O nariz do americano Robert Parker vale
US$ 1 milhão. Essa é a quantia que ele
receberá de uma seguradora se algum
dia o olfato lhe falhar. Parker é o mais respeitado enólogo do mundo. É homem
capaz de agitar os mercados de vinho. Até muito recentemente, os produtores de Bordeaux, na França, só divulgavam os
preços das melhores safras depois que ele atribuísse as notas ? e uma boa avaliação de Parker era sempre motivo de etiquetas com dólares a mais. Em 2003, contudo, será diferente. ?Primeiro definam os preços e somente depois divulgarei as notas?, disse Parker. A atitude do especialista americano, responsável pela revista bimensal Wine Advocate e por um ranking anual, foi
celebrada pelos amantes da bebida de
Baco. Os produtores torceram o nariz.
É que um aceno, uma palavra e, principalmente, uma nota assinalada por Parker podem fazer o preço de uma garrafa cair pela metade ou dobrar de valor.

Aos 54 anos, habitante do Estado de Maryland, nos EUA,
Parker transformou-se em mito. Gerou até o nascimento de uma expressão jocosa ? ?Mal de Parkerson? ? para definir os estragos resultantes de seus palpites. ?Há produtores que fazem vinhos especialmente para receber a nota máxima de Parker e deixam de cuidar da bebida como faziam antigamente?, diz Otávio de Campos Lilla, da importadora brasileira Mistral.

A menção do nome de Parker resulta em reações antagônicas. Recebe elogios por sua honestidade e talento ao degustar os vinhos, mas é criticado pelo modo como o faz. Os enólogos costumam avaliar as garrafas com estrelas que vão de uma a cinco. Parker pontua as bebidas de 50 a 100 e, com isso, as diferenças de qualidade tornam-se mais visíveis. Desse modo, um vinho com nota 91 perde espaço em demasia para um outro rotulado com um 93 de Parker. ?É uma escolha demasiadamente subjetiva?, diz Luiz Gastão Bolonhez, diretor da importadora de vinhos Expand, de São Paulo. Isso não o impede de cobrar até US$ 50 mil por palestra.

Napoleão. ?Ele tem uma memória degustativa e olfativa sobrenatural?, diz Bolonhez. ?Consegue lembrar de um vinho que experimentou há 30 anos.? Parker estima já ter provado 220 mil vinhos. Hoje, degusta, em média, 27 por dia. Começa com os tintos e parte para os brancos. Quem acompanha atentamente os rankings do crítico assegura que sua preferência são os mais encorpados. Os mais suaves penam para conseguir uma boa classificação. Os vinhos da Borgonha de onde sai o famoso Domaine de La Romanée-Conti (US$ 10 mil a garrafa, nas melhores safras) estão nessa lista de preteridos. Parker é odiado na região. ?Os produtores preferem ver o diabo a encontrá-lo?, diz Bolonhez. Parker, com a discreta arrogância de um nariz empinado por excelência, desdenha das diatribes das tradicionais vinícolas. ?Pouco me importa se o produtor foi amigo de Napoleão, se vive em uma propriedade centenária e se seus antepassados foram fornecedores dos reis da França?, diz. ?Só me interessa o que ele põe na garrafa e vende.?