27/05/2009 - 7:00
DINHEIRO – Quando o sr. foi convidado para presidir a empresa?
PAULO SERGIO KAKINOFF – No início deste ano. Na função que eu exercia anteriormente, de diretor-executivo do grupo Volkswagen para a América do Sul, tinha contato com todas as marcas da companhia e discutíamos as estratégias que seriam adotadas nos próximos dez anos. Particularmente, o meu contato com os executivos da Audi de Ingolstadt se intensificou. Aí, surgiu esse convite para que eu me juntasse ao time da Audi Brasil com o objetivo de implementar as estratégias que estávamos desenvolvendo para os próximos dez anos.
DINHEIRO – Quais são as estratégias?
KAKINOFF – A Audi tem crescido e batido recordes de volume de vendas nos últimos 13 anos. Tudo isso foi baseado em uma estratégia muito consistente, combinando portfólio de produtos extremamente competitivos, solidez financeira e o posicionamento da marca. Esses diferenciais demonstraram todo o potencial que a marca pode alcançar. Resultado disso: no primeiro trimestre do ano, pela primeira vez na história, alcançamos a liderança de mercado na Europa, batendo BMW e Mercedes. A missão é fazer com que todo esse potencial seja exercido em sua plenitude no mercado brasileiro.
DINHEIRO – Mas como fazer isso?
KAKINOFF – Boa parte da nossa atenção e da nossa estratégia aqui está em fazer com que o desconhecimento do produto seja eliminado. Faremos isso por meio de uma estrutura bastante agressiva e consistente de possibilitar a experimentação ao consumidor.
DINHEIRO – O que será feito?
KAKINOFF – Test drive é a palavra de ordem. Vamos criar eventos que permitam uma interação com o carro. A marca pode ter uma alta simpatia, um nível de desejo muito grande, mas o consumidor muitas vezes não sabe qual é o atual estágio de desenvolvimento dos nossos produtos. Nos últimos quatro anos, a Audi tem lançado dois modelos novos e versões dos carros já existentes a cada semestre.
DINHEIRO – Quanto a Audi investe em novos produtos?
KAKINOFF – No ano passado, a empresa lucrou 2 bilhões de euros e 100% desse lucro foi reinvestido em produtos. Como isso é replicado nas diversas operações do mundo, nos próximos meses, a Audi lança no Brasil o Q5, a nova geração do A6 e trará os novos S3 e o TTS.
DINHEIRO – O sr. disse que o marketing é crucial para a marca. Quanto será investido no Brasil?
KAKINOFF – Sem citar o valor, vamos dobrar o investimento em marketing e vamos triplicar os investimentos em pesquisa. É um desafio identificar quais inovações são realmente efetivas e atrativas para o consumidor. Então, o melhor canal para aumentar o nível de assertividade é ter um fundamento sólido em pesquisas, saber o que o consumidor deseja e o que ele compreende como uma inovação tecnológica realmente útil.
DINHEIRO – Como o sr. avalia o trabalho feito pela família Senna?
KAKINOFF – Um trabalho muito bom. A história da Audi no Brasil é referência para a marca no mundo. A empresa é relativamente jovem no mercado nacional, tem 16 anos. Nesse período, com a produção de um modelo nacional, a Audi atingiu a liderança de mercado, superando competidores de extrema qualidade e competência que já estavam aqui. A marca, porém, passou por momentos diferentes em sua história no Brasil.
DINHEIRO – Que momentos?
KAKINOFF – Primeiro como importador, depois como fabricante – ao produzir o A3 com volume anual de 11 mil unidades vendidas -, o que criou uma base de 70 mil clientes. Esse trabalho, com o término da produção local do A3, entrou em uma segunda fase, que coincidiu com a transição das operações da família Senna para a Audi da Alemanha. É uma fase com menos foco no A3, que representava 90% das vendas até 2006. Em 2008, sem resquício do A3, vendemos 1,4 mil carros.
DINHEIRO – Isso não foi um baque para a empresa?
KAKINOFF – Não, porque a empresa foi redimensionada para isso. Para se ter uma ideia de como a nossa estratégia hoje é diferente, neste ano vendemos mais carros importados do que em toda a história da marca no Brasil, quando medimos os primeiros quatro meses do ano. Foram mais de 520 carros. Isso representou 24% de crescimento em relação ao mesmo período de 2008, que foi o primeiro ano sem ter o A3 nacional no portfólio. Hoje, ampliamos o foco nos outros segmentos. O nosso carro topo de linha é o superesportivo R8, que é vendido por uma média de R$ 600 mil. Desde agosto de 2008, quando o lançamos no Brasil, já vendemos 25 unidades. Passados oito meses do lançamento, o cliente ainda tem de esperar 60 dias para ter o carro na cor que ele deseja.
DINHEIRO – No mercado, comenta-se que essa mudança de perfil foi traumática para a rede de concessionárias.
KAKINOFF – Do ponto de vista estrutural, não foi problemático. Foi difícil no sentido comportamental porque existia uma inércia natural diante do desempenho de vendas do A3. Ou seja, o foco do vendedor e da rede era o carro de maior volume de vendas. Hoje, um vendedor tem que ter um conhecimento comparável ao de um engenheiro automobilístico para ter condições de apresentar o funcionamento e o benefício daquele produto. Quando vai mostrar o A4, que é o segundo carro da nossa linha, o vendedor tem que explicar pelo menos de 25 a 30 sistemas complexos para que o consumidor realmente entenda o valor que ele está pagando por aquele produto. Nesse caso, obviamente, foi um baque.
DINHEIRO – Qual foi o tamanho do redimensionamento da rede?
KAKINOFF – Chegamos a ter 41 concessionárias no Brasil e atualmente contamos com 18. Hoje, temos que aumentar a capilaridade de concessionários para reduzir as distâncias entre os nossos produtos e o cliente.
DINHEIRO – Apesar de o sr. dizer que a rede foi preparada, a Audi Brasil mudou de comando três vezes em quatro anos. O que, de fato, aconteceu com a empresa?
KAKINOFF – Não gostaria de mencionar o que aconteceu com a gestão dos meus antecessores. Mas posso dizer com bastante tranquilidade que existe uma ótima relação entre a Audi Brasil e a matriz na Alemanha. Hoje, a Audi Brasil e a Audi Alemanha têm uma clara visão do que deve ser feito e para qual direção nós vamos. Nesse primeiro mês como presidente, estou tendo da matriz um nível de suporte e atenção maior do que eu esperava. Apesar de ser muito importante, o Brasil é um dos mercados mais complexos do mundo em diversos aspectos: na estrutura tributária, no perfil do consumidor, nas diferenças regionais. Para a Audi Brasil e para a matriz foi um processo de aprendizado mútuo.
DINHEIRO – O sr. trabalhou na Volkswagen do Brasil e depois na Alemanha. Isso ajudou na sua escolha para o cargo?
KAKINOFF – Isso ajudou muito, acredito até que tenha sido um dos aspectos que mais tenham influenciado na minha vinda para a Audi Brasil. Quanto maior a qualidade de interlocução, mais eficiente é o resultado do investimento realizado. Hoje, a Audi tem mais de 200 versões diferentes de veículos no mundo. Então, precisamos saber quais carros atingirão o potencial máximo de vendas no mercado nacional.
DINHEIRO – Em quanto tempo a Audi volta a ser líder?
KAKINOFF – A nossa meta é ser líder em 2015. Não existe nada mais arriscado na indústria automobilística do que estipular uma data. Pretendemos crescer todos os anos acima do mercado. Se isso realmente acontecer, por força inexorável da matemática, chegaremos lá. É nisso que acredito.
DINHEIRO – Mudando de assunto, o sr. não acha que os resultados da indústria automobilística estão inflados pela redução do IPI?
KAKINOFF – Muito. O IPI foi uma ação bastante louvável. Quando olhamos os números deste ano e vimos que a indústria brasileira ficou estável, isso se deve à assertividade e à rapidez da ação governamental.
DINHEIRO – Qual seria a real situação do mercado sem a redução do IPI?
KAKINOFF – É difícil dimensionar. Mas posso dizer que, nos primeiros momentos da crise, a indústria sofreu uma queda de 20%. Não sei como será após o término do IPI, mas há um consenso de que o fim da redução do IPI terá impacto nas vendas.
DINHEIRO – A indústria americana sempre foi hegemônica e hoje está em decadência. O que vai acontecer nesse mercado?
KAKINOFF – Esse é um momento histórico. Por décadas, a indústria americana ditou tendências, moda, tecnologia e as regras. Hoje, os americanos lutam para absorver, pelo menos parcialmente, as tecnologias desenvolvidas pelos europeus e pelos asiáticos.
DINHEIRO – O que levou os americanos para essa situação?
KAKINOFF – Acho que foi uma sensação exacerbada de autossuficiência. Eles imaginavam que o mercado americano, por ser maior, se bastava. Por isso, não olhavam para fora e, ao mesmo tempo, não percebiam o que acontecia com o próprio americano.
DINHEIRO – Nessa nova ordem mundial, quais indústrias saem fortalecidas dessa crise?
KAKINOFF – Os jogadores importantes desse mercado, especialmente nos quesitos tendência e tecnologia, são os alemães, franceses, italianos, japoneses, coreanos e chineses.