A palavra “prejuízo” não costuma estar associada aos americanos Bill Gates e Warren Buffett, ou ao espanhol Amancio Ortega, dono da Zara. No entanto, uma série de eventos que começou no dia 9 de setembro fez com que eles ficassem mais pobres. Em apenas três dias úteis, até a terça-feira 13, a turbulência do mercado financeiro reduziu em US$ 93 bilhões as fortunas dos 400 homens mais ricos do mundo. Ortega viu seu patrimônio em ações encolher US$ 3,3 bilhões, para US$ 76,6 bilhões. Gates perdeu US$ 2,4 bilhões na Bolsa, e Buffett perdeu US$ 1,6 bilhão.

Nem Jeff Bezos, fundador da Amazon, foi poupado. Ele viu US$ 1,9 bilhão se esvair e sua fortuna ser reduzida para US$ 66,2 bilhões. A causa desses prejuízos foi a aproximação da reunião do Federal Reserve (Fed, o banco central americano), marcada para 20 e 21 de setembro. Para entender o caso, é preciso voltar a 2009. Quando a crise financeira que começou em 2008 ameaçou os grandes bancos, o Fed baixou os juros para perto de zero, injetou bilhões de dólares no sistema financeiro, recuperou a economia e turbinou o mercado de ações.

Entre meados de 2009 e a quinta-feira 15, o Índice Dow Jones subiu 114%. Essa farra, porém, tem hora para acabar. Os economistas concordam que os juros americanos precisam subir. A pergunta de um trilhão de dólares, porém, é quando isso vai começar. A incerteza chegou ao máximo no dia 9, quando Eric Rosengren, governador do Fed de Boston e um dos membros do Federal Open Market Committee (Fomc, o Copom americano), disse que há “justificativas razoáveis” para um aperto gradual das taxas de juros lá. Tradução: os juros devem subir.

Como resultado, o índice Dow Jones caiu quase 400 pontos, o que equivale a uma baixa de 2,1%. Foi a segunda maior queda do ano, perdendo apenas para os 3,4% do dia 24 de junho, quando da inesperada aprovação do Brexit. Por aqui, o dólar subiria 2,2% para R$ 3,26, a maior alta diária em sete meses. Já era ruim, mas, na segunda-feira 12, os bilionários teriam mais dores de cabeça. A economista Lael Brainard, outra diretora do Fomc, comentou as mudanças na economia americana após 2008. Ela ressaltou que o desemprego americano caiu de 8,2% em 2012 para 4,9% em julho deste ano, e apesar disso a inflação ficou abaixo da meta de 2%. Tradução: os juros não vão subir.

As opiniões divergentes aumentaram o nível de incerteza em um mercado já assustado. Não ajudou muito a previsão da International Energy Agency, também divulgada no dia 9, de que a demanda mundial de petróleo deverá cair em 100 mil barris por dia neste ano e em mais 200 mil barris por dia em 2017 devido à queda na demanda na Ásia e na Europa. Como os países exportadores se recusam a diminuir a produção, há pouco espaço para que o preço do barril do petróleo ultrapasse a barreira dos US$ 50, patamar onde está desde 2015 devido ao excesso de produção mundial.

A expectativa de lucros menores das petrolíferas impulsionou a volatilidade. Os analistas esperam que a maioria das companhias do índice S&P 500 divulguem lucros em queda pelo sexto trimestre consecutivo. Para piorar o humor dos investidores, o Wells Fargo, um dos maiores e mais respeitados bancos dos Estados Unidos, anunciou no dia 8 de setembro que alguns de seus funcionários haviam fraudado os clientes. Nos últimos cinco anos, eles abriram dois milhões de contas não autorizadas e enviaram cartões de crédito não solicitados aos correntistas.

O banco foi multado em US$ 185 milhões, a maior multa da história. Desde que o escândalo veio à tona, as ações despencaram 6%. Em março, um dos maiores investidores no banco havia comprado mais 506 milhões de ações. E a queda atingiu duramente os bolsos de Buffett. Além de sua empresa, a Berkshire Hathaway, ser a maior acionista do banco, as ações do Wells Fargo representam 17% do seu patrimônio, perdendo apenas para os papéis da Coca-Cola. Isso pode se repetir até a divulgação do resultado da reunião do Fed. Além da queda das ações, uma eventual alta de juros americanos significa que as empresas brasileiras que captarem recursos no exterior terão que pagar um prêmio mais alto.

Mesmo assim, os especialistas acreditam que os solavancos serão de curto prazo. “Essa volatilidade é um susto. A tendência é de normalização em breve”, avalia Alexander Sandy Severino, diretor de mercado de capitais para renda fixa do BTG Pactual (leia mais na página 56). Para Marcos Mollica, sócio da gestora Rosenberg Investimentos, houve a reprecificação do risco na turbulência. “A Bolsa brasileira estava rodando a 60 mil pontos e, durante a tempestade, baixou para uma média de 57 mil pontos, o que abre espaço para a valorização das ações.” Ou seja, não é hora de tentar brincar de Warren Buffett e especular com os preços das ações.