20/12/2018 - 11:00
Há dois anos, o Brasil Plural lançou a plataforma de distribuição de produtos financeiros Genial, que já responde por metade dos cerca de R$ 40 bilhões administrados. Otimista, Riechert diz acreditar que a aprovação da reforma da Previdência deve trazer maior confiança aos investidores e atrair mais estrangeiros para o País. Nesta entrevista à DINHEIRO, além de projetar uma alta acentuada do Ibpvespa, ele aponta o patamar de apenas R$ 3,20 para o dólar no fim do ano. Neste caso, a razão para o recuo da divisa é expectativa de diminuição do ritmo de aperto monetário nos Estados Unidos.
DINHEIRO – O ano de 2018 foi muito complicado para o investidor. A eleição e a greve dos caminhoneiros provocaram muita turbulência no mercado e comprometeram o crescimento. Agora, os prognósticos são de um crescimento de 2,8% em 2019. Qual sua visão para o ano?
RODOLFO RIECHERT– Estou otimista. Na nossa avaliação, a economia deve crescer até 3,5%. O que justifica isso é que a inflação deve ficar controlada. Estamos sendo beneficiados pela queda no preço do petróleo, que já recuou 11,7% desde o início do ano. E também pelos custos da energia elétrica. Devemos operar menos com a bandeira vermelha.
DINHEIRO – Essa é sua única razão para estar otimista?
RIECHERT – Os prognósticos para a reforma da Previdência também são muito positivos. Não será a reforma dos sonhos, mas aquela que for possível fazer. Alguns pontos, como a mudança na idade mínima, já foram aceitos pela população. E com isso devemos ter uma injeção de otimismo no mercado. Outro ponto positivo é a equipe econômica. O novo governo indica que vai reduzir o tamanho do Estado e dar espaço ao setor produtivo. Alguns dizem que é difícil aprovar mudanças. Tudo é difícil. Ainda bem que entraram pessoas novas, porque com as antigas não estávamos conseguindo fazer nada. O discurso é bom, a equipe econômica é excepcional e aguerrida, não é um pessoal de passagem.
DINHEIRO – Como o senhor avalia a escolha de Roberto Campos Neto para comandar o Banco Central?
RIECHERT – Acho muito bom. O Ilan Goldfajn fez um trabalho excepcional no BC. Mas ele é um economista, que dava as diretrizes macroeconômicas para o Itaú. Já o Roberto sentava-se à mesa de operações do Santander e acompanhava o dia-a-dia do mercado. Claro que o Ilan deixou um legado importante, como a melhora da governança no Banco Central. Mas o que precisamos agora é uma pessoa mais mão na massa, menos teórica. O câmbio, por exemplo, tem de ser flutuante, mas às vezes o BC precisa atuar com mais força.
DINHEIRO – Como assim?
RIECHERT – Nós vimos neste ano que o BC deixou o câmbio disparar, o que cria uma expectativa ruim. Isso estabelece novos níveis para a moeda, que não volta mais aos patamares anteriores. O Roberto deve saber operar melhor isso, deixar o câmbio
mais estável. Há, ainda, o fator da competição. Não acho que seja possível criar competição com uma canetada. É preciso criar condições para competir. O Banco Central é muito engessado.
DINHEIRO – Qual deve ser o impacto dessas mudanças na economia e no governo sobre os juros, o câmbio e a Bolsa?
RIECHERT – O consenso do mercado é de uma taxa Selic ao redor de 8% no fim de 2019, mas nossa estimativa aqui no banco está abaixo disso. Pelas nossas contas, o dólar deve terminar o ano em R$ 3,20 e o Índice Bovespa pode chegar a 130 mil pontos, devido ao aumento da entrada de dólares no País.
DINHEIRO – Os investidores estrangeiros vão voltar?
RIECHERT – A bolsa está barata e a alocação dos investidores, tanto brasileiros quanto estrangeiros, está baixíssima. O brasileiro coloca pouco dinheiro na bolsa e o estrangeiro ainda não vai comprar Brasil enquanto não sair ao menos a reforma da Previdência. Tudo gira em torno dessa expectativa. Pois quando esse investidor foi para a Argentina e para o México, ele não se deu bem. Os estrangeiros estão olhando para os emergentes com cautela para não repetir esse erro.
DINHERO – Os empresários vão voltar a poder captar dinheiro na bolsa?
RIECHERT – Sim, mas o empresário que quiser listar sua empresa não pode perder tempo. Ele terá uma janela de seis meses para abrir capital. No segundo semestre, os recursos disponíveis deverão ser atraídos para os grandes lançamentos de empresas estatais que o governo deve realizar. Esperamos que sejam listadas partes das estatais, como Caixa Seguridade, Caixa Cartões e Banco do Brasil Cartões. Devem ser ofertas robustas, todos querem olhar e entrar. Por isso, acho que vai ter uma competição grande com o governo no segundo semestre.
DINHERO – Qual seu prognóstico para as aberturas de capital, conhecidas pela sigla em inglês Initial Public Offering, ou IPO?
RIECHERT – Haverá um grande aumento dos IPOs. Deve haver mais de 20 lançamentos de ações. Só aqui no banco estamos preparando quatro. Um deles é público, o do banco BMG. Temos outras quatro operações, cujos nomes eu não posso comentar. Duas são de tecnologia, com empresas que atuam em mobilidade urbana e em big data. Em uma delas, queremos ir direto para a Nasdaq [mercado eletrônico americano que engloba ações de tecnologia]. Tivit e Agibank também estão na fila.
DINHEIRO – Por que a escolha pelo mercado americano?
RIECHERT – As empresas de tecnologia, especialmente as de mais alto crescimento, não têm tanta confiança do investidor típico brasileiro. O brasileiro vai olhar para a empresa e duvidar que o empresário entregue o resultado que prometeu. No caso dos Estados Unidos, há mais demanda por esse tipo de empresa.
DINHEIRO – A empresa de meios de pagamento PagSeguro levantou US$ 2,7 bilhões nos Estados Unidos. Ela não teria conseguido captar isso no Brasil?
RIECHERT – Ela não teria levantado tudo. Quando a PagSeguro abriu capital na Nasdaq, ela tinha 30% do tamanho da Cielo, mas seu valor de mercado era o dobro. Essa avaliação também vale para a empresa de meios de pagamento Stone, e para a empresa de educação Arco. Ambas escolheram captar recursos nos Estados Unidos. Essa tendência de pegar empresas de alto crescimento para listar lá fora é uma boa alternativa para os empresários. Eles conseguem preços mais justos. Se o empresário conseguir entregar o que promete, a ação continua subindo. Se não entregar, a ação despenca.
DINHEIRO – Vamos falar dos riscos para o investidor. Que fatores domésticos podem afetar esses prognósticos positivos?
RIECHERT – Temos de ver como a economia vai se comportar em meio ao crescimento. Temos muito desemprego e capacidade ociosa, mas isso não é uma garantia de que a inflação não poderá subir. A crise espremeu as margens das empresas. No passado, quando as crises passaram, elas reajustaram os preços para compensar as perdas. Isso pode pressionar a inflação, especialmente nos setores em que a concorrência é menor. Por isso, a inflação talvez não fique tão baixa. Isso vai dificultar a queda dos juros, quebrando um pouco a dinâmica de recuperação.
DINHEIRO – E a relação do presidente eleito Jair Bolsonaro com o Congresso?
RIECHERT – Esse é um governo no qual as pessoas têm opiniões fortes, então alguns pequenos desencontros podem acontecer. Isso talvez seja o maior ruído. Outro ponto é que o governo vai encontrar um Congresso relativamente desconhecido. Eu acho que a necessidade de aprovação da reforma da Previdência é um consenso, mas negociar com o Congresso é sempre um risco. Você nunca sabe como os parlamentares vão abordar os temas. Porém, o Brasil é bastante presidencialista e quem tem a caneta sempre tem poder. Apesar de o Bolsonaro não ter escolhido os ministros na base do toma-lá-dá-cá, ele pode promover as emendas. E como os Estados estão quebrados, há menos espaço para deputados e senadores fazerem gracinhas.
DINHEIRO – Quais os maiores riscos no cenário externo?
RIECHERT – O maior problema para o Brasil é a economia americana superaquecida com desemprego zero, que provocaria uma escalada descontrolada de juros nos Estados Unidos. Mas esse não parece ser o caso. Os economistas estão prevendo apenas dois aumentos das taxas americanas para o ano que vem, em vez das três que previam anteriormente, o que é excepcional para nós.
DINHEIRO – Uma alta de juros nos Estados Unidos não pode provocar uma fuga de capital do Brasil?
RIECHERT – Temos de diferenciar. Há o capital especulativo, que vem para cá tentando ganhar com a diferença entre os juros americanos e brasileiros. E há o capital de longo, prazo, as empresas que vão fazer investimentos de cem anos por aqui. Todo o dinheiro é bom, mas o capital de longo prazo é o mais importante.
DINHEIRO – Como atrair esse investidor de longo prazo?
RIECHERT – O principal fator de atração é o petróleo. Os campos do pré-sal têm uma produtividade fantástica. O leilão de excedentes da cessão onerosa vai atrair, de saída, US$ 30 bilhões. Depois as empresas terão de fazer investimentos que são quatro vezes esse montante. São US$ 150 bilhões injetados na economia. Essa é a grande aposta do Brasil, mas estamos dando pouco valor a ela. Parece que o Brasil não enxerga a dimensão desse negócio.
DINHEIRO – A guerra comercial entre Estados Unidos e China preocupa?
RIECHERT – Não vejo ganhador para essa batalha. Se a China continuasse crescendo com a mesma força, ela se tornaria a maior economia global. E isso não agrada muito quem está na liderança. Ainda mais se os Estados Unidos avaliarem que o crescimento chinês decorre de uma política de concorrência desleal. A discussão é justa, mas eles vão se acertar, pois ambos perdem com essa guerra. E o mundo também vai perder.
DINHEIRO – A Genial Investimentos lançou no mês passado o primeiro fundo de investimentos em criptoativos do Brasil. Quais as expectativas para esse segmento?
RIECHERT – No futuro não vão existir ações, e sim moedas das empresas. As chamadas security tokens, que têm lastro em um negócio, são as mais promissoras. São ativos reais transformados em ativos virtuais, e isso tende a ganhar uma escala. Elas serão usadas para investimento. Isso pode ocorrer logo, ou ainda pode demorar um pouco, é difícil prever. As autoridades de diversos paises estão discutindo regulação, mas não acredito que isso seja necessário. Quem se auto-regula é o próprio mercado.