DINHEIRO – O IBGE divulgou que o emprego industrial teve a sexta queda, registrando 0,6% em março.
CARLOS LUPI – O IBGE sempre divulga coisa ruim. O IBGE e os economistas. Eu tenho dificuldade em convencer as pessoas sobre diferenças de metodologias. O IBGE faz pesquisas que são amostragens da realidade de uma área, no caso a indústria brasileira. Caged não é pesquisa. São dados computados, todo mês, da realidade dos 7 milhões e 115 mil empresas brasileiras. O Caged é uma fotografia. O IBGE é uma pintura. A pintura depende da inspiração do artista. É óbvio que tivemos em janeiro, fevereiro e março uma queda, quando se compara com o ano passado. Mas em abril e maio estamos vendo uma força atípica em todos os setores. O setor automotivo está com 95% de produção. Praticamente todos os setores estão trabalhando acima do normal.

DINHEIRO – Mas então por que conviver com os dois sistemas?
LUPI – O IBGE não é sistema nosso.

DINHEIRO – Mas é do governo.
LUPI – O Caged é necessário para formular as políticas públicas. Para fazer seguro-desemprego, abono salarial. É o único órgão medidor das relações de trabalho que eu tenho. O IBGE, por sua vez, faz uma pesquisa que não é só do mercado de trabalho. Faz para a indústria, para o comércio. Mede tudo o que eles avaliam ser importante para se ter programas político-sociais do próprio governo. Em dezembro, quando tivemos 650 mil demissões, fui uma semana antes ao presidente e falei: “Presidente, estourou a boiada.” O Caged me permitiu fazer isso, não o IBGE.

DINHEIRO – E isso foi suficiente para preparar o governo para o pior?
LUPI – O aperto das linhas de crédito internacionais provocou uma queda brusca na produção. O Caged só apontou algo de que já tínhamos conhecimento, mas não dimensão. Desde dezembro começamos a tomar atitudes. O Banco Central agiu, a Fazenda zerou o IPI – e era necessário, porque as montadoras tinham estoque de três meses. Ainda assim, eu falei para a indústria que eles estavam cometendo um erro, uma precipitação. Eles estavam demitindo e teriam de contratar. Isso está gravado. Disseram que eu era louco.

DINHEIRO – Se o Caged é sua fonte de confiança maior, como será o resultado da fotografia de abril?
LUPI – Vai ser bem melhor que o de março. Não tenho como precisar um número, mesmo porque eu passo um hoje e chega uma empresa amanhã e demite ou contrata cinco mil pessoas. Mas não há como ser menor, isso eu garanto. A margem que temos coletado não dá espaço para isso. Toda hora vejo o Dieese e o IBGE falando das sete regiões metropolitanas. Quem disse que o Brasil são somente essas sete regiões?

DINHEIRO – Quais são as regiões ou setores que oferecem as melhores oportunidades de trabalho?
LUPI
– Estamos crescendo diversificadamente. A indústria continua em crise, é verdade. É um setor que tem um estoque muito alto, principalmente por causa das exportações. A indústria automobilística caiu bem, mas já está zerando o prejuízo. Quem ainda depende do mercado externo está com um estoque de 15 a 20 dias, por causa do mercado interno. Diminuíram muito o risco de produção. O setor de mineração é outro. Acabei de vir da China, que é o maior comprador do Brasil agora. A indústria vai se recuperar. A indústria alimentícia, que teve problemas graves em março, abril, vai superar essa fase em maio. O setor sucroalcooleiro, principalmente em Pernambuco e em Alagoas, que demite muito, pela primeira vez, desde janeiro, será positivo. E não só eles. O da construção civil está se recuperando muito bem. O de sapatos e couro, que estava caindo, voltou a crescer. Não no Sul, mas em São Paulo. Mais especificamente Franca. O dólar fez com que a indústria voltasse a ser competitiva.

DINHEIRO – Já há alguma sinalização de recuperação do setor automotivo?
LUPI – Não. Toda a cadeia continua em queda de emprego. Mas em diminuição gradual. Sem dizer o número exato: se era 50 em dezembro, caiu para 20 em janeiro, 10 em março, e caiu para 5 em abril. É uma proporção de queda no impacto da queda. Não é positivo ainda, mas são sinalizações fortes. Em compensação, construção civil, serviços, indústria alimentícia, agricultura, serviços públicos, ensino e o setor médico-odontológico estão firmes e fortes. A maioria dos 26 setores medidos pelo Caged já é positiva. A indústria, no entanto, ainda não – excluindo couro, borracha e alimentícia. Os números vão ser melhores a cada mês. Pode apostar.

DINHEIRO – Esses setores são voltados para o mercado interno. A que o sr. atribui isso?
LUPI – É o salário.

DINHEIRO – E por que o restante da indústria não conseguiu acompanhar?
LUPI – Porque são realidades diferentes. Diferentemente dos Estados Unidos, onde 85% da população tem suas necessidades básicas atendidas, aqui é o contrario. O que essa população vai comprar? Quem compra carro é a classe média, que está crescendo. Dá o seu de entrada e aproveita o momento do preço baixo. Mas o povão compra roupa. O Dia das Mães pode não ter aumentado o volume de gastos, mas tenho certeza que aumentou o quantitativo de compras porque o assalariado teve recuperação do poder aquisitivo. O mercado interno brasileiro é muito forte. O salário mínimo chegou a 62% acima da inflação. Em 1990, quando eu era deputado, lutava por um salário mínimo de 100 dólares. Todos diziam que o Brasil quebraria se fosse assim. Hoje vai a 225 dólares e quem quebrou?

DINHEIRO – Mas essa é uma realidade mundial, não?
LUPI
– Aí é que está. Fomos além disso. Dentro dos programas sociais essas pessoas passaram a comprar comida. A indústria alimentícia é a que mais cresce no Brasil, depois da construção civil, em termos de geração de emprego. Segundo: a inflação está caindo. O Brasil tinha muita gordura para queimar. Os bancos brasileiros não têm uma dificuldade sequer. Ao contrário. Os juros ainda estão altos porque a gordura é muito grande. Várias coisas encontraram o Brasil no meio da crise com uma situação bem diferenciada. O Banco Central se dá ao luxo de estudar se vai diminuir 1 ou 1,5 ponto percentual na Selic. Hoje, figuradamente falando, só não tem dinheiro quem não quer. O BNDES está pedindo mais dinheiro porque praticamente já esgotou as linhas de capital de giro. Tudo isso somado me fez levar a um raciocínio.

DINHEIRO – E qual é?
LUPI
– O Brasil, em 2009, vai crescer 2,5%. Todos os economistas vão mandar me internar.

DINHEIRO – Até a equipe econômica.
LUPI
– Que internem. Vai ser 2,5%. Por que estou falando isso? O Brasil vai viver um momento diferente do que ocorreu em 2008, quando a curva ascendente foi abrupta e caiu no mesmo ritmo. Esse ano teremos um crescimento mais suave, mas gradativo. Só por causa do mercado interno? Não. Começam a se recuperar as nossas vendas para os Estados Unidos. A balança comercial está equilibrada porque diminuíram as nossas importações. Quem tem dinheiro vai aplicar onde? Na bolsa. Ela vai estabilizar. Nenhuma tem a valorização que estamos tendo. E sem sobressaltos. Compare Paris, Nova York, Londres, Japão. A bolsa é o grande cassino da economia, ninguém joga para perder. A maioria vê a crise na tevê.

DINHEIRO – Não os que foram demitidos pela Embraer.
LUPI – Claro. Mas a empresa vai pagar um custo alto por isso. O custo que estão tendo na imagem mundo afora sobre isso é muito ruim. Eles já têm até uma pesquisa sobre isso.

DINHEIRO – E os brasileiros que viviam no Exterior e foram demitidos por conta da crise? Há alguma preocupação do governo sobre eles?
LUPI
– Já tomamos atitude. Conversamos com o Ministério do Trabalho do Japão e eles começaram a recuar. Agora já deram um prazo de três anos para o retorno dos brasileiros, mas ainda não é o ideal. Ao menos não é aquele prazo indefinido, do coitado ficar sem saber quando voltaria. Além disso, liberamos o FGTS para que eles retirem lá o que têm direito sem precisar voltar para o Brasil. Começamos a dar, principalmente em São Paulo e no Paraná, assistência em qualificação para os que já voltaram. Estamos trabalhando. O brasileiro era bom, quando foi para o Japão, para ajudar a construir. Na primeira crise eles mandam de volta? Isso é fácil para eles. E passei esse recado ao governo japonês.

DINHEIRO – Em relação à ampliação do seguro-desemprego para os trabalhadores, as centrais sindicais estão pedindo que o governo a estenda para outros setores. Isso vai acontecer?
LUPI – Criamos um critério técnico. Não posso fazer do Fundo de Amparo ao Trabalhador o “Topa Tudo por Dinheiro”. O dinheiro é público. Temos de ter responsabilidade. No ano passado tivemos 15 milhões de demissões. É muito alto esse volume. O que fizemos? Pegamos o parâmetro de dezembro, quando chegou a 650 mil demissões e foi o pior mês. Setorizamos isso por região e fizemos uma média, contando três meses após dezembro para identificarmos quem teve demissão acima da análise histórica e concedemos o seguro-desemprego.

DINHEIRO – Que setores receberam o seguro-desemprego?
LUPI – O metalúrgico, o da indústria mecânica, de borracha, fumo e couro. Não é quem eu indico, é quem está listado pelas estatísticas do Caged nesses meses atípicos.

DINHEIRO – O sr. foi um dos principais críticos da renovação da isenção do IPI sem contrapartida no emprego. Existem mais setores pedindo?
LUPI – Existem. O de automóveis não renova mais. Acabou. Na linha branca ainda é cedo para dizer, ainda mais porque não houve impacto no número de empregos. Mas os fabricantes de freezers e depuradores de ar já pediram. Vamos estudar. Se der resultado na linha branca, e acho que vai dar, podemos conceder.