17/02/2002 - 7:00
Se é verdade que a política converteu-se em mero espetáculo, então George W. Bush, o presidente dos Estados Unidos, pode ser considerado o novo rei do riso ? um comediante irrefreável, capaz de gerar espontaneamente aquela faísca de surpresa e constrangimento que faz a delícia da platéia. Na semana passada, em visita oficial ao Japão, o homem mais poderoso da Terra honrou a tradição familiar e não parou de tropeçar na própria língua. Seu pai, George Bush, desmaiou em 1992 durante um jantar com o primeiro-ministro japonês. Foi o momento mais baixo de uma viagem eleitoreira que pretendia mostrar o indeciso presidente como durão, capaz de arrancar concessões comerciais dos ?amarelos?. O plano terminou com George Pai vomitando inconsciente com a cabeça amparada nas pernas de Kiichi Miyazawa. Perdeu a eleição para Bill Clinton. George Filho, que às vezes desmaia comendo pretzel, dessa vez poupou o cerimonial japonês, mas também fez das suas. No lance mais desastrado, confundiu deflação com desvalorização durante uma entrevista sobre economia e fez disparar o mercado internacional de moedas, que entendeu que o yene seria desvalorizado. Ao tentar ser simpático, comparou o primeiro-ministro Junichiro Koizumi a um astro do beisebol americano de origem japonesa: ?Ele também rebate qualquer coisa que você atire nele?. Ha, ha.
A sucessão de gafes do jovem Bush, somadas à memorável dislexia do pai ? que uma vez chegou a dizer que o povo americano sabia separar ?o justo do injusto, o feio do infeio? ?, resultou na criação de um termo novo, o bushismo. Ele designa, segundo o jornalista americano Mark Miller, autor do livro O (Dis) Léxico de Bush, ?qualquer estupidez dita pelo pai ou pelo filho?. Que não são poucas. Na lista de Bush Filho estão pérolas como ?os republicanos entendem a importância do cativeiro entre mãe e filho? e ?cada vez mais nossas importações vêm do exterior?. Parece pouco? Que tal então ?eles me malestimaram? (querendo dizer subestimaram) ou então ?a família é onde as asas criam sonhos?. Seu pai, que confundia a geografia dos Estados americanos e era capaz de sentar à mesa antes da rainha da Inglaterra, tinha a ampará-lo alguma experiência internacional de primeira mão. O filho, nem isso. ?Tenho boas relações com os grecianos?, disparou há dois anos.
Em um país acostumado ao charme dos Kennedy, ao industrialismo dos Ford e à vocação para a fortuna dos Rockefeller, deve ser estranho ter no poder um outro tipo de inclinação hereditária, a da batatada. É espantoso que um sujeito atrapalhado como Bush tenha vencido a corrida para a Casa Branca. Tudo sugere que o processo seletivo das eleições pregou uma peça nos americanos. Entregou a eles um humorista involuntário, que é o sonho dos cartunistas, em meio à maior crise econômica e diplomática das últimas décadas. Dias atrás circulou na internet um hilariante mapa mental de Bush Filho. Nele, o Oriente Médio é identificado apenas como ?aqui tem Osama? e a Rússia pela inscrição ?dizemos que somos amigos deles?. A piada é fabulosa, mas parece estar perto demais da verdade para que o mundo durma tranqüilo.