luiz de Freitas Bueno, o primeiro professor de Estatística Geral e Econômica da FEA-USP (1919-2006).

 

PAULO YOKOTA (sócio e ex-diretor do Banco Central e ex-presidente do Incra) – Como o sr. avalia o fato de os ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) falaram tanto fora dos autos?
É uma extravagância.

 

 

 

 

ROCCA – Se pudesse propor uma única solução para a retomada sustentável da economia brasileira, qual o sr. escolheria?
Minha proposta é não reinventar a roda. Fazer as coisas que precisam ser feitas e que todo mundo sabe quais são. Os 30 países mais desenvolvidos já fizeram. A principal medida é colocar ordem nas contas públicas. Sem a reforma da Previdência, nós não vamos fazer nada.

DINHEIRO – O Brasil deu errado?
Não. O Brasil não é um fracasso. O problema do País foi não entender que deveria ter preservado a sua indústria. A indústria brasileira chegaria a ser, segundo o Banco Mundial, a mais sofisticada do mundo subdesenvolvido.

IKEDA – O que falta para o Brasil crescer no mesmo ritmo da média mundial?
Falta manter um estímulo ao setor industrial adequado. Não é simplesmente proteção. É devolver ao setor industrial as condições isonômicas de sua competição que lhe foram roubadas nos últimos 40 anos.

DINHEIRO – O câmbio valorizado durante vários períodos acabou matando a indústria brasileira?
Todos os governos depois do Collor usaram o câmbio para controlar a inflação. E faziam o seguinte. Davam subsídio pra indústria, que chegou a 1% do PIB por ano, e a indústria não crescia. Por quê? Porque você estava valorizando o câmbio. Quando dava subsidio pra indústria, mas deixava o câmbio valorizado, você estava dando subsídio, na verdade, para a indústria chinesa. É incrível que isso tenha durado 12 anos sem que a gente percebesse. O resultado final é que o Brasil virou uma colônia da China.

PASTORE – O sr. é um adepto de um Estado grande e poderoso. As evidências mundiais são de que a corrupção cresce proporcionalmente ao tamanho do Estado. Como então blindar o governo da corrupção?
O Pastore está equivocado. Sou favorável a um Estado forte, mas pequeno, enxuto. Um Estado regulador e não executor. A não ser em casos absolutamente excepcionais, tudo deve ser feito através do setor privado. Está na Constituição. Basta obedecê-la.

DINHEIRO – No mês passado, a Polícia Federal, no âmbito da Lava Jato foi até a sua residência para investgar uma denúncia. O sr. fez algo ilegal?
Não. Eu prestei uma consultoria para montar um consórcio que disputou o leilão da Usina de Belo Monte. Recebi R$ 3 milhões como honorários, em parcelas e de várias fontes. Tudo declarado.

ROSENBERG – Entre os presidenciáveis Geraldo Alckmin (PSDB) e Alvaro Dias (Podemos), quem está mais a altura do Brasil em 2019 ?
São duas personalidades importantes, que têm grande experiência como governadores. Estão à altura de administrar o País.

DINHEIRO – Os pré-candidatos Ciro Gomes (PDT) e Fernando Haddad (PT) estiveram no seu escritório, na segunda-feira 23, para uma reunião. Está surgindo uma chapa de esquerda?
Não acredito. O Ciro não abre mão de ser o cabeça de chapa. O PT não pode abrir mão, pois encolheria no Congresso. Creio que aliança apenas no segundo turno.

DINHEIRO – Durante as nossas conversas, o sr. falou sobre a importância do STF, o potencial eleitoral de um candidato com personalidade forte e uma trajetória de vida inspiradora, e eu comecei a imaginar o Joaquim Barbosa…
Você está imaginando bem.