22/05/2015 - 20:00
Com exceção dos corruptos, contra a corrupção somos todos. Assim como somos a favor da água encanada e da energia elétrica. O combate à corrupção não deve ser programa de governo. Deve ser um dever de todos os partidos e dos cidadãos, independentemente da cor, da ideologia, do sexo ou da religião. A despeito de todos os escândalos atuais, que nos chocam diuturnamente, o Brasil avançou na caça aos malfeitos, o eufemismo da hora para se referir a uma senhora idosa que desde os tempos de Pedro Álvares Cabral vaga por esta terra tropical, como se referiu a presidente Dilma Rousseff, recentemente.
Outros preferem chamar a corrupção de um câncer que precisa ser extirpado. Mas, como todo mal, ele precisa ser combatido com transparência e, principalmente, com a punição exemplar dos responsáveis pelos desvios de conduta e de dinheiro. Apesar de tudo, isso vem acontecendo. Políticos foram presos, dirigentes partidários viram o sol nascer quadrado e uma série de investigações tenta passar o País a limpo, como a Lava Jato, que chegou a sua 13ª fase na semana passada, e a operação Zelotes, que faz uma varredura em grandes empresas brasileiras, suspeitas de práticas pouco usuais para se livrar de multas milionárias, às vezes bilionárias.
O melhor de tudo é que essas investigações correm na mais absoluta tranquilidade, com as instituições democráticas funcionando a pleno vapor – é claro que alguns tresloucados pedem uma intervenção militar, mas acredito que esse clamor encontra eco apenas entre uma minoria desprezível de ouvidos. Dito isto – e que se registre que este artigo não tem a intenção de defender nenhum corrupto –, acredito que a maior mal do Brasil ainda é a desigualdade, o fosso social que separa os ricos dos pobres. Como disse o sociólogo italiano Domenico de Masi, em entrevista no início deste mês: “A corrupção sempre existiu no País.
O Brasil tem mil outros problemas para resolver…” Combater a iniquidade social talvez seja o mais urgente deles. Você pode acabar com a corrupção – algo difícil em qualquer sociedade. Mas se mantiver a desigualdade, nada muda. Desde a década de 1990, a desigualdade de renda vem diminuindo no Brasil e nos países da América Latina, segundo um estudo da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), que reúne 34 países, a maioria deles de economias industrializadas. O coeficiente de Gini, indicador que mede a desigualdade de renda e que vai de 0 a 1 (quanto mais alto, maior é a desigualdade), passou de 0,6 em meados dos anos 1990 para 0,55, uma queda de cerca de 8% entre nós.
Mesmo assim, o Brasil está atrás de México, cujo coeficiente é de 0,48, e de Chile, 0,51. É um claro indicativo de que muito ainda precisa ser feito. Na média dos países da OCDE, o coeficiente é de 0,32. O personagem Macunaíma, do escritor Mário de Andrade, dizia que “pouca saúde e muita saúva, os males do Brasil são”. Quase um século depois de o livro ser publicado, muitas coisas mudaram no Brasil. Mas ainda falta saúde à população. Se quisermos encarar nossos reais problemas, precisamos começar a combater a desigualdade nossa de cada dia. Como diria Macunaíma: “Ai que preguiça!”