Eleição nem sempre se vence pelo voto. Há casos em que, acima da vontade do eleitor, reinam as instituições. Essa tem sido a mensagem que o presidente do Tribunal Superior Eleitoral, Marco Aurélio Mello, tem transmitido aos seus interlocutores. Por isso, ele se transformou no curinga da disputa presidencial. E, mesmo que Lula vença as eleições, o Brasil correrá o risco de presenciar, pela segunda vez em sua história, o afastamento de um presidente por força legal. Esse seria o preço a se pagar pelo envolvimento de petistas graduados ? inclusive de Ricardo Berzoini, ex-chefe da campanha de Lula ? na tentativa de compra, por R$ 1,7 milhão, de um dossiê contra os candidatos Geraldo Alckmin e José Serra, do PSDB. Com o aval de Marco Aurélio, o TSE já abriu investigação sobre o caso e deu prazo de dez dias ao candidato Lula para que apresente sua defesa ? o imbróglio, portanto, irá além do primeiro turno e poderá terminar só em 2007. Mas o presidente do tribunal já emitiu sua opinião e disse que a conspiração do PT foi pior do que o caso Watergate, que provocou o impeachment de Richard Nixon, nos Estados Unidos, em 1974. Ao ser criticado por emitir um pré-julgamento, ele não voltou atrás. ?Mantenho o que disse. Não apenas pelo dossiê, mas pelo todo que tivemos até aqui, a partir do mensalão?, afirmou.

Diante do risco de que Lula possa perder o mandato ou governar sob a permanente ameaça de impeachment, os novos coordenadores da campanha petista já começaram a difundir a tese de que a ação do TSE seria um ?golpe branco?. Marco Aurélio, porém, rebate a crítica. ?As instituições estão funcionando plenamente e não há como pensar em algo que viole a ordem jurídica?. É uma tese que encontra eco no meio jurídico. ?O pedido de impeachment poderá voltar à tona?, disse Roberto Busato, presidente da OAB. Além disso, Marco Aurélio pode se ver diante de outro desafio. Se a margem de votos em favor ou contra um segundo turno for muito estreita, ele terá de arbitrar eventuais acusações de fraude nas eleições, assim como ocorreu no México.

O certo, até agora, é que o caso do dossiê poderá trazer complicações sérias ao candidato Aloizio Mercadante, que disputa o governo de São Paulo pelo PT. Isso porque foi o seu coordenador de campanha, Hamilton Lacerda, quem transportou a mala de dinheiro, numa imagem captada pelas câmeras do Hotel Ibis, em São Paulo. E isso poderá até ser a salvação de Lula. Os advogados criminalistas do PT têm usado a expressão latina qui prodest ? que indica quem se beneficiou ? para se referir ao caso. Se o alvo do dossiê era a eleição de São Paulo, o candidato Mercadante poderá até perder os quatro anos de mandato que lhe restam no Senado. Quanto ao presidente Lula, dizem os juristas, é preciso provar que o dinheiro apreendido pertencia ao caixa de sua campanha e, depois, que Lula sabia do esquema. Acima disso, estará o voto de Marco Aurélio. Seus interlocutores avisam que o ministro costuma se ater aos limites da lei. Não dá votos políticos e é um legalista, por excelência. E assim será.