O MAIOR EXPORTADOR DE CALÇAdos de couro femininos da China não tem olhos puxados. Nem fala chinês. Ricardo Correa da Silva, de 38 anos, é gaúcho de São Leopoldo e só se comunica em inglês com seus funcionários chineses. Dessa forma, vendeu, em 2007, 35,5 milhões de pares de calçados por meio de sua empresa, a Paramont Asia. Localizada na cidade de Dongguan, na província de Guangdong, sul da China, a empresa não é fabricante e tampouco vende para o consumidor final. Seu modelo de negócios é justamente unir essas duas pontas. Silva recebe os projetos de calçados e faz o pedido de produção para empresas chinesas. Ao mesmo tempo, contrata técnicos especializados ? na maioria brasileiros ? para inspecionar a qualidade. De seus 800 funcionários, 100 são do Brasil, especificamente da região do Vale dos Sinos, no Rio Grande do Sul, um dos principais pólos calçadistas do País. Segundo a Associação Brasileira da Indústria de Calçados (Abicalçados), há dez anos esses profissionais migram para trabalhar em curtumes e indústrias calçadistas na China, já que o operário de lá não está acostumado a manipular o couro. Hoje, são cerca de quatro mil brasileiros vivendo no sul do território chinês. O fenômeno pode estar com os dias contados, uma vez que a nova legislação chinesa garante melhores condições de trabalho para os operários, o que onera a folha de pagamento. Além disso, o governo chinês vem incentivando a manufatura de produtos de mais valor agregado feito pelos próprios chineses, sem interferência estrangeira.

A Paramont já sente na pele essa mudança. Para continuar competitiva, o pai de Ricardo, Ernesto Correa da Silva, que foi o precursor dessa migração na década de 90, desvinculouse da Paramont Asia e estabeleceu parcerias com mais cinco fábricas, em outras províncias no sul da China, no Vietnã e na Índia, onde a mão-de-obra ainda é mais barata. O empresário brasileiro não está muito otimista, no entanto, quanto ao aumento de seu faturamento para este ano. A crise nos EUA, um dos maiores compradores de seus serviços, deve afetar os resultados neste ano. Entre os principais mercados consumidores ainda estão a Austrália, o Canadá, o Dubai e a própria Ásia. O Brasil está longe de vigorar como foco relevante. Em 2007, a empresa exportou apenas 600 mil pares da linha mais esportiva. ?O imposto no Brasil é muito alto?, diz Ricardo. Até pouco tempo, a China conseguia exportar calçados em média por US$ 1, de acordo com a Abicalçados. O recente cancelamento, pelo governo chinês, de políticas preferenciais para exportadores prejudicou os industriais chineses. Mesmo assim, ainda conforme a Abicalçados, os calçados provenientes da China entram no País custando em média US$ 5. O Brasil consegue exportar por cerca de US$ 11.

Foi por isso que o escritório brasileiro da família Correa da Silva, instalado no Brasil desde 1965, quando o pai Ernesto iniciou relações com outros países, foi fechado definitivamente em 2007. Ricardo, o filho, está na China desde 1995, quando a Paramont Asia concentrou todas as operações por lá. Do Brasil, ele levou a esposa, também do Sul. E não quer saber de voltar tão cedo. Até os filhos, de três e sete anos, são chineses. Falam inglês, português e chinês. ?Estamos no centro da oportunidade. Então, para que retornar agora??