Elvis não morreu. Shakespeare era mulher. O Brasil vendeu a Copa de 98 para a França. O homem nunca pisou na Lua. Céticos, atenção. Em breve vocês terão uma baixa em seu arsenal de ?certezas incontestáveis para mesas de botequim?. O mundo está se preparando para voltar à Lua. China, Japão, Índia, Europa e Estados Unidos encabeçam uma nova e bilionária corrida rumo ao satélite natural da Terra. E aí não vai dar mais para dizer que a pegada deixada pelo astronauta Neil Armstrong em 20 de julho de 1969 é obra de Hollywood. O plano é colocar o homem em solo lunar novamente antes de 2020, conforme afirmou, em janeiro, o presidente George W. Bush ? devidamente escorado no orçamento de US$ 16 bilhões anuais da Nasa. Ainda não há dados oficiais de quanto esses países estão investindo em suas viagens estelares. Mas dá para ter uma base: o Projeto Apollo, que colocou treze astronautas na Lua entre 1969 e 1972, custou US$ 25 bilhões aos americanos, envolveu mais de 20 mil empresas (IBM, Boeing, Chrysler, Omega, Dupont) e deu origem a mais de 400 produtos inicialmente usados nas missões e depois lançados para o consumo (Teflon, forno de microondas, joystick, tintas anticorrosivas). A corrida de agora é um pouco diferente. Mais do que simplesmente ir, o homem quer se estabelecer e explorar as riquezas do local.

Os primeiros passos da nova aventura já estão sendo dados, e quem largou na frente foi a agência espacial européia. Nos EUA, Bush solicitou ao Congresso US$ 1 bilhão a mais para a Nasa gastar em 2005. Mas viu a verba virar poeira cósmica sob o veto dos deputados. Mesmo assim, o projeto Luna Roconnaissance Orbiter está mantido e deve começar em 2008.

O caráter colonizador da atual corrida espacial está trazendo à luz um lado até então desconhecido do satélite. O lado jurídico. Afinal, a quem pertence a Lua? É de quem chegar primeiro e montar sua barraquinha? Não. A Lua é uma terra com lei. O Acordo da Lua, de 1979, estabelece princípios sobre o uso e a exploração do local. O documento foi assinado por 14 países: Austrália, Áustria, Chile, México, Marrocos, Países Baixos, Paquistão, Filipinas, Uruguai, Guatemala, Peru, Romênia e, de peso mesmo, só Índia e França. Ele declara a Lua patrimônio da humanidade, que pode ser ?usado? por todos, mas não pode pertencer a ninguém. Esse acordo foi rechaçado pelos EUA por causa de dois artigos ? o que proíbe a instalação de bases militares e o que garante aos países pobres participação nos lucros obtidos em atividades econômicas por lá (mesmo que eles não tenham investido um tostão em o que quer que seja). ?Ao todo, cinco tratados regem a exploração lunar?, explica o jurista José Monserrat Filho, da Sociedade Brasileira de Direito Aeronáutico e Espacial. ?Eles são conhecidos como ?Big Five? (Os Cinco Grandes). Só os americanos se referem aos ?Big Four? (Os Quatro Grandes).?

Desatar esse nó terá grande importância quando se descobrir o real potencial econômico da Lua. Sabe-se pouco a esse respeito, por enquanto. A superfície lunar, por exemplo, contém substâncias que podem ser usadas como combustível em grandes reatores nucleares para geração de eletricidade limpa e barata. O subsolo é rico (mais do que o terrestre) em selênio, mineral importante na prevenção ao câncer. Também pode haver água congelada a meio metro de profundidade, o que facilitaria a instalação de bases científicas e o uso da Lua como trampolim para missões tripuladas a Marte. Afora isso, sobram projetos mirabolantes de empresas querendo faturar alto ou pelo menos aparecer. De condomínios residenciais com praia, restaurante, igreja, hospital e colégio a hotéis de luxo, tem de tudo um pouco. A empresa LunaCorp, dos EUA, quer enviar dois jipes robotizados rodeados por câmeras de vídeo. Via satélite, eles transmitirão imagens em 360º a quem os estiver guiando aqui da Terra, em salas instaladas em parques de diversão. O projeto tem até custo estimado: US$ 100 milhões. ?Em muitos aspectos, os negócios espaciais parodiam as companhias de comércio que serviram de instrumentos para exploração e colonização do Novo Mundo na época das Grandes Navegações?, avalia George S. Robinson, ex-procurador da Nasa. Eis aí mais uma boa discussão para se ter na mesa de um botequim.