HÁ DUAS FORMAS DE avaliar o desempenho do Supermercado Mundial, uma rede de 18 lojas, fundada na década de 50 pelo português Justino de Castro. Do ponto de vista de seus controladores, a explicação está num modelo de negócios peculiar. Quase 100% das compras efetuadas são pagas à vista, o que lhes dá poder de barganha para negociar preços. Além disso, não aceitam cartões de créditos em suas lojas – fato raríssimo no varejo brasileiro nos dias de hoje. Com isso, fogem das taxas de administração das operadoras e reduzem a necessidade de capital de giro para compensar o recebimento do dinheiro a prazo. “Assim, nossos produtos custam, em média, de 5% a 8% menos, porque buscamos a melhor condição de compra. Por exemplo, trazemos nossos vinhos diretamente de Portugal”, enfatiza o diretor comercial, Paulo Costinha. Para compensar o desconforto dos clientes provocado pela recusa de cartão de crédito, a rede aceita cartões de débito, uma vez que o dinheiro cai imediatamente na conta da empresa. Também oferece alguns mimos para os clientes, como o serviço de empacotadoras na saída dos caixas. Os executivos do Mundial não revelam o faturamento. Mas dizem que a companhia vai muito bem, já que estão prevendo ainda este ano abrir mais duas lojas na cidade. Sem entrar em detalhes sobre os números de crescimento ou metas, Costinha limita-se a dizer que eles não querem aparecer.

 

No entanto, sem querer, eles estão em evidência sim – e aí estaria a segunda maneira de explicar o desempenho da rede. Pela segunda vez, a Mundial aparece como suspeita de sonegação de impostos num Estado que está sob a mira do Fisco desde que o empresário Abílio Diniz, em 2003, afirmou que “o Rio de Janeiro é tradicionalmente um Estado sonegador“. A declaração foi dada por Diniz por ocasião da compra do Sendas. Acusando nominalmente os varejistas Mundial e Guanabara, Diniz mexeu com os brios das autoridades locais e uma CPI foi instaurada, além de outras medidas de aperto fiscal, que começaram a vigorar, principalmente no mandato do atual governador, Sérgio Cabral. Arredio ao assunto, Costinha enfatiza que toda a família trabalha “honestamente” e que a rede é hoje a maior arrecadação por check-out e metro quadrado no Rio de Janeiro. Novamente sem revelar números. E enfatiza que seu modus operandi é eficiente graças a uma “operação enxuta”. Os números, porém, não confirmam. O Mundial possui 5,5 mil funcionários para 18 lojas. Já o Pão de Açúcar emprega 63 mil pessoas e tem uma rede de 575 lojas no Brasil. É verdade que o Pão de Açúcar leva vantagem em função de sua escala, mas sua produtividade é três vezes maior do que a do Mundial.

 

A Associação de Supermercados do Estado do Rio de Janeiro (Asserj) aponta a Mundial como uma das maiores do Estado, ao lado de Sendas, Guanabara, Zona Sul e Prezunic. Revela que o setor teve um faturamento estimado de R$ 12 bilhões e arrecadou, em 2007, R$ 386,5 milhões em ICMS, um montante 24% maior do que o recolhido em 2006, que girou na casa dos R$ 310,6 milhões. Apesar do crescimento significativo, a arrecadação poderia ser maior, segundo o subsecretário da Fazenda do Rio, Ricardo Pinheiro.

O relatório final da CPI da Arrecadação, concluído em 2007, que investigou o segmento nos anos de 2003 a 2006, apontou sonegação de R$ 1,4 bilhão. Pinheiro não revela quais supermercados, mas diz que houve autuações entre 2007 e 2008 em algumas das grandes redes do Estado. Um ofício encaminhado ao presidente da Comissão de Tributação, deputado Luiz Paulo da Rocha, aponta que as denúncias envolvendo seis redes supermercadistas continuam a chegar à Assembléia. A Mundial está entre elas. “Vamos investigar”, limita- se a dizer Rocha. Enquanto as denúncias não batem oficialmente à sua porta, o grupo Mundial toca o dia-a-dia. “Somos uma empresa regional, pequena, tentando concorrer com os grandes, mas aos poucos vamos conseguindo subir cada degrau, sempre com honestidade”, diz Costinha.