Nada novo para quem, como eu, assistiu, nas últimas duas décadas, à morte nunca ocorrida da responsabilidade social corporativa e da sustentabilidade empresarial. Na verdade, o fim anunciado desses conceitos antecessores do ESG nada mais foi do que uma torcida de líderes e empresas contrariados em seus interesses. Havia, nos dois casos, um desejo de manter os impactos sociais e ambientais fora da equação econômica, sob o argumento de que adicionavam custo, prejudicavam resultados e não geravam valor para os negócios na perspectiva dos acionistas.

Sob novas condições de temperatura (vivemos tempos de emergência climática) e pressão (observa-se maior interesse das sociedades), o movimento anti-ESG, instalado nos EUA, adota a mesma lógica de defesa de interesses dos seus antepassados: é uma contraofensiva das empresas ligadas a estados republicanos produtores de petróleo, incomodadas com a força crescente das energias renováveis na transição energética. O ESG virou um “fla-flu” ideológico com os democratas. Passou a ser causa de “esquerda”. Sua pauta de clima, diversidade e justiça social tornou-se bandeira do chamado capitalismo “woke” — termo depreciativo associado a empresas que exageram no ativismo socioambiental, mas de forma superficial.

Os republicanos não querem ser vistos como vilões do clima. Também não estão dispostos a abrir mão das oportunidades de uma economia velha, movida a combustível fóssil, principalmente com o valor do barril de petróleo a 80 dólares. Como disse Paul Polman, ex-CEO da Unilever, em recente passagem pelo Brasil, a atual crise planetária é “de ganância”. A pressão política funcionou bem. Porta-voz global do ESG, Larry Fink, CEO da BlackRock, retirou o termo de suas famosas cartas abertas. E o substituiu por “investimento de transição”. Investidores, antes entusiasmados, botaram o pé no freio para conter “excessos”. No Brasil, empresas pouco convictas sobre ESG encontraram pretexto de ocasião para adiar planos. Segundo o Financial Times, o volume de recursos em fundos “verdes”, que chegou a US$ 151 bilhões em 2021, baixou para US$ 37,8 bilhões no ano passado.

O ESG, então, acabou? Só que não. Relatório recente do Morgan Stanley aponta um quadro diferente do pintado nos EUA: 77% dos investidores globais mostram interesse em investimentos sustentáveis, a despeito do recuo de Fink e da grita dos republicanos. A curva só cresce: 57% admitem maior interesse pelo tema nos últimos dois anos e 54% planejam ampliar o aporte de recursos, estimulados pela convicção de que práticas ESG geram mais retornos e pelos alertas da ciência do clima sobre as consequências sinistras do aumento não controlado das emissões de gases de efeito estufa.

Na contramão do discurso sobre a ruína do ESG, consumidores da geração Z seguem mais atentos ao tema em todo o mundo, cada vez mais empresas comandadas por millennials aprofundam suas estratégias, o mercado sistematiza padrões e métricas para estimular investidores e os governos, pressionados pelo quadro de emergência climática, estimulam regulações favoráveis de todo tipo.

Nas palavras de John Elkington, pai do conceito de sustentabilidade empresarial, “a agenda não está mais na borda, chegou ao mainstream”. E ela só “chegou” lá, vale frisar, porque mais do que uma questão pontual de empresa é um desafio civilizatório. Tem a ver com a expectativa crescente das sociedades por empresas melhores para o mundo, mais éticas, diversas e justas, respeitosas em relação ao planeta. E esse movimento apenas começou a nascer.

*Ricardo Voltolini é CEO da Ideia Sustentável, fundador da Plataforma Liderança com Valores, mentor e conselheiro de sustentabilidade.