20/07/2005 - 7:00
DINHEIRO ? O sr. repete à exaustão que a tecnologia GSM utilizada na telefonia celular está com os dias contados. A análise do mercado mostra uma realidade diferente. O GSM representa 42% de todos os telefones em operação no País. O seu discurso não está na contramão dos fatos?
MARCO AURÉLIO RODRIGUES ? O GSM vai morrer. Tudo é uma questão de tempo. Essa é uma tecnologia em estado terminal que já cumpriu o seu papel histórico e que está ultrapassada. A terceira geração da telefonia celular, que permite a transmissão de dados e até a exibição de vídeos de alta resolução no celular, não comporta o GSM. Basta olhar como a Europa, continente berço do GSM e dono de uma base significativa de usuários, está olhando o futuro desse mercado. Lá, a tecnologia escolhida para a terceira geração é o WCDMA, uma evolução do CDMA como já conhecemos hoje. Empresas como a Telefônica, na Espanha, e a inglesa Vodafone já estão desistindo do GSM.
DINHEIRO ? O fato do sr. vender a tecnologia concorrente do GSM não o transforma em suspeito para fazer esse julgamento?
RODRIGUES ? Os fatos e os números reforçam meu argumento. Atualmente 153 operadoras em 68 países já migraram para a nossa plataforma. Há 180 milhões de usuários no mundo utilizando a tecnologia da Qualcomm. Nesse caso, eles e eu podemos estar errados, mas é difícil.
DINHEIRO ? Como o GSM pode morrer em um mercado no qual ainda existem linhas analógicas em operação? O sr. não está sendo excessivamente otimista?
RODRIGUES ? Concordo que nada muda da noite para o dia. Agora lembre que os analógicos já foram 100% do mercado e hoje representam apenas 3%. São uma espécie em extinção. Por isso insisto na morte do GSM. Lá na frente teremos uma base de usuários dessa tecnologia tão irrisória quanto a dos analógicos.
DINHEIRO ? E os donos de celulares GSM? O que farão com os aparelhos?
RODRIGUES ? O caminho natural é a aposentadoria e a troca por equipamentos mais modernos. Não existe meio termo nessa migração. Esse é o custo do ingresso no novo mundo da telefonia celular. Quem desejar ficar no modelo atual não terá problemas no início, algo parecido com a migração dos celulares analógicos para os digitais, mas daqui a alguns anos a terceira geração será hegemônica com a ajuda do WCDMA.
DINHEIRO ? No mercado brasileiro, o GSM tem uma posição bem confortável. São quatro empresas com essa tecnologia contra uma, a Vivo, que resiste no CDMA. O sr. não acha que por aqui as suas previsões terão mais dificuldades de emplacar?
RODRIGUES ? É inquestionável que existe no mercado brasileiro uma das mais ferozes competições em torno das duas tecnologias. Só gostaria de registrar a força da Vivo. Mesmo com a pressão dos adversários, a operadora é aquela que apresenta os melhores resultados operacionais. Tem quase o dobro de clientes da segunda colocada e está em franca expansão. (Nota da Redação: A Vivo tem 27 milhões de usuários contra 14 milhões da TIM, segundo a consultoria Teleco). A companhia ganhará mais mercado com a terceira geração de telefones celulares, lançada há duas semanas no País.
DINHEIRO ? As previsões mostram que esse ano as vendas de celular no Brasil crescerão entre 25% e 30%. Os aparelhos de terceira geração já aparecerão nesse resultado?
RODRIGUES ? Esse ano ainda teremos um número pouco expressivo, quase insignificante. Acredito que mesmo em 2006 o novo sistema não terá uma explosão de consumo. O mercado de terceira geração começará a ser construído logo após o governo vender as licenças para as operadoras atuarem nesse setor. É um processo demorado porque está carregado de burocracia. Na melhor das hipóteses essas freqüências serão ofertadas esse ano para serem vendidas no primeiro semestre do ano que vem. Então estamos falando, levando em conta meu otimismo, que esse processo começará a tomar forma na segunda metade de 2006. Até lá, a Vivo será a única nesse mercado. Na Europa esse leilão já foi feito há cinco anos. As licenças americanas, japonesas e coreanas também já foram abertas. Se o Brasil não tomar cuidado ficaremos muito atrás do mundo desenvolvido onde a terceira geração já é uma realidade.
DINHEIRO ? Quais são as vantagens do WCDMA?
RODRIGUES ? A transmissão de dados, o serviço de voz e o acesso à internet são bem mais rápidos e sofisticados. Você imagina assistir ao seu canal preferido de TV no celular? Com WCDMA isso é possível. Com GSM, não. Essa nossa tecnologia permite transformar o celular numa central de entretenimento para o usuário com recursos hoje só existentes nos computadores tradicionais. Há ainda uma vantagem para as empresas de telefonia. Numa mesma freqüência de WCDMA é possível colocar mais assinantes do que com o GSM. Isso aumenta a rentabilidade do negócio e reduz custos operacionais. Mas não foi isso que fez mudar o mundo. O fato relevante é a velocidade na transmissão de dados que permite a tão comentada convergência digital.
DINHEIRO ? De quanto foi a participação na receita da Qualcomm no ano passado dos direitos autorais gerados em função das licenças de WCDMA?
RODRIGUES ? Representou 32% do lucro total e, a longo prazo, essa participação aumentará de maneira significativa.
DINHEIRO ? O celular de terceira geração que a Vivo lançou custa cerca de R$ 1.999. Não é muito caro, já que além do aparelho os usuários pagarão também pelos serviços?
RODRIGUES ? Os preços nessa área caem muito rapidamente. Esse problema de custo vai ser resolvido quando acontecer a massificação da tecnologia. É assim que funciona esse mercado. Lembro que no início da telefonia celular no País um aparelho era vendido por R$ 20 mil, algo impensável para os padrões atuais. Quanto custa hoje? Atualmente é possível comprar um celular por menos de R$ 100 e ainda dividir o pagamento em dez vezes sem juros. No exterior, por exemplo, já em 2007, um equipamento de terceira geração custará US$ 120, que nada mais é do que o valor pago hoje por um aparelho de segunda geração. Nesse ano espera-se vender no mundo todo cerca de 50 milhões de unidades já funcionando no padrão de terceira geração. Em 2006 o crescimento vai ser maior por causa da adoção dessas redes na Europa. O Brasil virá em seguida.
DINHEIRO ? Quais seriam as outras vantagens da terceira geração para o Brasil?
RODRIGUES ? Há um novo mercado em franca expansão no resto do mundo. O Brasil pode ganhar contratos internacionais de exportação de aparelhos. Esse é um processo natural. De janeiro até abril desse ano, o País já havia exportado cerca de 9,4 milhões de celulares. Os Estados Unidos, por exemplo, são hoje o nosso maior comprador e imagine o que acontecerá quando os usuários americanos resolverem trocar os seus telefones por produtos de terceira geração. Isso vai criar uma forte demanda. Quem não se atualizar e deixar de redesenhar os seus produtos para o mercado externo perderá clientes e vamos ficar estacionados no passado. Há outro aspecto. A abertura de novos serviços gera a necessidade de mais desenvolvimento, de mais aplicativos e cria oportunidades de emprego. Serão mais estimulados mercados como jogos para celular, de transmissão de vídeo entre outros.
DINHEIRO ? Como o sr. avalia a taxa de assinatura básica, que hoje desperta críticas de consumidores e do próprio governo?
RODRIGUES ? Concordo que a assinatura é uma taxa que incomoda muito, mas ela faz parte da equação de viabilidade das empresas de telefonia. Se ela deixar de existir ou sofrer uma redução de valor, certamente o preço atual cobrado pelas chamadas também será alterado. A assinatura básica é uma constante no cenário mundial e é exatamente por isso que as chamadas geradas pela rede fixa são muito baratas. Obviamente que essa discussão sempre irá existir e, na minha visão, discutir tarifas sempre faz bem.
DINHEIRO ? Mas o preço cobrado no Brasil, perto de R$ 40 por cliente, não pode ser considerado abusivo?
RODRIGUES ? Certamente esse valor é mais ou menos o mesmo cobrado no mundo todo, isso se a taxa não for mais alta fora do Brasil. Por isso que eu digo que ela é vista como injusta, mas é necessária para as companhias. Se pegarmos o resultado de qualquer operadora no mundo acho muito difícil encontrar alguma companhia que tenha uma rentabilidade acima de 10%. Imagina se o sistema for mudado. Nesse setor, as margens são muito apertadas.
DINHEIRO ? O que o sr. achou da indicação do senador Hélio Costa para o Ministério das Comunicações?
RODRIGUES ? Ele sempre teve uma forte ligação com a área de comunicação e isso representa um avanço para a pasta. O ministério teve uma importância histórica no processo de evolução das telecomunicações no Brasil. Precisamos enfatizar que agora estamos vivendo uma nova fase no setor de telecomunicações em que as convergências tecnológicas irão trazer grandes desafios para o governo e para a Agência Nacional de Telecomunicações.
DINHEIRO ? Qual deve ser o papel da Anatel nesse novo mundo?
RODRIGUES
? O Brasil definiu há alguns anos que a infra-estrutura de telefonia seria responsabilidade da iniciativa privada, ou seja, você precisa de uma licença do governo, mas é uma atividade de investimento privado. Em se tratando de telefonia celular, o governo tem um certo controle e detém a possibilidade ou não de oferecer freqüência. Então, na minha visão, a posição correta do governo seria dar uma abertura maior e mais rápida para que ocorra a modernização e o Brasil não fique ultrapassado em relação a outros países desenvolvidos ou em desenvolvimento. Dizendo de uma forma muito simples, a Anatel tem que promover o quanto antes o leilão de freqüências e não há uma justificativa razoável para que ela prolongue isso. Adiar nada mais é do que brecar o desenvolvimento do País.