Reina no momento um clima de indisposição, quase de animosidade, do mercado em direção ao ministro Paulo Guedes e a reação segue como reflexo forte das medidas tributárias em análise. Foi como se tivesse sido quebrada a confiança. O elo de apoio se rompeu e o desconforto, junto com a descrença, contaminaram as relações, inclusive, com o governo como um todo. O que pensa o setor produtivo? Mentiram para nós. Garantiram que não haveria aumento de carga tributária. Juraram de pés juntos a simplificação do sistema. Ao final e ao cabo o que foi proposto contraria essas bandeiras. O governo – argumentam desde investidores e banqueiros, passando por empresários e comerciantes – vai garfar muito mais daqui por diante e, em alguns casos, até inviabilizar os negócios com a tungada generosa nos dividendos, a taxação dos fundos imobiliários e o impedimento da compensação de impostos, com o fim da TEC. O que chocou ainda mais o mercado é que a proposta não tem nada de liberal. É intervencionista fundamentalmente sobre o lucro, quebrando um paradigma que pauta os princípios fiscais mundo afora. Reclama a turma do PIB brasileiro que não é com “gorjeta”, via diminuição de 2,5% no Imposto de Renda, que Guedes irá convencer das boas intenções do pacote federal. Para os representantes da produção, as escolhas em voga sinalizam mero populismo barato e eleitoreiro com o dinheiro alheio. Os mais irritados com as mudanças são os fundos de investimentos que veem no horizonte a ameaça de uma debandada em massa do capital. Eles acham que não há como atenuar o estrago, mesmo com alíquotas menores, e querem a revisão completa da ideia do salgado imposto sobre dividendos. Apontam que há uma notória bitributação sobre as carteiras, o que pode deixar a situação inadministrável no curto e médio prazos. O desembarque da Faria Lima ao governo vem se dando de maneira acelerada. Os mais críticos dizem que o ministério da Economia mirou no bolso e esqueceu-se de contemplar a retomada do crescimento. Além dos investidores, a indústria demonstra estar furiosa com Guedes por ele tentar reduzir a alíquota de importação sem nenhuma compensação tarifária. Segundo muitos dali, a redução unilateral dos impostos sobre produtos de fora dará um choque negativo e pesado na competitividade do setor, seguido por falências e demissões em massa. Para baixar a fervura no caldeirão de pressão, o ministro já sinalizou com a possibilidade de ajuste na dosagem das medidas. “Se houver erros, vamos consertar”, prometeu. O grande desafio que encara a sua pasta é a do eterno cobertor curto para bancar altos gastos com uma arrecadação que não atende plenamente. Na ponta oposta do processo, Guedes está tentando impor uma, digamos, escolha salomônica para o presidente Bolsonaro. Ele almeja que o presidente faça uma opção entre um programa de Bolsa Família mais robusto, as obras eleitoreiras e os reajustes do funcionalismo em 2022. Todas essas contas superam, em muito, o inicialmente previsto e não há como cobrir todas. Mesmo com o mais variado exercício de ampliação de carga. É simples assim: a gestão do capitão precisa – e não é de hoje – fazer o dever de casa, cortando na própria carne. Um presidente que pensa em fazer a farra do desperdício com o dinheiro alheio não entende mesmo como deve ser o fundamento da disciplina fiscal.

Carlos José Marques, diretor editorial