02/08/2006 - 7:00
No imaginário popular, o cientista é aquele sujeito de cabelos desgrenhados, que usa óculos com lentes grossas e vive enfurnado em um laboratório. Jefferson Roberto Gomes, de 45 anos, está longe de se encaixar nesse perfil. Ele é do tipo sereno que em nada lembra o estereótipo do ?professor Pardal?. Seu hobby é viajar com a esposa nos finais de semana prolongados e nas férias. Apesar disso, ele é o pai de uma das mais importantes inovações da história do País: o H-Bio, nome técnico dado ao diesel que leva óleos vegetais (soja, mamona ou dendê, por exemplo) em sua composição. Nascido em Sorocaba (SP) e graduado em engenharia química pela Universidade de Campinas (Unicamp-SP), com especialização em processamento de petróleo, Gomes precisou da ajuda de seis colegas e de apenas 18 meses para criar o H-Bio.
A obsessão do grupo era descobrir a ?mistura ideal? de óleo de soja para cada litro de diesel. Os testes variaram de uma proporção de 10% a 60%. A seqüência de ?alquimias? causou uma ?pequena catástrofe? na unidade-piloto de processamento do Centro de Pesquisas e Desenvolvimento da Petrobras, na Ilha do Fundão (RJ). ?Uma das fórmulas resultou em uma espécie de margarina que entupiu o reator?, recorda o pesquisador.
O esforço valeu a pena. Pode-se dizer que a inovação, cuja patente mundial deverá ser obtida em setembro próximo, é tão revolucionária quanto o Pró-Álcool. Isso porque o diesel representa 45% do total de combustíveis vendidos por aqui. Como de cada barril de petróleo são extraídos somente 36% de diesel, o País é obrigado a importar 204 mil barris diários desse derivado, uma despesa que somou US$ 1,02 bilhão no passado. Com o H-Bio será possível reduzir essa conta em 25% até 2008, número significativo, já que os investimentos em pesquisa e adequação das refinarias da Petrobras serão de apenas US$ 38 milhões. O custo, aliás, é o que o diferencia do biodiesel, feito integralmente de óleos vegetais e que exige a construção de uma planta específica. ?O H-Bio pode se tornar um componente estratégico na corrida global para reduzir a dependência do petróleo?, avalia Suzana Kahn Ribeiro, professora de engenharia de transportes da Coppe-UFRJ. Para ela, o Brasil abrirá mais uma fonte de divisas, com a exportação da mistura cuja venda começa pelos postos BR, em Minas Gerais.
Segundo Gomes, os primeiros estudos do tipo foram feitos na China, em 1949. No Brasil, os técnicos do Instituto Militar de Engenharia também já tentaram, sem sucesso, algo semelhante. Antes de submeter o tema à direção da Petrobras, Gomes fez alguns ensaios e descobriu que, usando reagentes, cujos nomes mantém em segredo, era possível unir o óleo vegetal ao mineral, usando o hidrogênio como catalisador. A direção da Petrobras deu sinal verde, mas não imaginava colher os frutos tão rapidamente. ?Foi uma grata surpresa para todos?, festeja o pesquisador. Ele minimiza as críticas de que o H-Bio pode enfraquecer o biodiesel. ?A falta de conhecimento gerou muita precipitação, inclusive no mundo acadêmico?, diz. Suzana, da Coppe-UFRJ, concorda. Para ela, trata-se de combustíveis complementares. ?O Biodiesel faz todo sentido no Nordeste onde não existem refinarias da Petrobras aptas a processar o H-Bio?, avalia. É por isso que a produção será restrita às plantas da Petrobras nos Estados das regiões Sul e Sudeste.
O sucesso de Gomes não é um ato isolado dentro da Petrobras. Faz parte do esforço iniciado na década de 70, quando a estatal intensificou seu programa de pesquisa. Somente neste ano, está sendo gasto R$ 1,5 bilhão nessa rubrica. O resultado dos investimentos na área pode ser medido pelas 58 patentes mundiais da companhia, além dos 141 pedidos de registros de marcas em 29 países. Graças ao H-Bio o engenheiro Gomes, que ingressou na estatal há 21 anos, está prestes a conseguir inscrever seu nome na galeria de inventores da Petrobras.