18/07/2014 - 20:00
A pequena cidade de Andermatt, nos Alpes Suíços, é o lugar perfeito para quem procura tranquilidade. A charmosa arquitetura alpina de suas casas parece decorar o vale onde a cidade está encravada, emprestando-lhe um ar de conto de fadas. Seus prédios antigos, de quase 200 anos, bem preservados, e a ausência de automóveis ou até do movimento de pedestres nas ruas fazem o visitante sentir-se fora de seu tempo, como se o frio das montanhas tivesse congelado aquele momento por séculos. Esse clima bucólico está prestes a mudar no lugarejo de 1,4 mil habitantes.
Um resort de altíssimo padrão está sendo construído nas proximidades do centro de Andermatt, em uma área de 1,4 milhão de m². O investimento no projeto ultrapassa US$ 2 bilhões, o equivalente a R$ 4,4 bilhões. Quem encabeça a empreitada é o bilionário egípcio Samih Sawiris, que adquiriu as terras em 2009. Seus planos incluem a construção de 42 edifícios, que vão abrigar chalés de madeira e apartamentos de temporada, casas de alto padrão, um hotel familiar, outro voltado para esquiadores e um hotel cinco estrelas, o Chedi Andermatt, que já está operando desde dezembro do ano passado.
As casas e os chalés estão à venda. Os preços variam de US$ 540 mil, por um estúdio de 35 m², a US$ 12 milhões, preço de uma cobertura duplex com 620 m². “É um negócio de nicho, mas muito compensador, tanto para nós, financeiramente, quanto para a cidade”, afirmou Sawiris, em um vídeo que explica o projeto a interessados. Hospedar-se no Chedi Andermatt é um bom indicador do luxo que aguarda os turistas. Logo na entrada, o visitante mais atento percebe uma adega de vidro exclusiva para o cultuado vinho francês Château d’Yquem.
São dezenas de garrafas, de diversas safras, algumas delas chegando a custar US$ 2 mil, dependendo do ano. Junto com as chaves, o hóspede recebe um iPad. Com ele é possível controlar praticamente tudo no quarto – do som à temperatura, incluindo acender e desligar a lareira. Nas áreas comuns, encontram-se dois restaurantes de padrão internacional, um salão para degustação de vinhos, integrado com a adega principal do hotel, e uma charutaria, além de uma espécie de closet de queijos, com iguarias de várias partes da Suíça.
Os felizes proprietários dos imóveis e os hóspedes dos hotéis terão à disposição, como entretenimento, duas estações de esqui com níveis diferentes de dificuldades. Também será construído um campo de golfe com 18 buracos, o mais alto do mundo, segundo seus idealizadores. A ideia é manter o fluxo de turistas o ano todo, mesmo fora da temporada de neve. Os responsáveis pelo projeto garantem que, apesar do movimento, Andermatt não perderá o clima de tranquilidade. “Estamos construindo uma cidade livre de carros”, afirma Robert Fellermeier, diretor-geral da Andermatt Swiss Alps AG, empresa responsável pela construção.
“Os turistas chegarão pelo subsolo do complexo, assim como as entregas serão feitas dessa maneira.” Filho do magnata da construção Osni Sawiris, dono da quarta fortuna do Egito, avaliada em US$ 2 bilhões, Samih Sawiris já tem experiência em transformar regiões pouco habitadas em complexos turísticos para endinheirados. Há duas décadas, ele construiu um pequeno resort às margens do Mar Vermelho. O local, onde só havia deserto, hoje abriga um dos destinos mais luxuosos da terra dos faraós, o El Gouna Resort. O movimento turístico fez surgir, ainda, uma cidade de 20 mil habitantes.
Além de alterar a paisagem de Andermatt, o projeto de Sawiris traz a perspectiva de dias mais prósperos para seus moradores. Antiga base do exército suíço, Andermatt estava a ponto de se tornar uma cidade fantasma. Desde que os militares decidiram que o lugar não era mais estratégico para a defesa nacional, no início dos anos 2000, a cidade não conseguia impedir o êxodo de seus moradores, em busca de oportunidades. Para viabilizar o projeto de Sawiris, os cidadãos de Andermatt tiveram de aprovar uma lei que facilita a venda de propriedades para estrangeiros.
Na Suíça, os cidadãos de fora são impedidos de adquirir terras e há várias restrições para a compra de imóveis. Por meio de um plebiscito, foi aprovada uma espécie de exceção à lei que dá à cidade o poder de negociar livremente com forasteiros, por 30 anos. A Andermatt Swiss Alps não revela o quanto já foi vendido. Mas afirma que os maiores interessados são os chineses e os russos. Não há informações sobre brasileiros. “A cidade confiou na minha seriedade”, afirma Sawiris. “Isso aumenta a responsabilidade.” Todo luxo e sofisticação do resort alpino, no entanto, não eliminam o altíssimo risco do projeto.
Ainda que bela, Andermatt sofre com a concorrência de tradicionais destinos turísticos dos Alpes. Da própria estação da cidade é possível pegar um trem que, em três horas, leva os passageiros à Zermatt, uma das mais conhecidas estações de esqui da Suíça, aos pés do famoso monte Matterhorn – aquele que ilustra as embalagens do chocolate Toblerone. Cerca de 160 km a Oeste se encontra outro destino cultuado dos Alpes, St. Moritz. Os cidadãos de Andermatt parecem não se abalar. Novos hotéis e restaurantes já estão funcionando, à espera dos visitantes.