06/11/2002 - 8:00
O cenário é de desolação e pobreza nas cidades palestinas sob o controle da frágil Autoridade Palestina. Mesmo o bunker de seu comandante, Yasser Arafat, apresenta sinais de decadência. Falar em riqueza ali parece um absurdo. Mas Arafat não está com uma mão na frente e outra atrás. O presidente da Autoridade Palestina controla um emaranhado de investimentos do governo autônomo palestino e da organização política que comanda paralelamente, a OLP (Organização pela Libertação da Palestina). Não se sabe direito onde acaba o dinheiro de um e começa o de outro, mas ele existe e não é pouco. Uma boa parte está sob o guarda-chuva de uma instituição conhecida como Companhia de Serviços Comerciais Palestinos (PCSC, em sua sigla em inglês). Trata-se na verdade de uma holding para investimentos, quase um fundo de investimento exclusivo do governo palestino. Segundo os últimos números disponíveis, a PCSC controlava US$ 345 milhões em investimentos no início de 2000.
Seu investimento mais emblemático é uma participação de 15% na empresa que engarrafa Coca-Cola na região, a Companhia Nacional de Bebidas. A participação é tão grande quanto a da própria companhia de Atlanta, símbolo mundial de capitalismo americano. Na Palestina, o investimento de Arafat deu às garrafas de Coca um significado novo. É comum ver carregamentos do refrigerante retidos em barreiras do governo israelense. O refrigerante, nos territórios, virou símbolo das desavenças entre israelenses e palestinos.
O maior investimento individual está indo de mal a pior devido ao permanente conflito na região. O fundo pôs US$ 60 milhões em um complexo de resort e cassino em Jericó, voltado para turistas que habitam o outro lado das trincheiras, em Israel. O governo israelense não gostou da idéia. O complexo está fechado.
Empréstimo. Arafat usou sua companhia de investimentos para tentar surfar também a onda das empresas de tecnologia. Um conselheiro de Arafat, Mohamed Rachid, ouviu em 1999 uma apresentação de uma companhia canadense de biotecnologia chamada Bioniche. Convenceu o presidente da Autoridade Palestina a colocar US$ 9 milhões na companhia. A PCSC diz que
comprou uma parcela de 10% da empresa, o que talvez seja
um mau negócio ? até agora, a Bioniche mostrou só prejuízos.
Mas diretores da companhia dizem que o que houve foi um empréstimo, e que a empresa paga aos palestinos juros de US$ 540 mil ao ano. ?Eles queriam investir em companhias que estão crescendo, para ajudá-los a construir um país?, diz Alberto Beraldo, vice-presidente da Bioniche.
A maior fonte de riqueza para Arafat e suas duas organizações, porém, está no controle que a Autoridade Palestina exerce sobre a economia local. Gasolina e cimento, por exemplo, são monopólios nos territórios autônomos, e o Estado tem participação no capital das empresas desses setores. No cimento, a PCSC tem 100%. Nas telecomunicações, detém 8% da Paltel e divide o comando com acionistas como a Padico ? uma companhia de desenvolvimento também do governo.
A confusão entre o dinheiro da Autoridade Palestina e o da OLP é tão inextrincável que Arafat foi buscar um ministro das finanças no mercado. Trouxe um palestino, Salam Fayyad, que foi do FMI por 15 anos e tem PhD em economia da Universidade do Texas em Austin. Fayyad admite que não vai ser fácil. Ele não sabe quanto dinheiro administrará, nem onde ele está. O chefe da inteligência militar de Israel, general Aharon Zeevi, diz que o líder palestino tem pessoalmente US$ 1,3 bilhão, sem separar dinheiro público de pessoal. De fato, Arafat chegou a receber repasse de imposto arrecadado por Israel em sua conta pessoal. Fayyad mandou reunir todo o dinheiro em uma só conta do Tesouro palestino.
Com Bloomberg News