Está lá no Orkut: a comunidade brasileira de fãs da Dolce & Gabbana (D&G) em polvorosa especulando sobre o desembarque da grife italiana no Brasil. Foi tanto burburinho que o empresário André Brett mandou um funcionário entrar no site e acalmar os ânimos com o seguinte recado: ?Informamos que a primeira loja Dolce & Gabbana no País será aberta dia 4 de novembro, no Shopping Iguatemi, em São Paulo?. A vinda da marca ? que fatura E 600 milhões no mundo ? é a mais recente conquista de Brett. Esse húngaro cortês e elegante de 62 anos é um dos maiores responsáveis pelo desenvolvimento da moda brasileira. Em quatro décadas (ele começou aos 17, desenrolando tecido na confecção do pai, a lendária Vila Romana), Brett trouxe ao País sete das maiores grifes de luxo do planeta: Pierre Cardin, Calvin Klein, Yves Saint Lauren, Christian Dior (estas não estão mais em suas mãos), Armani, Ermenegildo Zegna e agora a D&G. ?O melhor é que não corremos mais atrás. Foi a D&G que nos procurou?, diz, em um de seus raros momentos de imodéstia.

A nova loja terá 380 m2, num projeto de R$ 5 milhões (valor estimado pelo mercado). Ela se somará aos quase 3 mil m2 das três Empório Armani, uma Giorgio Armani, e duas Zegna já abertas por Brett e sua sócia Michelle Nasser. ?Também já estamos negociando um ponto no Rio de Janeiro?, diz Michelle. ?Além disso, nos tornamos representantes exclusivos da D&G no Brasil.? Isso significa que os italianos abriram mão de dois pontos-de-venda multimarcas poderosos (Daslu e NK Store) para concentrar os negócios com Brett e Michelle.

?O André sempre escolheu as marcas apropriadas para o comportamento de compra do brasileiro?, elogia Luciane Robic, da consultoria IBModa. Ela explica que a moda nacional começa a respirar os ares de um novo luxo, o das grifes menos clássicas. ?Nesse movimento, que eu chamo de luxo alternativo, o poder de ostentação está em baixa, perdendo terreno para a descontração?, diz a analista. ?E o André trouxe logo a D&G, um dos maiores expoentes dessa nova fase.? Giorgio Armani assina embaixo: ?No nosso caso, a escolha de André e Michelle foi ideal não só por causa de seu profissionalismo num mercado altamente competitivo, mas também porque eles conhecem e entendem a minha filosofia de moda e o meu design?, disse o estilista à DINHEIRO.

A história de Brett com as marcas de luxo remonta a 1970, quando a Vila Romana começou a produzir ternos Pierre Cardin em sua fábrica na Lapa, em São Paulo. ?O diretor da filial brasileira de uma tecelagem francesa me apresentou ao Cardin em Paris?, conta Brett. ?Naquela época existiam oito fábricas de ternos no Brasil. E elas faziam produtos muito parecidos. Colocar uma etiqueta internacional nos nossos foi uma tentativa de diferenciação.? O consultor de varejo de moda Edson D?Aguano vai além: ?Naquele tempo, você tinha ou os ternos caretas da Garbo, ou os modernos do George Henry. Quando a Vila Romana apareceu com o meio-termo foi uma revolução?, diz ele.

Empolgado com o sucesso, Brett foi bater à porta da Yves Saint Lauren em 1974. Para seu espanto, os executivos franceses já tinham
ouvido falar dele e da Vila Romana. ?Fechei o contrato mais rápido da minha vida. No mesmo dia estava tudo assinado.? Aí não foi difícil repetir a dose em Nova York, com o pessoal da Calvin Klein. Nos anos 80, em função dos licenciamentos internacionais, a Vila Romana se tornou uma potência. Abastecia 3 mil lojas no Brasil e nos Estados Unidos. Tinha 7 mil funcionários. Em 1987, a empresa faturava US$ 67 milhões. Três anos depois, US$ 120 milhões. ?Foi quando o André me deu um apartamento como prêmio pelos bons resultados?, conta Chu Kong, então vice-presidente da empresa. Mas aí veio o Plano Collor.

A Vila Romana viu evaporar seus próprios investimentos e parou de receber dos clientes. Era o começo do fim. Brett chegou a ensaiar um drible na crise abrindo uma loja de fábrica. ?Todo mundo achou uma tacada de marketing genial, mas era desespero mesmo. O que íamos fazer com a mercadoria devolvida pelos clientes que não conseguiam nos pagar??, pergunta. Com dívidas de US$ 10 milhões, a Vila Romana foi vendida a um grupo holandês em 1992. Brett decidiu nunca mais se meter no ramo têxtil. ?Foi um processo traumático. Precisei me desfazer de boa parte de meus bens para quitar os débitos?, explica.

Mas um dia a amiga Michelle o procurou. Giorgio Armani queria voltar ao Brasil, dessa vez com uma loja e produtos fabricados exclusivamente na Itália. Mais: gostaria de fazer negócio novamente com Brett. O recado fora dado à mãe de Michelle, dona de uma luxuosa multimarcas em Genebra. Michelle tinha o capital. Brett, a experiência. Por que não arriscar? Então a família Brett começou a dar a volta por cima. E justamente no setor que um dia Brett quis esquecer. Hoje, toda ela lida com moda. Daniel, seu filho, toca a Zegna. O irmão Ladislau, com seu primogênito Alexandre, está trazendo de volta a Calvin Klein e administra as 34 lojas da grife VR. ?Perder a Vila Romana foi muito doloroso. Precisávamos dessa recuperação?, diz Ladislau.

AS MARCAS QUE ANDRÉ BRETT TROUXE AO BRASIL

 

US$ 600 milhões é a receita da mais recente conquista, a Dolce & Gabbana