Quando Bill Gates, dono da Microsoft, anunciou que pretendia se aposentar, um jornalista americano lhe perguntou sobre seus planos para o futuro. A resposta veio ligeira. Gates, o homem mais rico do mundo, disse que gostaria de passar mais tempo numa ?Tarzan?s house?, em plena selva amazônica. Essas ?casas de Tarzan?, construídas na copa das árvores, são algumas das atrações do Ariaú Towers, o único hotel brasileiro que é conhecido no mundo inteiro. Criado em plena selva amazônica há 20 anos, e localizado a pouco mais de uma hora de barco de Manaus, o Ariaú já foi descrito como uma das sete maravilhas do mundo. E uma propaganda eloqüente e gratuita, como a de Bill Gates, deveria deixar o empresário Francisco Ritta Bernardino, dono do hotel, eufórico. Em tese, ajudaria a despertar a curiosidade pela Amazônia e a provocar filas de reservas no hotel. A história, porém, tem sido diferente de alguns anos para cá. ?Já cheguei a receber três mil turistas americanos por mês e fiz expansões no hotel para receber até cinco mil?, diz ele. ?Hoje, estou recebendo pouco mais de 300 americanos?.

O empresário, que está prestes a completar 70 anos, atribui a retração no fluxo de turistas americanos a um fato diplomático. A crise, que já havia começado após os ataques terroristas de 11 de setembro de 2001, ganhou cores dramáticas apenas em 2004, quando o governo brasileiro impôs constrangimentos aos turistas norte-americanos. Além do visto consular, eles começaram a ser revistados de forma mais rigorosa nos aeroportos, tendo ainda de tirar fotos e deixar as digitais ao ingressar no Brasil. Tudo em nome da reciprocidade. ?Esse ato foi de uma burrice tremenda?, desabafa Ritta. ?Os americanos, que foram vítimas do terrorismo, têm uma razão concreta para endurecer nos aeroportos; nós, ao contrário, precisamos dos dólares que eles trazem para cá?, diz ele. De acordo com as suas contas, cada turista americano gasta em média US$ 1 mil durante a hospedagem ? seu faturamento, portanto, era de US$ 3 milhões por mês. Hoje, caiu para US$ 300 mil, mas vem sendo compensado pelo fluxo crescente de turistas brasileiros. ?Temos tido cada vez mais gente de São Paulo e de outros Estados?, garante Ellen Ritta, filha de Francisco, que administra o hotel. Entre as atrações do Ariaú, além das aves exuberantes e dos macacos que ficam à beira das piscinas, há até a possibilidade de se mergulhar nos afluentes do Rio Negro e dar de comer aos botos da Amazônia. ?Aqui tudo vem sendo reinvestido para criar novos atrativos?, diz Ellen Ritta.

Mas ainda que o Ariaú esteja conseguindo equilibrar suas receitas e despesas, é lamentável que o hotel de selva mais famoso do mundo, por onde já passaram reis, rainhas e grandes estrelas de Hollywood, esteja recebendo um volume tão reduzido de visitantes estrangeiros. Dias atrás, ao participar de um encontro em Manaus, o ministro do Turismo, Walfrido dos Mares Guia, fez um diagnóstico duro sobre a Amazônia. ?É o maior patrimônio do País, mas ainda faltam produtos turísticos de padrão internacional?, disse ele. O Ariaú, com uma gastronomia refinada e quartos luxuosos que já foram estampados até na Condé Nast Traveller, a bíblia do turismo global, é a exceção a essa regra. ?Somos o grande cartão de visitas da Amazônia?, diz Ritta Bernardino.

A história do Ariaú teve também seus lances de sorte ? e também de visão. No início da década de 80, Ritta inaugurou no centro de Manaus o Hotel Mônaco, concebido para ser o maior da capital amazonense. Foi feito para receber, essencialmente, turistas brasileiros que visitavam a Zona Franca para comprar eletrônicos e badulaques importados. Quis o destino, porém, que seus primeiros hóspedes fossem o lendário Jacques Cousteau e toda a equipe do Calypso, que fez várias expedições pelos rios da Amazônia. Jacques Cousteau se tornou um amigo de Ritta e também um conselheiro. Disse a ele que, em não mais que duas décadas, o mundo descobriria o ambientalismo e sugeriu ao empresário que construísse um hotel na selva. Ritta, que foi militar durante mais de 15 anos, especializado em técnicas de sobrevivência na floresta, não perdeu a oportunidade. Inaugurou a primeira torre do Ariaú ainda em 1986. ?Foi um dos melhores conselhos que eu já recebi na vida?, diz ele.

Volta e meia, o Ariaú conquista novos espaços na mídia internacional. Foi lá que foram rodados os primeiros programas da série Survivor, o reality-show norte-americano que inspirou o similar brasileiro ?No Limite?. O hotel também serviu como locação para as filmagens de Anaconda, com a atriz Jennifer Lopez. Mas o burburinho recente tem sido causado por produções nacionais. No Ariaú, estão sendo filmados os primeiros capítulos da série ?De Galvez a Chico Mendes?, com Giovanna Antonelli e Alexandre Borges, que será exibida pela Globo no início de 2007. É também possível que uma das próximas novelas das oito, que terá como protagonista um dono de vários hotéis no Brasil, grave cenas na região. Com isso, a tendência é que cada vez mais brasileiros comecem a descobrir as maravilhas da floresta, antes reservadas aos turistas americanos.