01/06/2020 - 9:29
Banida em alguns países, incentivada em outros. O mundo está cada vez mais dividido sobre o uso da hidroxicloroquina no tratamento do novo coronavírus, desde a publicação de um polêmico estudo que considera a molécula ineficaz e até prejudicial.
Publicado em 22 de maio na revista científica “The Lancet”, o estudo conclui que a hidroxicloroquina (HCQ), um derivado da cloroquina usado no tratamento da malária, não é eficaz contra a COVID-19 e aumenta o risco de morte e de arritmia cardíaca.
A metodologia do estudo foi questionada por parte da comunidade científica. Métodos de estudos anteriores destacando sua eficácia também foram criticados.
– Banida em alguns países –
O estudo levou muitos países a suspenderem o uso da molécula.
Na França, onde o controverso professor Didier Raoult é um dos principais promotores da hidroxicloroquina, foi revogada em 27 de maio a permissão dada aos hospitais, no final de março, para fornecer esse tratamento a pacientes gravemente enfermos.
Outros países, como Itália, Egito, Tunísia, Colômbia, Chile, ou El Salvador, também suspenderam o uso da molécula em pacientes com COVID-19.
Várias nações já haviam parado de fornecer HCQ a pacientes antes da publicação do estudo. A Suécia, que a utilizou para tratar formas graves da doença, parou de usá-la em abril, depois que a Agência Europeia de Medicamentos aconselhou administrá-la apenas em ensaios clínicos.
O governo alemão também considera que “os estudos atuais não permitem o tratamento de rotina de pacientes da COVID-19 com cloroquina, ou com hidroxicloroquina, exceto em ensaios clínicos”.
– Promovida em outros –
Outros países elogiam a eficácia da molécula e não querem parar de administrá-la.
É o caso de Brasil, Argélia, Marrocos, Turquia, Tailândia, Portugal, Quênia, Senegal, entre outros.
“Tratamos milhares de casos com este medicamento com grande sucesso até agora. E não notamos efeitos indesejáveis”, disse à AFP o dr. Mohamed Bekkat, membro do comitê científico responsável pela evolução da pandemia na Argélia.
Segundo ele, o estudo publicado na The Lancet “é confuso”, pois “parece afetar casos graves para os quais a hidroxicloroquina é inútil”, enquanto a molécula “é eficaz quando usada precocemente”.
Índia e Venezuela continuam a usar HCQ preventivamente. As autoridades de saúde indianas garantem que não detectaram “nenhum efeito colateral importante”.
Cuba continua a usar a molécula, mas planeja revisar seus protocolos para introduzir novas precauções.
Nos Estados Unidos, a hidroxicloroquina pode, em princípio, ser administrada apenas a pacientes com COVID-19 hospitalizados, mas a Food and Drug Administration (FDA, agência responsável pela áreas de alimentos e remédios) alerta desde abril sobre riscos de arritmia cardíaca.
Defensor fervoroso da molécula, o presidente Donald Trump garantiu que a tomava diariamente como medida preventiva. Após a publicação do estudo na “The Lancet”, porém, disse que parou de usá-la.
No domingo, a Casa Branca anunciou o envio para o Brasil de dois milhões de doses de hidroxicloroquina para combater o coronavírus.
– Ensaios clínicos suspensos –
O artigo da “Lancet” levou à suspensão de vários ensaios clínicos, começando com a divisão da hidroxicloroquina dos programas Solidarity (OMS) e Discovery (Europa), que deixaram de incluir novos pacientes.
O estudo internacional Copcov, que fornecia doses de HCQ para profissionais de saúde em contato com o coronavírus, dois estudos conduzidos na clínica universitária de Tübingen, na Alemanha, e cinco estudos na Dinamarca também foram interrompidos.
– E outros mantidos –
Outros estudos continuam, porém, como o Recovery (Reino Unido). Com base em seus próprios dados de mortalidade, seus responsáveis acreditam em que “não há motivo convincente para suspender o recrutamento por motivos de segurança”.
Outros testes realizados no Canadá, na Nigéria, ou no México, também estão mantidos.
“Existem dados para provar que a hidroxicloroquina funcionou em vários pacientes. Então, vamos continuar”, disse a professora Mojisola Adeyeye, que chefia a agência nigeriana de medicamentos.
Na China, berço da pandemia, a substância é usada apenas em ensaios clínicos. Sua eficácia, que a Universidade de Wuhan considerou inicialmente promissora, foi questionada em um hospital de prestígio em Xangai.