O mês de setembro deste ano poderá entrar para a história do setor de alta tecnologia no Brasil. No começo da primavera, será inaugurada em Porto Alegre (RS) a primeira fábrica brasileira de semicondutores, ou chips, o coração de qualquer aparelho eletroeletrônico, seja um rádio de pilha, seja um notebook de última geração. No momento em que a fita de inauguração for cortada, um antigo anseio da indústria eletroeletrônica do País será finalmente concretizado.

Desde a abertura do mercado, no início dos anos 90, as empresas do setor têm na exportação sua única fonte de suprimento para esse tipo de componente. A economia do País também sofre ? e sofre um bocado. A ausência de produção local de chips ajuda a alimentar o enorme déficit em eletroeletrônicos. Em 2006, a balança comercial do setor registrou saldo negativo de US$ 10 bilhões e, neste ano, a estimativa é de que o número chegue a US$ 12 bilhões.

?Temos que incentivar a produção de semicondutores no Brasil. Não há outro jeito para corrigir esse déficit?, diz Humberto Barbato, presidente da Abinee (Associação Brasileira da Indústria Elétrica e Eletrônica).

O nascimento dessa fábrica teve como parteiro o próprio governo federal. De seus cofres, sairão os R$ 200 milhões necessários para o empreendimento. A unidade será tocada por uma estatal, o Ceitec (Centro de Excelência em Tecnologia Eletrônica Avançada), criado em 2003 pelos governos federal, do Rio Grande do Sul e de Porto Alegre. O órgão conta com a colaboração de universidades da região sul e de empresas privadas como a Motorola, responsável pela cessão de equipamentos necessários para a fábrica. Até agora, o Ceitec era capaz apenas de produzir algumas partes dos chips. A partir de setembro, ele poderá fabricar o ciclo completo de semicondutores. ?Vamos atuar em 85% do mercado nacional?, diz Sérgio Souza Dias, presidente do Ceitec. Dias está se referindo a volumes, não a valores. Isso porque o Ceitec se dedicará à fabricação dos chips mais simples, não aqueles de maior valor agregado, utilizados em equipamentos de tecnologia de ponta, como celulares, laptops e computadores de mesa. Mas ele será compatível com aparelhos de televisão digital e para aplicações em automação industrial. ?Vamos começar a competir onde é viável nesse momento?, explica Dias.

Mas os planos são ambiciosos. Dias já planeja levar o Ceitec às bolsas dentro de algum tempo.

Quando operar em sua capacidade máxima, dentro de três a quatro anos, a fábrica produzirá quatro mil lâminas de chips por mês (cada lâmina pode construir cerca de 400 chips) , o que significará um faturamento anual de R$ 40 milhões. Somente o centro de design deverá gerar metade desse montante. No total, 250 funcionários trabalharão na empresa, sendo 120 profissionais dedicados às sete design houses do Ceitec (centros que projetam semicondutores).

Mesmo a plena carga, a fábrica na capital gaúcha não será suficiente para zerar o déficit do setor eletroeletrônico no País, mas é um primeiro passo, na visão de especialistas. ?A inauguração abre perspectivas para a exportação brasileira de componentes eletrônicos. À medida que o Ceitec acelere sua atividade, a confiança e o interesse por investimentos na área crescerão?, avalia José Camargo da Costa, professor titular em engenharia eletrônica da Universidade Federal de Brasília.