13/05/2020 - 14:34
Do hospital para casa, a AFPTV acompanhou os profissionais de saúde em guerra contra o novo coronavírus. Uma vida marcada pela impotência diante da morte dos doentes, pelo medo de infectar seus parentes, decisões difíceis de dia e pesadelos.
Os cinegrafistas da AFP em Paris, Beirute, Estocolmo, São Paulo, Los Angeles, Dakar e Daegu acompanharam médicos, enfermeiros, motoristas de ambulâncias e auxiliares de enfermagem na linha de frente do combate no final de abril. Estes são os retratos de quatro desses heróis anônimos.
Argenteuil (subúrbio de Paris) – Axel Hirwe, 29 anos, interno em anestesia-cuidados intensivos do Hospital Argenteuil.
Às 08h30, Axel Hirwe começa suas 24 horas de plantão. Com uma bata e capas de sapato, se dirige à terapia intensiva. De repente, o alarme soa: há um paciente em parada cardíaca. Intervém. O paciente recupera o pulso, mas seu cérebro está muito danificado. Não vai sobreviver.
Existem 40 pacientes graves nesta unidade. Axel Hirwe, com seus pequenos óculos redondos, vai para outro caso. É preciso colocar um homem de bruços, para melhorar sua respiração. Há cinco pessoas mobilizadas. “Transcorre da melhor maneira possível”, avalia.
Também há os telefonemas de familiares. “Ele está melhor do que nos dias anteriores, mas ainda está em uma situação séria”, diz ele por telefone. “Devemos tranquilizá-los, mas não muito, porque os pacientes ainda estão em estado grave: estão em terapia intensiva, intubados. Mas às vezes precisam de um pouco de esperança”.
Após o plantão, volta para casa em Clichy, a cerca de 10 km do hospital. Axel tenta relaxar sem falar em medicina com os cinco colegas com quem compartilha casa. E liga para sua mãe. “Ela está muito preocupada, tento tranquilizá-la”, diz.
Beirute – Alí Awerké, de 34 anos, enfermeiro na emergência de uma unidade para coronavírus do hospital universitário Rafic Hariri.
Duas ambulâncias param em frente à emergência de coronavírus. Ali Awerké recebe um paciente que é transportado enquanto fala com outro perto da porta de entrada. “Estou indo, deixe-me instalar este paciente e vou te ajudar”. No corredor, ele diz: “Coloque aqui no primeiro quarto”.
Ele não para o dia todo. Na enfermaria, coleta o material. “Três tubos para laboratórios e para hemoculturas”. Lida com cotonetes e amostras de sangue. Atende o telefone. Cuida de um paciente: “Estenda o braço, estenda, estenda”.
Ali Awerké se ofereceu para se juntar à equipe de coronavírus no início da crise. “Eu não tinha roupas comigo, não tinha nada. Entrei para a equipe e liguei para minha esposa para dizer: ‘Vou ficar aqui e, infelizmente, não poderei te ver por um tempo'”.
Desde então, ele vive isolado na casa de seus pais em Beirute. Hoje à noite será diferente: após um teste de PCR (teste de diagnóstico), voltará para casa pela primeira vez em dois meses.
Quer fazer uma surpresa para sua família. “Estou muito feliz, vou dormir sob o mesmo teto que meus filhos e minha esposa. Sinto falta da casa, de sentar na varanda. Dois meses se passaram”, lembra. “Séculos”.
Solna (Suécia) – Lars Falk, de 43 anos, médico e chefe da unidade OMEC (Oxigenação por membrana extracorpórea) do hospital universitário de Karolinska.
O serviço está sempre cheio na unidade OMEC, onde os pacientes com dificuldade respiratória grave chegam. O equipamento é invasivo e o tratamento doloroso.
“Esperamos que os pacientes que trazemos para cá sobrevivam ao tratamento com OMEC, o que não aconteceria com o tratamento intensivo regular”, explica o Dr. Lars Falk. Com o tratamento convencional, eles morriam em 24 horas.
Há muita demanda e poucos lugares. Dr. Falk precisa tomar decisões complexas diariamente. “Temos que selecionar os pacientes certos e também as pessoas privadas (deste tratamento) e essas são decisões muito difíceis”.
Quando o médico volta para casa, com uma barba de dois dias, relaxa um pouco. “Alguns dias são mais cansativos do que outros, mas quando você vai para casa, fica com sua família e seus filhos, você se sente aliviado”.
São Paulo – Jaques Sztajnbok, de 55 anos, chefe da unidade de cuidados intensivos do Instituto de Infectologia Emílio Ribas de São Paulo.
Uma morte por dia: é a média do Instituto de Infectologia Emílio Ribas, cuja unidade de terapia intensiva está 100% ocupada desde meados de abril por casos graves de pacientes com o novo coronavírus.
Como todos os dias, o Dr. Jaques Sztajnbok está à beira do abismo. “Todos os dias temos que discutir cada caso, em cada visita e fazer testes para ver se o que funciona para um paciente também funciona para outro, estamos vendo isso todos os dias porque não temos um protocolo estabelecido porque não conhecíamos essa doença”.
Como chefe, você precisa “liderar pelo exemplo”. Mas ele está preocupado o tempo todo. Com seus pacientes e com seus colegas, muitos dos quais foram diagnosticados como positivos, “uma preocupação que nunca tivemos em epidemias anteriores”. E também com sua família. “Sempre temos essa angústia, essa preocupação com o que poderíamos levar para casa”.
Quando ele volta para casa em um bairro abastado de São Paulo com sua esposa Fabiane, especialista em doenças infecciosas do mesmo hospital, o ritual é sempre o mesmo: deixa as coisas na entrada, toma banho e coloca a roupa para lavar. Mas o COVID-19 está lá.
“No jantar, eles sempre contam o que aconteceu durante o plantão”, diz Daniel, seu filho de 10 anos.
Hoje é um dia especial, Jaques Sztajnbok completa 55 anos. Ele recebe uma surpresa, velas e um cartão de seus filhos.
“Corajoso, acho que é um adjetivo que eles não escreveram em cartões de aniversário anteriores”, conta.