28/01/2009 - 8:00

DINHEIRO – O sr. é o mais longevo presidente da história do Banco Central. O que isso representa para o sr.?
HENRIQUE MEIRELLES – Representa muita dedicação e foco no resultado. Foram anos de trabalho ininterrupto pela estabilização da economia, o que permitiu que pela primeira vez o Brasil usufruísse daquilo que chamo de dividendos da estabilidade.
DINHEIRO – Quais foram as principais conquistas da sua gestão? E quais foram as incompreensões?
MEIRELLES – As conquistas foram o cumprimento das metas de inflação por cinco anos consecutivos, a construção de reservas de mais de US$ 200 bilhões e a obtenção de grau de investimento. Estes fatores, em conjunto com a queda da relação dívida publica/PIB e os programas sociais, permitiram que a taxa média de crescimento do PIB no governo Lula, medida de 2004 a 2008, tenha sido superior ao dobro da média dos 23 anos anteriores. O que gera incompreensão é a manutenção da estabilidade em um ambiente em que os benefícios da estabilização não são conhecidos por todos. Em consequência, muitos enxergam apenas os supostos custos. Diversos setores fazem pressão constante pela violação dos limites da prudência.
DINHEIRO – Como tem sido sua relação com o presidente Lula?
MEIRELLES – Tem sido uma relação de confiança mútua, solidariedade e uma visão comum dos objetivos da política econômica do Brasil.
DINHEIRO – Vez por outra, há rumores sobre sua permanência no BC e eventuais planos políticos. Como o sr. reage?
MEIRELLES – É uma reação de serenidade na medida em que julgo isto como ruído natural no processo político. É importante para o presidente do BC manter o foco na economia e não desviar a atenção para assuntos não prioritários.
DINHEIRO – O Brasil vem sendo apontado como um país resistente à crise. A que o sr. atribui essa condição?
MEIRELLES – É o resultado de um trabalho consistente de implementação do regime de metas de inflação, câmbio flutuante e de metas de superávit primário. O Brasil também passou de devedor ocasionalmente inadimplente a credor líquido internacional. Esta posição de credor em moeda externa gerou um decréscimo da dívida pública como percentagem do PIB. Isto é um importante fator estabilizador nesta crise. Em resumo, houve um fortalecimento do Estado brasileiro.
DINHEIRO – Os bancos internacionais necessitarão de novas capitalizações?
MEIRELLES – Sim. Acredito que ainda haverá necessidade de capitalizações adicionais nos principais bancos dos países atingidos pela crise de crédito.
DINHEIRO – Como o sr. avalia a saúde do sistema financeiro nacional?
MEIRELLES – O sistema financeiro nacional não está exposto à crise de crédito americana. Entrou neste processo com um índice de capitalização acima dos limites estabelecidos pelo BC do Brasil, limites estes que são mais conservadores que a média mundial. Fui encarregado de apresentar em uma reunião recente de presidentes de bancos centrais um relato das principais medidas regulatórias a serem implementadas como lição tirada desta crise. Na preparação, ficou claro que a grande maioria das medidas propostas já está implantada no Brasil. Esta é uma das razões do desempenho relativamente superior do Brasil nas atuais circunstâncias.
DINHEIRO – Com o agravamento da crise, o real se tornou uma moeda muito volátil. O que explica isso?
MEIRELLES – A moeda brasileira tem um índice de correlação significativo com o preço das commodities e, em consequência, a queda rápida destes preços foi um dos fatores importantes da depreciação do real. No entanto, é necessário mencionar que a taxa média nominal do real desde a inserção do regime de câmbio flutuante é 2,34 reais por dólar, que é um valor próximo da cotação atual.
DINHEIRO – Com que cenários o BC trabalha para 2009?
MEIRELLES – A situação americana é grave e esperamos uma contração não só nos EUA, mas na maior parte dos países centrais. O Brasil está sendo considerado pela OCDE o país de melhor desempenho entre os 29 países seguidos por aquela organização. Significa que sairemos mais rápido da crise.