29/08/2014 - 20:00
A parceria deu liga. A relação entre os bilionários Jorge Paulo Lemann e Warren Buffett, que começou ao tempo em que ambos participavam do conselho de administração da Gillette, nos anos 1990, se tornou uma máquina de negócios. Os dois investidores já haviam juntado forças e suas fortunas para adquirir, no ano passado, o controle da fabricante americana de catchup Heinz, por US$ 23,3 bilhões. Na terça-feira 26, foi a vez de anunciarem mais uma tacada de grande porte. A cadeia americana de lanchonetes Burger King Worldwide ofereceu US$ 11,4 bilhões para adquirir a rede canadense de cafeterias Tim Hortons.
O negócio está sendo liderado pela 3G Capital, a empresa de investimentos liderada por Lemann, ao lado dos seus parceiros Marcel Telles e Carlos Alberto Sicupira, que controla a Burger King desde 2010. E conta com uma ajuda valiosa, mais precisamente de US$ 3 bilhões, da holding Berkshire Hathaway, de Buffett. O negócio vai criar uma gigante do setor de alimentação, com faturamento de US$ 23 bilhões e 18 mil pontos de venda. Buffett, considerado o mais bem- sucedido investidor das últimas décadas e um habitué do pódio nos rankings de maiores fortunas do planeta, parece ter encontrado em Lemann uma espécie de parceiro ideal.
Chegou até a classificar a 3G – que conta também com o executivo brasileiro Alex Behring, presidente do conselho da Burger King – como o melhor time de administradores do mundo. Durante reunião em maio deste ano, com os acionistas da Berkshire, o chamado “Oráculo de Omaha” afirmou que poderia se associar à 3G para coisas “muito grandes”. Especulou-se, por exemplo, que entre os alvos poderiam estar o controle da Coca-Cola, empresa que sempre esteve no radar dos dois bilionários. Buffett, no entanto, negou essa intenção em entrevista ao canal de tevê americano CNBC, em junho.
A Tim Hortons está longe de ser uma companhia do porte da fabricante do refrigerante mais popular do mundo, mas tem características comuns às empresas que Lemann e Buffett procuram. “É bem o tipo de empresa que atrai os dois: um negócio de receita recorrente, previsibilidade de receita, pouco sujeita a oscilações econômicas e de consumo básico”, diz Alberto Serrentino, dono da consultoria Varese Retail. É o caso também da Burger King e da Heinz, assim como da AB Inbev, a cervejaria controlada por Lemann. E também de duas companhias americanas que fazem parte do portfólio de investimentos de Buffett: a See’s Candies, de doces, e a Dairy Queen, que vende sorvetes e hambúrgueres.
Não por acaso todas elas são do setor de alimentação. A favor da Tim Hortons está também uma onipresença no mercado canadense de fazer parecer tímida a capilaridade da rede Starbucks nos EUA. A empresa, fundada em 1964, na província de Ontário, pelo ex-jogador de hóquei Tim Horton, é um verdadeiro ícone canadense, com uma cafeteria para cada 9,5 mil pessoas. A Starbucks, em comparação, possui uma loja para 28 mil americanos. Estima-se que a rede venda 80% do café consumido fora de casa, no Canadá, e que cada habitante do país gaste em média US$ 150 por ano em suas lojas.
A Tim Hortons, que é chamada de Timmy’s por seus conterrâneos, também comercializa os populares donuts Timbit. “A marca Tim Hortons tornou-se parte do perfil canadense”, afirmou Marc Caira, presidente da empresa adquirida. “O Timbit se tornou um símbolo do país assim como o castor e a polícia montada.” Além de herdar um negócio estabelecido, a Burger King ganhará uma outra vantagem que não será ignorada. Com a transação, a sede mundial da rede de lanchonetes se mudará de Miami, na Flórida, para o Canadá. Com isso, passará de um país com taxa média de impostos para as empresas de 35% para outro em que a porcentagem é de 15%.
Esse anúncio causou revolta em analistas econômicos e políticos americanos. Buffett respondeu, ao jornal britânico Financial Times, que a mudança é natural, já que a empresa canadense ganha mais dinheiro que a Burger King, e que a mudança da Tim Hortons para a Flórida desagradaria os canadenses. “Esse não é um negócio motivado por benefícios fiscais”, disse Behring, presidente do conselho da Burger King, em teleconferência com a mídia. “É uma questão de crescimento e criação de valor.” Mas, com certeza, esse benefício nas contas vai facilitar ainda mais o trabalho de passar a tesourinha nos custos, pelo qual o time da 3G é reconhecido e que agrada tanto a Buffett.