10/01/2007 - 8:00
DINHEIRO – O sr. tem dito que vivemos, no mundo, um momento muito especial. Por quê?
LUIZ FERNANDO FIGUEIREDO – Porque o mundo nunca esteve tão bem. Nunca cresceu tanto, com inflação baixa. Os países nunca estiveram tão saudáveis. As regiões do mundo nunca estiveram tão boas. Para ter uma idéia, nos últimos trimestres o mundo cresceu mais do que nos últimos 30 anos. Só tem paralelo no início dos anos 70. E também do ponto de vista de liquidez e de apetite para investimento, nós temos vivido um momento especial nos últimos dois anos e meio ou três anos.
DINHEIRO – Não é o fim da festa agora?
FIGUEIREDO – Aparentemente, não. Claro que os ativos em geral já mudaram de patamar. No mundo. Não é só no Brasil. E esse crescimento muito grande, durante muito tempo, está cobrando seu preço. Há risco de inflação nos Estados Unidos, e o Fed vem subindo as taxas de juros. Hoje o mercado está muito em dúvida sobre o que está acontecendo. Algumas casas importantes acham que a taxa de juros, que hoje está em 5,25% nos Estados Unidos, no fim do ano vai estar em 7%. Outras acham que vai estar em 4%. E o próprio Fed diz: “Eu não sei, então eu vou esperar.”
“Se a inflação dos EUA cair mais, Bernanke vai ser chamado de novo Greenspan”
DINHEIRO – Qual a sua opinião?
FIGUEIREDO – Precisamos ver se teremos novas pressões de inflação. Uma commodity que é chave nesse processo é o petróleo. É preciso ver como ele vai se comportar. Se ele estiver em torno de US$ 60 (o barril), provavelmente a gente não terá pressão inflacionária. A inflação está num patamar ainda muito alto, que não é aceitável no longo prazo. Mas, se essa desaceleração trouxer a inflação para baixo, a aposta do Fed terá sido a mais correta possível. E aí provavelmente o (presidente do Fed, Bem) Bernanke vai ser chamado de segundo Greenspan.
DINHEIRO – O sr. parece otimista.
FIGUEIREDO – O que nós estamos dizendo é que o mundo continua com bastante liquidez, continua crescendo bastante, mas está se acomodando (em um patamar) um pouco menos exuberante.
DINHEIRO – Olhando para o Brasil, o que esperar do novo governo Lula?
FIGUEIREDO – Aparentemente, o segundo mandato será muito parecido com o primeiro. Não parece que a gente vai ter nenhuma crise relevante, que afete a economia. A economia brasileira está muito mais robusta, principalmente as nossas contas externas. Eu trabalho há 25 anos no mercado e nunca vi uma situação tão sustentável no Brasil como a atual. Mesmo que o mundo venha com alguma surpresa muito negativa, o Brasil consegue administrar isso com muita tranqüilidade.
DINHEIRO – Dado que não há reformas no horizonte, o que dá para esperar da economia?
FIGUEIREDO – O País vai continuar crescendo pouco, mas vai ter inflação baixa. Vai ser um país pouco dinâmico comparado com o resto do mundo. Mas também não vai ter crise. O Brasil já tem capacidade de ter uma taxa real de juro bastante mais baixa. Hoje está em torno de 8,5%, em termos reais, e vai gradualmente para algo como 6%, 6,5%.
DINHEIRO – Como isso reflete nos investimentos?
FIGUEIREDO – Primeiro, que, com o juro real mais baixo, existe uma mudança no comportamento do investidor. A taxa de conforto do investidor hoje é muito alta. Ele recebe quase 10% ao ano em termos reais (na renda fixa). Por que ele vai correr risco, com um retorno tão interessante? Agora, se o juro real for para 6%, 6,5%, essa taxa de conforto será muito menor. Na prática, quer dizer que o investidor, para ter mais retorno, vai aceitar tomar mais risco. De uma maneira mais macro, os ativos reais vão se valorizar vis-à-vis os ativos financeiros.
DINHEIRO – O que são ativos reais?
FIGUEIREDO – Empresas, negócios, imóveis, ações, coisas desse tipo. A nossa indústria de investimentos está muito concentrada em fundos. Existe uma cultura no Brasil de se investir em fundos. E os fundos brasileiros hoje têm muito mais o objetivo de acompanhar a taxa de juros overnight do que realmente trazer valor aos clientes. Mas isso está mudando.
DINHEIRO – Por quê?
FIGUEIREDO – Exatamente porque os clientes estão ficando com uma taxa de conforto cada vez menor em investimentos baseados na taxa de juro básica. Isso já tem levado vários ativos a mudar de patamar. Um exemplo muito bom é o do mercado acionário. Ele é outro hoje, comparado com o de quatro anos atrás. Hoje, as empresas abrem capital em vez de fechar, como faziam até alguns anos atrás. Se nós olharmos o preço das ações, as empresas que têm governança estão no Novo Mercado, têm preços muito próximos daqueles das empresas dos países do G-7.
DINHEIRO – As pessoas físicas perderam o medo da bolsa?
FIGUEIREDO – Para dar uma idéia, até alguns anos atrás, as pessoas físicas representavam 8% do volume da bolsa. Hoje, elas representam entre 20% e 25%. A indústria de fundos, aos poucos, está se modificando para atender a essa demanda dos clientes por ativos que tenham mais retorno, mas que tenham também mais risco. E a parcela que melhor representa isso talvez seja a dos chamados multimercados independentes, como é o caso da Mauá.
DINHEIRO – Na outra ponta dessa categoria, você tem hoje um processo de popularização dos fundos multimercados. O que isso representa para o investidor, em termos de oportunidades e riscos?
FIGUEIREDO – Eu acho que é uma oportunidade muito boa. Na verdade, a gente tem que entender que esses fundos mais populares têm um adicional não tão relevante de risco. Portanto, o adicional de retorno também não será tão relevante. Está certo, porque você tem que ir com calma nesse processo. Você não pode sair de um investimento sem nenhum risco para um investimento totalmente arriscado. É a sua poupança, então tem que ir com calma. O certo é começar com uma parcela pequena, coisa de 20%, exposta a risco e aumentar gradualmente.
DINHEIRO – Que mais há de novo no mundo dos investimentos?
FIGUEIREDO – Um outro exemplo de mercado que está só começando é o setor imobiliário. O crédito imobiliário no Brasil é 2% do PIB. No México, é 10% do PIB. No Chile, é quase 20% do PIB. Então, o Brasil tem um espaço gigantesco de crescimento. E com isso todo o setor e as empresas associadas a esse setor vão ganhar valor.
DINHEIRO – Há quem diga que estamos entrando em um boom imobiliário devido à iminência de o Brasil obter o investment grade.
FIGUEIREDO – Isso tem menos a ver com o investment grade do que com a taxa real de juros. Porque se você vir o tamanho de uma prestação de dez anos, de 20 anos com o juro menor, ela muda radicalmente. E traz para esse mercado uma demanda gigantesca. Esse mercado tende a se desenvolver muito.
DINHEIRO – Como se entra nesse mercado?
FIGUEIREDO – A gente tem que tomar cuidado porque às vezes as ações de empresas de construção já embutem muito desse crescimento. Mas as empresas todas que estão relacionadas a essa área tendem a ser muito beneficiadas. Nós aqui olhamos muito isso. Sabemos que virá uma onda de crescimento nessa área muito relevante. A questão é onde você consegue capturar melhor essa melhora. É através da compra de ações das empresas de construção? É através de ações de bancos, que vão dar muito crédito? Ações de empresas que de alguma forma são fornecedoras da indústria de construção civil, como alumínio e aço?
DINHEIRO – Fundos imobiliários são uma boa alternativa?
FIGUEIREDO – É uma alternativa quase de renda fixa que lhe permite capturar uma parcela dessa melhora. Mas não sei se você captura tudo. Para recursos que você não quer expor a muito risco, é uma alternativa muito interessante.
DINHEIRO – Olhando mais especificamente o ano de 2007, quais são as perspectivas?
FIGUEIREDO – Vários dos mercados, para as condições atuais, estão muito apertados. Eles se valorizaram bastante. Se você fala com um analista de ações, ele vai dizer que as empresas em geral não estão mais tão baratas. Os ativos já não estão num nível em que são, como no passado, uma barganha. Então a recomendação é que o investidor tenha sempre cautela, porque o risco de comprar um ativo no pico dele não é pequeno. Por isso, o ideal é investir através de fundos. Se quero comprar ações, mas sou um leigo nesse mercado, vou investir no melhor gestor que eu conheço, porque ele tem toda uma equipe que está 100% focada nisso. Então, a chance de comprar um ativo no pico é menor.
DINHEIRO – Acabou a era das barganhas?
FIGUEIREDO – A bolsa deixou de ser um mercado de barganha para ser um mercado mais desenvolvido. Por isso é que é importante investir através de um gestor. Porque ele está olhando não o índice da bolsa, mas que ações têm mais potencial. Você pode ter um mercado acionário sem as mesmas altas dos últimos anos, mas com muitas oportunidades.
DINHEIRO – A vida do home broker, que aplica sozinho, vai ficar mais difícil.
FIGUEIREDO – Ela tem ficado mais difícil, embora eles tenham tido bastante retorno. Cada vez mais é um mercado para profissionais. Ou aquela pessoa que está fazendo o investimento via home broker se especializa mais e mais, ou vai ter que investir através de uma empresa que tenha uma equipe inteira pensando em como investir melhor.
DINHEIRO – Teremos novidades no mercado em 2007?
FIGUEIREDO – Sem dúvida, nós vamos ter muitas categorias novas e o desenvolvimento de categorias que estavam paradas no tempo, como por exemplo a dos fundos de ações. No nosso caso, nós temos já um fundo de ações, que começou em maio, está sendo incubado por nós (ou seja, não foi aberto para clientes) e tem tido um retorno bem interessante. Nós achamos que, para este ano, o nosso fator de crescimento será muito mais essa família de produtos do mercado acionário.
DINHEIRO – O que o sr. quer dizer com categorias novas de fundos?
FIGUEIREDO – Vou dar o exemplo de um fundo que nós lançamos em outubro, que não existia no Brasil. Ele é um fundo que fica no CDI e só corre risco no momento em que o mercado está turbulento. Por exemplo, se o câmbio subir muito no Brasil, daí sim a gente toma uma posição em câmbio. É um fundo absolutamente oportunista.