A segunda maior empresa de luxo do mundo, a suíça Richemont, dona de grifes como Montblanc, Piaget, IWC Schaffhausen e Cartier, estará sem CEO a partir de março de 2017. Mas isso não significa que a companhia ficará à deriva. O fundador Johann Rupert, magnata sul-africano dono de uma fortuna estimada em US$ 6 bilhões, decidiu reassumir, sem alarde, as rédeas do negócio, que vinha de mal a pior nos últimos meses sob a gestão do presidente-executivo, Richard Lepeu, e do diretor financeiro, Gary Saage. Ambos, coincidência ou não, anunciaram que irão se aposentar em 2017.

O discurso oficial é de que as mudanças não representam nenhum conflito na alta cúpula do grupo, mas sabe-se nos bastidores que a troca de comando reflete a insatisfação de Rupert com o desempenho de seus principais executivos. E com razão. Enquanto a rival francesa LVMH, líder no mercado de luxo, contabilizou uma alta de 8% no faturamento, entre janeiro e setembro deste ano, as receitas da Richemont caíram 13%, de € 5,8 bilhões para € 5 bilhões. No ano passado, a Richemont teve uma pequena alta de 5% em comparação ao ano anterior: pulou de € 10,4 bilhões para € 11 bilhões.

“A Richemont está enfraquecida”, diz René Weber, analista do banco suíço Vontobel. “O último relatório da empresa, divulgado há duas semanas, prevê a demissão de 200 pessoas dentro desse processo de reestruturação.” O analista aponta como erro do grupo, a precificação de seus produtos. “O mercado da relojoaria tem sofrido com a queda das exportações. Mas, os altos preços dos relógios da Cartier, por exemplo, fazem também com que o consumidor prefira outras marcas de luxo.” Assim que assumir a direção de sua empresa, sem data prevista para a contratação de um novo CEO, Rupert deixará apenas o atual vice-presidente, Burkhart Grund, no time da alta cúpula.

No conselho de administração, embora a empresa não confirme, especula-se que boa parte será desligada – de um total de 13 executivos, atualmente. Em comunicado, Rupert não comenta sobre a saída de Lepeu e justifica que a queda tem relação com o atual cenário. “As vendas e os lucros inferiores refletem a dificuldade do mercado global”, disse Rupert, lamentando que o lucro operacional do grupo despencou 43% neste primeiro semestre. O contraste entre a queda da Richemont e da alta da LVMH é atribuído por especialistas às estratégias opostas adotadas pelas duas gigantes do luxo – e a alguns equívocos dos executivos do grupo suíço.

Enquanto a LVMH apostou na diversificação de mercados, como bebidas, roupas, joias e relógios, a Richemont se dedicou mais aos segmentos de joias e relógios, por imposição do atual CEO. Estes dois setores foram mais afetados pela turbulência econômica global nos últimos anos e, espeficamente na relojoaria, a oscilação do franco suíço pressionou os custos e prejudicou as exportações. “Se a empresa não tiver subsegmentos para se equilibrar, certamente irá sofrer, já que algumas áreas são atingidas mais do que outras em tempos de crise”, afirma o professor Silvio Passarelli, coordenador do curso de Gestão do Luxo da Faap.

Mesmo diante de cenário desafiador no horizonte, o mercado premium, de forma geral, tem crescido. No primeiro semestre deste ano, o mercado global de artigos de luxo registrou crescimento de 4%, de acordo com um estudo elaborado pela consultoria Bain & Company em parceria com a fundação italiana Altagamma. Em todo o ano de 2015, a expansão foi de 5%. “O segmento de luxo alcançou seu ponto de maturação, por isso, as marcas devem adotar estratégias diferenciadas, se quiserem ser bem-sucedidas”, afirma o sócio da Bain & Company no Brasil, Gabriele Zuccarelli.

Já para Armando Branchini, vice-presidente da Altagamma, os relógios e as joias estão entre os bens de luxo que podem ser considerados “bens de investimento”, não apenas “bens de consumo” e, portanto, a Richemont deverá se recuperar em breve. “A empresa tem uma posição de oligopólio em joias e possui algumas das melhores marcas de relógios que existem no mercado. Estou convencido de que a Richemont é uma empresa com um futuro positivo”, afirma. De acordo com René Weber, do banco suíço Vontobel, a retomada da Richemont poderá ser observada já em 2017. “Estou certo de que, com as mudanças em curso, a Richemont conseguirá recuperar seu bom desempenho”, afirma. Se Weber estiver certo, as dificuldades do grupo suíço estão com os dias contados.

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Todas as joias da Richemont

Conheça algumas das marcas do grupo suíço fundado em 1988, hoje o segundo maior conglomerado de luxo do mundo:

► Piaget
► Vacheron Constantin
► Van Cleef & Arpels
► Baume & Mercier
► Jaeger-LeCoultre

• Marcas: 19
• Faturamento: € 11 bilhões (em 2015)
• Funcionários: 28,8 mil
• Valor de mercado: US$ 65,5 bilhões