26/09/2014 - 20:00
A gaúcha XP é um dos poucos casos de sucesso no combalido universo das corretoras de valores. Fundada em 2001, a empresa criada pelos empresário Guilherme Benchimol e Marcelo Maisonnave conseguiu tornar-se a maior entre as casas independentes do País, aquelas que não estão ligadas a bancos de varejo. A receita para seu sucesso baseou-se em dois pilares. Um deles foi uma estratégia de crescer aceleradamente pela via das aquisições: foram quatro até 2014. O segundo pilar foi basear a distribuição de ações nos serviços de um exército de 1.500 agentes autônomos.
Mas nem tudo saiu como previsto. Em maio passado, Maisonnave deixou a sociedade. Agora, a XP enfrenta uma briga com o sócio que liderou a expansão no exterior. David Curley, ex-sócio da XP Securities, filial nos Estados Unidos, está processando a corretora. Em jogo, uma indenização que pode superar R$ 13 milhões, o equivalente ao lucro da XP no ano, segundo dados do Banco Central. A primeira audiência entre Curley, seus advogados e os representantes legais da XP ocorreu a portas fechadas no dia 2 de setembro e a próxima está marcada para janeiro.
Nela, o executivo – que trabalhou por 12 anos no banco de investimentos Merrill Lynch e foi gestor de fundos de hedge na administradora George Weiss, de Nova York – pleiteou um total de R$ 2 milhões em verbas rescisórias, além de salário e bônus. As partes concordaram em apenas um ponto: Curley foi contratado para ajudar a XP a expandir suas atividades nos Estados Unidos. A contratação deu origem à XP Securities, corretora com sede em Nova York e filial em Miami, que intermedeia negócios com ações, contratos futuros, moedas e títulos de renda fixa para clientes americanos.
A expectativa é de que a operação tenha uma receita de US$ 20 milhões em 2014. As divergências começam quando se discute a remuneração. No processo, Curley sustenta que foi funcionário da XP Investimentos e atuou como operador da mesa internacional em São Paulo. A remuneração “combinada”, segundo ele, era de R$ 30 mil por mês, mais um bônus a ser pago semestralmente. O americano também exige o ressarcimento de horas extras, além de verbas trabalhistas e rescisórias. Segundo a XP, o salário era de R$ 2,8 mil por mês. Nos autos, a XP alega que Curley nunca trabalhou no Brasil como operador e que apenas prestou serviços como consultor, assessorando a abertura da filial americana a partir dos escritórios em São Paulo. Para poder fazer isso como empregado, Curley precisaria ter obtido um visto de trabalho para estrangeiro, autorização que pode levar até um ano para ser concedida.
“Seria muito complexo tê-lo como empregado, por isso a XP decidiu contratar a sua empresa de consultoria, a Curley Capital LLC”, diz um executivo com acesso ao processo, que tramita em segredo de Justiça. “Quando o visto saiu, a operação já estava de pé.” Curley alegou ser “estranho um consultor com acesso a informações confidenciais trabalhar na mesa de operações”. Paralelamente aos trâmites no Brasil, há outro processo em curso nos Estados Unidos. Curley contesta os motivos de sua demissão, em julho de 2012. Segundo carta enviada pela XP, a justificativa é de que ele chegou 40 minutos atrasado a uma reunião e compareceu sem estar vestido de forma adequada.
Por sua vez, o americano garante não ter sido convocado para o encontro e diz que o verdadeiro motivo para a demissão foi sua insistência para que a XP Securities agisse de acordo com as melhores práticas exigidas pela autoridade local, o Financial Industry Regulatory Authority (Finra). Para resolver o assunto, a XP ofereceu pagar US$ 1,2 milhão, mas Curley não aceitou. Ele exige US$ 5 milhões, o equivalente a R$ 11,4 milhões, pelo que considera quebra de contrato e por sua participação de 12,5% na XP Securities. Por envolver direito trabalhista brasileiro e direito internacional, o processo está longe de acabar. Procurados pela DINHEIRO, a XP e Curley não deram entrevista.