Quando o americano Robert Parker, o crítico de enologia mais influente do planeta abre a boca, o mundo do vinho treme. Em um artigo recente, em que indicava as tendências do futuro no território de Baco, Parker cravou: ?Em 2015, poucas garrafas usarão rolhas de cortiça?. Ele não usou algum dom mediúnico para acionar a bola de cristal, apenas identificou um movimento claro do setor. São três os motivos que o levam a crer no fim do mais clássico dos símbolos da boa bebida. Um: a cortiça é a casca do sobreiro, uma árvore típica de Portugal e Espanha, e leva exagerados nove anos para se formar. Isso está tornando-a escassa. Dois: ela é uma das matérias-primas mais caras na produção do vinho ? chega a custar US$ 1 a unidade. Três: pelo menos 15% de todas as garrafas do líquido fabricadas no mundo sofrem do temido bouchoné, o termo em francês utilizado para definir um certo gosto de mofo causado pelo TCA, uma substância que se desenvolve apenas na cortiça. Diante dos fatos cabe uma pergunta: será mesmo o fim da rolha?

Produtores, importadores e consumidores travam uma discussão ferrenha em torno da questão. Atualmente, existem outras opções para lacrar a garrafa. Há, por exemplo, a rolha sintética e a tampa de rosca metálica. Os dois métodos são usados, com alguma freqüência, pelos produtores da Nova Zelândia, Austrália, África do Sul e da Argentina, onde proliferam vinhos novos e de consumo mais rápido. A sintética se assemelha à rolha natural mas é confeccionada com plástico. A eficiência deste material para que não deixe o oxigênio entrar na garrafa ainda é muito contestada. ?Este tipo de rolha vai sumir?, diz Arthur Azevedo, vice-presidente da Associação Brasileira de Sommeliers de São Paulo. A tampa de rosca metálica, conhecida como ?stelvin?, é mais eficaz. ?Mas atualmente ela é mais usada em vinhos jovens que não precisam envelhecer?, diz Otavio Lilla, diretor da importadora Mistral.

A polêmica pode parecer mero detalhe, até capricho. Não é. A rolha de cortiça faz parte da história do vinho. Usada desde o século 17, este tipo de vedação envolve um ritual de elegância e conhecimento. O bom apreciador abre a garrafa e, pelo aroma e cor da rolha, identifica as características da bebida. Além disso, alguns especialistas apontam que ela ainda é a ideal para envelhecer vinhos de guarda. Por isso mesmo, as tradicionais vinícolas demonstram que nunca deixarão a clássica cortiça. ?Uma tampa de rosca quebra o glamour?, diz Eduardo Paes de Andrade, gerente de desenvolvimento da importadora Expand. ?É o mesmo que abrir uma garrafa de cerveja.?