capa_01.jpg

Marco Tronchetti provera, presidente da Telecom Italia: “Se alguém nos apresentar uma proposta, nós a analisaremos”

Há um curinga prestes a ser descartado. Foi exatamente essa a sensação no mercado de telecomunicações com a notícia de que a Telecom Italia decidiu separar as empresas de telefonia fixa e celular dos negócios do grupo, para se concentrar em banda larga e mídia. Com a proposta, o próximo e mais lógico passo da operadora seria vender a área na qual não tem interesse. ?É minha obrigação analisar qualquer possível oferta (pela empresa)?, afirmou Marco Tronchetti Provera, presidente da Telecom Italia. É ele quem segura o curinga e o mundo espera para ver se ele colocará a carta na mesa. No Brasil, os braços da empresa são a BrasilTelecom (BrT), em telefonia fixa, e a TIM, na móvel. E é especificamente por essa carta mágica que concorrentes no País, no Exterior e investidores entraram em polvorosa. A TIM hoje é a segunda maior empresa da área no País, com quase 25% de participação e 23 milhões de clientes, atrás apenas da Vivo, que beira os 31%. Com um detalhe: os clientes da TIM são os mais rentáveis do mercado. Eles passam, em média, 81 minutos por mês ao telefone, contra os 66 minutos dos da Vivo e da Claro. A consultoria Teleco estima que a receita líquida da TIM deve se igualar à da Vivo até o fim do ano. E mais. Entre outros bons indicadores de receita e margem operacional, com baixa necessidade de investimento, a TIM tende a se tornar a maior do mercado em menos de um ano, se mantiver o ritmo de crescimento.

Cabe em qualquer baralho? As operadoras também acham. Na última semana, todas as gigantes mundiais da área apareceram como prováveis compradoras da TIM. Empresas já presentes no Brasil, como a Telefónica e a Telmex encabeçaram a disputa, porém são só alguns dos apostadores à mesa. Também teriam feito movimentos pela TIM a France Telecom, a Deutsche Telekom e a China Telecom. O grupo Sonae, que fez uma oferta pela Portugal Telecom recentemente, teria todo interesse na negociação. A ele, valeria tanto comprar a TIM como a participação que a Telefônica detém na Vivo, em parceria com a própria Portugal Telecom. Rupert Murdoch, dono da News Corp, não só quer o negócio como teria se encontrado com Provera para tratar do assunto. Os grupos Time Warner e General Eletric também entraram na lista, além de investidores profissionais como os fundos Carlyle Group, Apax e Permira. Analistas acreditam que serão formados consórcios para disputar a TIM, que poderá render entre ? 7 e 9 bilhões à Telecom Italia.

De todo modo, o mercado brasileiro passará por uma grande alteração, qualquer que seja o vencedor, caso a TIM seja mesmo posta à venda. Telefónica e Telmex no páreo implicariam em maior concentração de mercado, já que elas controlam a Vivo e a Claro, respectivamente. A Telefónica passaria de 31% de mercado, que divide com a Portugal Telecom, para 55% de participação. Já a Telmex pularia de 23% para 47%. O fato de haver impedimentos legais tanto nas áreas de atuação quanto por redução na concorrência não é encarado como um grande problema. ?A Anatel (Agência Nacional de Telecomunicações) costuma ser flexível?, afirma Julio Puschel, analista sênior de telecomunicações da consultoria Yankee Group. O preço esperado pela TIM, de ? 9 bilhões (R$ 25,8 bilhões), seria, em reais, maior do que o governo arrecadou na privatização do Sistema Telebrás, em 1998. As estatais foram vendidas por R$ 22 bilhões. ?O grande problema do preço pedido é que o (sistema de telefonia banda larga) Wi-Max deixará o mercado mais competitivo?, afirma Artur Barrionuevo Filho, professor da FGV-SP. ?Vai permitir a presença de novos competidores, que entram com tecnologia mais atraente.?

Mesmo assim, a TIM Brasil, cuja receita no primeiro semestre foi de R$ 4,6 bilhões, é a cereja no bolo de Provera. E ele não está vendendo-a ? ou ao bolo todo ? de bom grado. Adquirir a Telecom Italia foi uma aposta de alto cacife, que ele parece ter perdido. Provera adquiriu a operadora por meio de uma oferta hostil, em 2001. Tirou-a das mãos de Roberto Colaninno, polêmico homem de negócios próximo da esquerda italiana e de políticos como o primeiro-ministro Romano Prodi. A aquisição ? e a chegada de Provera ? foi saudada pelos mercados como um sopro de renovação no capitalista italiano, dominado por Agnellis, Benedettis e outras dinastias. Ex-presidente da Pirelli, Provera montou sua estratégia apostando que conseguiria valorizar as ações da Telecom Italia para saldar a dívida gigantesca assumida pela Pirelli. O Brasil entrava como peça-chave no esquema, já que o mercado italiano está estagnado há anos. Só que o valor dos papéis da Telecom Italia não evoluiu. Enquanto Silvio Berlusconi esteve no comando da política italiana, Provera se manteve à frente da empresa. Com a volta da esquerda ao poder, sua situação se fragilizou. Com 20% das ações da operadora, Provera seria, agora ele, alvo fácil de uma tomada hostil. Especulou-se que fundos de investimentos, como o Carlyle e o KKR, bem como a Deutsche Telekom, estivessem movimentando-se para oferecer um prêmio aos minoritários e levar a empresa. Provera ficaria sem o controle e com a dívida. Não teve alternativa a não ser dividir e vender parte da empresa por um valor que pode alcançar ? 35 bilhões. Conseguiria assim saldar o que deve e controlar uma unidade que poderá vir a ser rentável.

No Brasil, o plano era, desde a privatização, construir uma base gigantesca de clientes. Como na Itália, a empresa pretendia ter aqui uma grande operação convergente unindo as fixas Telemar e a BrT com a móvel TIM. Depois de inúmeros atropelos (veja quadro), o plano foi por água abaixo com os grampos do BNDES, escândalo que revelou que o governo brasileiro tentava ajudar a operadora italiana a comprar a Telemar. No ano passado, depois de uma intensa guerra empresarial, a Telecom Italia chegou a um acordo com os sócios do banco Opportunity. Previa-se então que o grupo assumiria o comando da BrT e também da Telemar. Teriam mais de US$ 2 bilhões para investir no País. Só que o projeto também fracassou porque os fundos de pensão decidiram assumir o comando da BrT e fecharam a porta para os italianos.

Sem grandes alternativas, o plano de fuga de Provera ainda não está garantido. A perspectiva da venda da empresa, cuja receita foi de ? 15,3 bilhões no primeiro semestre, caiu como uma bomba na Itália. O primeiro-ministro Prodi fez questão de divulgar nota dizendo que Provera garantiu o controle italiano, já que todas as concorrentes estão nas mãos de estrangeiros. Já os trabalhadores da operadora planejavam uma greve como protesto. E ninguém descartava a possibilidade de o governo usar a golden share, ação que dá direitos especiais, para vetar a venda a estrangeiros. Com isso, o cargo e o plano de Provera tinham boas chances de serem riscados do mapa. As cartas estão na mesa.

O QUE É A TELECOM ITALIA

 capa_11.jpgPresente na Itália, França, Holanda e Brasil, tem quase 46 milhões de clientes no País, com TIM, BrT e BrT GSM

 

 

? 15,3 bilhões foi a receita da Telecom Italia no primeiro semestre de 2006

R$ 4,6 bilhões foi o faturamento da TIM no primeiro semestre de 2006

 
UMA HISTÓRIA REPLETA DE CONFUSÕES
Em menos de dez anos no Brasil, a Telecom Italia esteve envolvida em escândalos e protagonizou rumorosas disputas societárias

capa_03.jpg
Na privatização da Telebrás, a Telecom Italia (TI) adquire a Brasil Telecom, com fundos de pensão, Citibank e Opportunity.

 

Julho/novembro de 1998

O ministro Luiz Carlos Mendonça de Barros articulava a venda de 25% da Telemar para a TI. É atingido pelos grampos do BNDES.

capa_05.jpg
Pressionada por Roberto Colaninno, da TI, a Brasil Telecom compra o controle da Companhia Rio-Grandense de Telecomunicações por US$ 850 milhões.

 

Abril/junho de 2000

A Telecom Italia adquire 30% do portal de internet Globo.com também por US$ 850 milhões, num negócio fechado com Roberto Irineu Marinho.

capa_07.jpg
A Telecom Italia une-se aos fundos de pensão e tenta tomar a gestão da empresa das mãos do grupo Opportunity, controlado pelo banqueiro baiano Daniel Dantas.

 

Janeiro/agosto de 2001

A Pirelli, de Marco Tronchetti Provera, adquire o comando da Telecom Italia e Roberto Colaninno é afastado do comando.

Setembro de 2002
A Telecom Italia fecha um acordo com o grupo Opportunity, intermediado pelo investidor Naji Nahas, que permite o lançamento nacional das operações da TIM.

Setembro de 2004
A Brasil Telecom lança sua própria empresa de telefonia celular, a BrT GSM, o que cria um novo foco de atrito com a Telecom Italia. A jogada impede os italianos de voltar ao bloco de controle da operadora brasileira.

capa_09.jpg
A Telecom Italia fecha um acordo com o grupo Opportunity, intermediado pelo investidor Naji Nahas, que permite o lançamento nacional das operações da TIM.

 

Novembro de 2004

Maio de 2005
Tronchetti Provera fecha acordo com Dantas e compra ações do Opportunity. O plano era assumir o comando na Brasil Telecom e também na Telemar.

capa_12.jpg
Fundos de pensão estatais fecham acordo para compra de ações do Citibank, entregam o comando da Brasil Telecom a Ricardo K. e impedem a ascensão de Tronchetti ao topo do mercado de telefonia brasileira.

 

Junho de 2005

Setembro de 2006
Tronchetti Provera prepara a venda de parte da Telecom Italia e da TIM. A participação acionária da companhia italiana na Brasil Telecom também já havia sido colocada à venda.

 
 

A Telecom Italia espera arrecadar ? 9 bilhões com a TIM, mais do que o governo obteve com a venda do sistema Telebrás