Depois de tantas denúncias de caixa dois, era de se esperar que os candidatos às eleições de outubro fizessem campanhas austeras. Ou que pelo menos tentassem demonstrar isso aos eleitores ? ainda que não fosse verdade. A arrancada eleitoral de 2006, porém, sinaliza uma história diferente. Os primeiros movimentos indicam campanhas fartas, como de costume, e os tradicionais financiadores, grandes bancos e empreiteiras, já deram as caras. Um primeiro exemplo da opulência foi dado na noite da segunda-feira 23, quando o PT inaugurou o comitê nacional da reeleição do presidente Lula, em Brasília. O prédio ocupa três andares de um edifício no Setor Comercial Sul, cuja reforma saiu por R$ 600 mil ? em 2002, Lula e sua equipe ocuparam uma estrutura bem mais modesta no centro de São Paulo. Desta vez, porém, o comitê terá 150 empregados e foi montado com salas especiais para o presidente, o vice José Alencar e o publicitário João Santana. A manutenção foi estimada em R$ 400 mil mensais, dos quais R$ 22 mil do aluguel. ?É o que a campanha exige?, diz Ricardo Berzoini, presidente do PT e coordenador da reeleição. No PSDB, de Geraldo Alckmin, o comitê foi inaugurado uma semana antes, num galpão de 1,2 mil metros quadrados, no Setor Industrial de Brasília, cedido pelo senador Paulo Octávio (PFL-DF). É mais modesto. Lá foram gastos R$ 180 mil na reforma, e 70 profissionais estarão envolvidos na campanha. Mas todos os móveis e computadores são novos, assim como no comitê petista.

Pelo andar da carruagem, a propalada retração dos financiadores está longe das portas de tucanos e petistas. Berzoini mantém os números em sigilo, mas admite que os recursos vêm sendo captados como o previsto. Nega, com um sorriso irônico, que Bradesco e Itaú já tenham dado sua contribuição. ?Não tenho essa informação, mas gostaria de tê-la?, brincou. No PT, o primeiro balanço da campanha será divulgado no dia 6 de agosto. No PSDB, adota-se a mesma cautela e os assessores de Alckmin trancaram a sete chaves até as informações sobre a manutenção do comitê nacional. Quanto às previsões registradas no TSE, Berzoini acredita que os R$ 89 milhões, do PT, foram superestimados. ?Dificilmente, vamos ultrapassar 60% disso?, diz ele. Pela conta, seriam R$ 53,4 milhões ? ainda assim, bem mais do que os R$ 33 milhões declarados oficialmente em 2002. No PSDB, a previsão oficial é de R$ 85 milhões. ?É um número realista, dentro da lei, sem caixa dois?, diz o senador Sérgio Guerra (PSDB-PE), coordenador da campanha tucana. Outro número que já veio a público diz respeito à produção dos programas de rádio e televisão. No PT, o publicitário baiano João Santana receberá R$ 8 milhões pelos serviços no primeiro turno. No PSDB, estima-se um gasto de R$ 10 milhões com a produtora GW, que coordena a comunicação. Mas a despesa pode incluir, além da produção de TV, despesas com pesquisas e assessoria de imprensa.

Longe dessa fartura, estão as campanhas de candidatos de partidos menores, como Heloísa Helena, do PSol, e Cristovam Buarque, do PDT. Avessa à contribuição de empresários, a senadora não conseguiu dinheiro sequer para montar um comitê de campanha. O que lhe custou caro. Na quarta-feira 25, Heloísa Helena foi obrigada a demitir um de seus assessores. Ele estava usando a estrutura do gabinete da senadora para distribuir e-mails sobre a campanha, em flagrante desrespeito à lei eleitoral. A senadora negociou por R$ 300 mil a produção de seu programa na TV, de um minuto e 11 segundos, e mesmo assim não tem condições de cobrir a despesa. O PDT, de Cristovam Buarque, tem mais musculatura e fez um orçamento de R$ 20 milhões. O maior gasto virá da produção da TV. E o partido tratou de economizar no comitê de campanha: um espaço improvisado no auditório da sede nacional do PDT, em Brasília, com seis funcionários.

No PT, há ainda uma lupa especial por conta do uso da máquina. No comício de Brasília, o lanche da equipe foi transportado numa kombi do Palácio do Planalto. E o público teve de fazer fila e passar por detectores de metais. Tudo isso dentro da lei, no entender do TSE, pois um presidente-candidato não perde direito à proteção especial. Mas um evidente exagero de quem não sofre limites orçamentários na campanha eleitoral.