Discretamente, há dois anos, a família Feffer vinha se reunindo na sede do grupo Suzano, em São Paulo, em jantares íntimos e nas aulas de um curso promovido por uma consultoria especializada em sucessão. Os encontros foram uma idéia do próprio empresário Max Feffer, preocupado em traçar um destino sólido para a companhia de mais de R$ 2 bilhões de faturamento fundada em 1923 pelo pai, Leon, e que ajudou a construir. ?Ele sempre dizia que a união faz a força?, conta o filho mais velho, David Feffer, 45 anos, que acaba de assumir a presidência da empresa. ?Debatendo a sucessão, meu pai acreditava que nós nos manteríamos unidos e garantiríamos a perenidade da Suzano.? O esforço do empresário, vencido aos 74 anos por uma parada cardíaca no dia 2 de abril, para transferir os negócios aos herdeiros parece ter sido bem-sucedido. Depois que sua cadeira no escritório paulista ficou vazia, não demorou muito para a empresa ressurgir com uma nova feição. Papéis de executivos foram redesenhados, nomes agregados à equipe diretiva e a opção por uma gestão mais profissionalizada se evidenciou. O gigante com ramificações nos setores de papel e celulose e de petroquímica não perdeu a estatura. ?Estamos coesos como um bloco monolítico?, avisa David.

Para responder à perda do principal articulador do grupo, David quis agir logo. Mesmo abatido pela fatalidade, convocou às pressas os irmãos Daniel e Jorge, além dos nomes mais fortes da diretoria, para discutir um novo arranjo para a direção da Suzano. A começar pelas mudanças no comando e no conselho de administração. O novo presidente da companhia não acumulará, como o pai, a presidência da empresa e desse colegiado. À frente do conselho estará Boris Tabacof, um dos colaboradores mais fiéis de Max Feffer e que soma 26 anos de carreira na Suzano. ?O conselho formará a estratégia da companhia e supervisionará todas as decisões?, frisa Tabacof.

O grupo de conselheiros cresceu. Passou a contar com sete membros, contra cinco na gestão antiga. Para as vagas abertas, foram convidados o advogado Antônio Corrêa Meyer e Cláudio Tomaz Sonder, atual presidente da Celanese, empresa da companhia alemã Hoechst. Três membros da família ? os irmãos David, Daniel e Jorge ? continuarão. Na presidência da Nemofeffer, holding pela qual a família Feffer controla a Suzano, outra novidade. Para o posto foi alçado Daniel Feffer. No rol de mudanças, cinco novas vice-presidências foram constituídas para as áreas corporativa, de planejamento e controle financeiro e de desenvolvimento e jurídico, além das responsáveis pelos negócios nos setores de papel e celulose e de petroquímica. Os vice-presidentes ganharam de presente uma maior autonomia, mas assumiram o desafio de cumprir metas mais aceleradas de crescimento dos negócios nas áreas pelas quais respondem. ?Terão o compromisso de negociar com as diretorias, vender planos estratégicos, produzir com a maior eficiência possível e alcançar os resultados esperados?, cobra David. A estrutura implantada começou a ser pensada quando foi dada partida ao processo de sucessão há dois anos. ?O modelo vinha sendo analisado, mas ninguém imaginava que isso aconteceria agora. O falecimento de meu pai nos pegou de surpresa porque nossos familiares são longevos?, desabafa David. ?Portanto, cumpro essa missão com grande antecipação.? O avô, Leon, faleceu em 1999 aos 95 anos de idade.

Pela frente, o herdeiro do grupo tem grandes desafios a enfrentar, como o de vencer a acirrada disputa com concorrentes internacionais e de contornar as desastrosas conseqüências da instabilidade econômica mundial sobre o mercado de papel e celulose. A desaceleração da economia nos Estados Unidos (país que consome perto de um terço da produção de papel do mundo), nos últimos quatro meses, fez o preço da tonelada da celulose despencar de US$ 690,00 para US$ 540,00. A Suzano tem uma posição privilegiada no Brasil: detém mais de 16% da produção brasileira de papel de imprimir e escrever e 29% do mercado nacional de papel-cartão, além de responder por quase 9% do setor de celulose. Mas ainda precisa acertar as dívidas que acumula, segundo calcula o mercado, em torno de R$ 1 bilhão. Para arrumar a casa, deve também concluir o processo de integração da Bahia Sul, adquirida em fevereiro. ?Provavelmente, só em junho estaremos terminando o programa de otimização da nova companhia com os negócios do grupo?, adianta David. ?Estamos vendo que produtos são complementares e começando a pensar em alinhamento gerencial.?

Entre os projetos que a Suzano deve implementar nos próximos anos, estão a expansão da capacidade de produção e a modernização das instalações industriais da cidade de Suzano, na Grande São Paulo. Um primeiro ciclo de investimentos exigirá recursos de quase US$ 110 milhões para o biênio 2001 e 2002. ?Com os investimentos que está fazendo, a companhia terá capacidade para responder rapidamente a qualquer reação do mercado consumidor?, avalia Vicente Koki, analista da Sudameris Corretora. Na área petroquímica, o grupo continua disposto a se desfazer da Politeno, empresa que detém 12,4% da Norquisa, controladora da Copene, e apostando firme na construção da central petroquímica Rio Polímeros, no Estado do Rio, prevista para estar pronta em 2004. ?No mundo em que a gente vive, estamos sempre numa espécie de corrida de Fórmula 1?, compara David.

Com a divisão de poder que inaugura, ele quer descentralizar a gestão da Suzano. Nas duas primeiras gerações, a administração da empresa foi altamente personalista. O fundador, por exemplo, cumpria rigorosamente expediente até a morte, seguindo de perto a condução dos negócios. Da mesma linhagem, Max chegava cedo ao escritório e saía de lá só 12 horas depois, não raramente comparecia nos finais de semana ao escritório, controlava todas as decisões estratégicas e estava por trás de qualquer das inúmeras tacadas que colocaram o grupo entre os mais importantes do Brasil. ?Meu avô dizia que a diversão mais barata que existe é o trabalho?, relata Daniel Feffer, que adotou a citação como regra para a sua própria vida. Aos 14 anos, vibrou ao ser convidado pelo pai a começar a trabalhar na empresa. ?Em vez de viajar, nas férias, para o Guarujá, fui para a fábrica?, conta. Ele e os irmãos circularam por todas as áreas: florestal, comercial, marketing, finanças e logística.

David entrou no império do pai pela área comercial. Na primeira semana de atividade na Suzano, trabalhando com um dos diretores de vendas da companhia, Mario Akio, foi encarregado de varrer o departamento. ?Ele pegou a vassoura e cumpriu a ordem?, conta um empresário. ?Era uma brincadeira e hoje David diz que, graças ao episódio, pode dizer que começou sua história na Suzano varrendo o chão da empresa.? Na educação dos filhos, o mesmo estilo sóbrio. Quando meninos, os quatro filhos estudaram no Colégio Rio Branco, na capital paulista. Ao serem incumbidos de fazer um dever de casa sobre o Aeroporto de Congonhas, o empresário não titubeou: mandou que os filhos fossem de ônibus. ?A professora dos garotos ligou e chamou a atenção de Max porque achava que eles deviam ir de carro ao aeroporto?, conta o empresário.

As experiências na empresa permitiram aos filhos desenvolver habilidades parecidas com as de Max Feffer. Conhecido como temido negociador, homem articulado junto aos meios empresarial e público e dono de uma aguçada visão de futuro, Feffer lançou a empresa em novos nichos do ramo de papel e celulose, investiu na promissora atividade petroquímica e avançou em áreas como a de telecomunicações. A aptidão musical ? Max era um violinista dedicado ? seu filho mais jovem, Rubens, herdou. Pianista desde os três anos de idade, preferiu seguir um caminho solo: montou a produtora de áudio Ultra Som, que desenvolve trilhas musicais para peças de teatro e eventos empresariais.