30/05/2012 - 21:00
Era sexta-feira à tarde do dia 4 de maio, quando fotos íntimas da atriz Carolina Dieckmann, da TV Globo, começaram a circular pela internet. Disseminada por curiosos ingênuos ou mal intencionados, as imagens logo se alastraram pela rede, acumulando mais de oito milhões de acessos em apenas dez dias. Enquanto Carolina recorria à polícia para rastrear os responsáveis pelo vazamento, uma questão voltou à baila: não seria o caso de haver uma legislação específica que tipifique crimes cometidos pela internet? Uma primeira resposta a essa indagação foi dada na quarta-feira 14, quando a Câmara dos Deputados aprovou, em votação-relâmpago de menos de cinco minutos, o Projeto de Lei nº 2.793 que tramitava desde o ano passado e caracteriza como crime uma série de más condutas no ambiente virtual.
Perigo na rede: será que seus dados pessoais estão seguros na internet?
Embora ainda não tire o Brasil da incômoda condição de apresentar um vácuo jurídico no assunto, a aprovação do projeto traz um alento por recolocar na agenda de debates um assunto que há muito tempo andava relegado a um segundo plano no Congresso Nacional. A despeito de ter sido colocada na berlinda recentemente, a discussão sobre a necessidade de se criar uma legislação que caracterize cibercrimes não previstos no Código Penal é antiga. A primeira iniciativa data de 1999 e ainda tramita pelo Congresso. Trata-se do PL 84/99, relatado pelo deputado Eduardo Azeredo, do PSDB mineiro, que foi aprovado na Comissão de Ciência e Tecnologia da Câmara, na quarta-feira 23.
Ainda que seja o mais próximo de chegar à sanção presidencial, não é o predileto do governo por ter levantado uma série de polêmicas em seus 13 anos de estrada. “É um projeto excessivamente abrangente que criminaliza práticas do dia a dia, como baixar músicas”, disse à DINHEIRO Marivaldo de Castro Pereira, secretário de assuntos legislativos do Ministério da Justiça. Polêmicas à parte, o governo trabalha para aprovar justamente o PL nº 2.793/11, aquele que foi criado em resposta ao vazamento das fotos de Carolina Dieckmann. “Crimes como o que aconteceu com a atriz têm punição prevista no nosso projeto”, afirma o deputado Paulo Teixeira, do PT paulista, que divide a autoria da proposta com outros cinco parlamentares.
Paulo Teixeira, deputado federal: ”Crimes como o que aconteceu com a atriz
têm punição prevista no nosso projeto”.
O episódio envolvendo a atriz da Rede Globo desencadeou outras iniciativas no Congresso. Na segunda-feira 21, a comissão de juristas que discute a atualização do Código Penal aprovou a inclusão de um capítulo para violações cibernéticas. Mais abrangente que o projeto de lei de Teixeira, ele tipifica como crime o mero acesso a um sistema de informática sem a devida autorização, mesmo que não configure prejuízo pessoal ou contra empresas. Já a proposta de Teixeira define como ato criminoso, além do phishing – envio de um arquivo que permite o furto de senhas e o acesso a dados pessoais –, outros atos para os quais hoje não há punição prevista na lei. A criação ou disseminação de qualquer programa malicioso, os vírus, por sua vez, têm pena prevista de três meses a um ano de prisão.
“Há vários pontos de nosso projeto que foram incorporados pela nova proposta”, diz o deputado Eduardo Azeredo. Ainda que dispersos em diferentes iniciativas, os avanços que estão ocorrendo são elogiados pelos profissionais que lidam com o tema do direito digital. Para a advogada Patrícia Peck, de São Paulo, há um claro avanço na tipificação de diferentes crimes cometidos no ciberespaço. Ela chama a atenção, porém, para uma série de dificuldades que ainda vão persistir, especialmente na hora de identificar os autores dos delitos. “Pelo projeto aprovado na Câmara, na primeira quinzena de maio, a autoria só é comprovada se pegarmos o criminoso com a mão na máquina”, afirma Patrícia.
Essa questão seria facilmente resolvida, em sua opinião, caso o Senado incorporasse no projeto um trecho da proposta de Azeredo, que determina aos provedores guardarem o registro de acesso a páginas, conhecido como log de acesso. Segundo Ronaldo Lemos, diretor do Centro de Sociedade de Tecnologia da Fundação Getulio Vargas (FGV), o ideal é que os projetos que descrevem crimes e preveem as punições tramitem depois da aprovação do Marco Civil da Internet. Considerada a “Constituição” digital, essa iniciativa define os princípios gerais para a regulamentação da rede no País, como direitos e garantias básicas de segurança de dados. “É importante que nossa primeira lei abrangente seja um marco civil, e não criminal”, afirma Lemos. Esse documento, no entanto, é o que está em estágio mais embrionário de tramitação, numa clara indicação de que o assunto ainda vai dar muito pano para a manga.