O bilionário americano Warren Buffett, controlador da Berkshire Hattaway, se tornou conhecido por suas tacadas certeiras no mundo dos negócios. Seu toque de Midas acabou rendendo-lhe o epíteto de o “mago de Omaha”, em referência à cidade do Estado de Nebraska, na qual está situado seu quartel-general. Em 2006, ele surpreendeu o mundo empresarial ao anunciar a doação de metade de sua fortuna, avaliada hoje em US$ 72,7 bilhões, para projetos sociais. Depois, ampliou a fatia para 90% e elegeu a Fundação Bill e Melinda Gates, do fundador da Microsoft, como maior beneficiária.

Foi o bastante para transformar Buffett, também, em um representante do capitalismo consciente. Esses pilares, cultivados anos a fio por Buffett, no entanto, começaram a ser colocados em xeque desde que se associou ao 3G Capital, fundo de investimentos comandado pelos brasileiros Jorge Paulo Lemann, Marcel Telles e Carlos Alberto Sicupira, para a compra da fabricante de ketchup e molhos de tomate Heinz, em 2013. Ao contrário de Buffett, a trinca é acusada de professar uma variedade de “capitalismo selvagem” baseado na meritocracia, é certo, mas que cobra um altíssimo preço, sob a forma de ajustes severos que resultaram em demissões em massa e na competição exacerbada entre os empregados.

A diferença de estilos começa a incomodar a legião de fãs do magnata americano, colocando Buffett diante de um verdadeiro dilema. Isso ficou evidente na edição da reunião anual de acionistas da Berkshire Hathaway, ocorrida no sábado 4. Na ocasião, de acordo com relato do jornal The Wall Street Journal, os participantes questionaram os métodos usados na Heinz, a primeira ação conjunta de Buffett e seus sócios brasileiros, que ficaram com o comando do negócio. Buffett tratou de defender os parceiros. “Eu não conheço nenhuma empresa que tenha uma política que diga que terá mais gente do que é necessário”, afirmou Buffet.

“A eficiência é exigida ao longo do tempo no capitalismo.” O principal ponto de críticas foi com relação às demissões de 1.480 funcionários, 400 deles na matriz, em Pittsburgh. No Burger King, outro símbolo americano nas mãos do 3G ( Buffett ainda não se associara ao fundo brasileiro), a tesoura também funcionou: foram 600 cortes e reduções até à metade da parcela fixa no salário. O que justamente tem encantado Buffett é a elevada capacidade do trio Lemann-Telles-Sicupira de gerar resultados vistosos. “Não me causa qualquer embaraço dizer que a Heinz está muito melhor sob o comando da 3G do que se eu fosse o gestor”, disse no final de março, em meio ao anúncio da fusão da Heinz com a fabricante de alimentos Kraft.

Nesta última os ajustes ainda não foram anunciados. Mas, caso se leve em conta o estilo de gestão do 3G, os cortes não deverão tardar. “O lucro é vital para a sustentabilidade de qualquer empresa. Mas não aquele obtido a qualquer custo”, afirma o consultor Marcus Nakagawa, professor do curso de MBA em ciências do consumo da ESPM-SP. Bem sucedida, em termos financeiros, a meteórica expansão internacional dos negócios do trio que comanda o 3G e dá as cartas na AB InBev, a maior cervejaria do mundo, tem sido acompanhada de muita polêmica. Foi assim em Leuven, na Bélgica, onde ficava a sede da Interbrew, rebatizada de InBev, em 2004, após a fusão com a Ambev.

Sob o comando de Carlos Brito, a empresa se tornou um foco de dores de cabeça para os sindicatos. Um dos períodos mais “sangrentos” ocorreu em janeiro de 2010, quando a empresa anunciou a demissão de trabalhadores em todas as filiais da Europa. O sindicato reagiu com energia, ocupando fábricas e fazendo piquetes. Mas, não foi o bastante. A empresa cortou 1.400 funcionários, num primeiro momento. Para ficar em paz com sua “consciência social” e aplacar a ira de seus críticos, Buffett esgrime os resultados obtidos pelo trio. Afinal, o lucro operacional do Burger King cresceu 44% no período 2010-2014, período no qual está sob a batuta dos associados da 3G.