04/11/2025 - 13:03
O Money20/20 USA é um dos maiores eventos dedicados ao setor de tecnologia financeira, inovação bancária e de serviços financeiros. A edição de 2025 aconteceu entre os dias 26 a 29 de outubro, em Las Vegas. Confira abaixo alguns dos principais pontos debatidos na conferência.
IA agente-autônoma (“agentic AI”) e personalização extrema
Um dos temas dominantes foi como a inteligência artificial evoluiu de ferramenta de suporte para agente autônomo que toma decisões, executa transações e interage com o cliente/merchant em tempo real. Abaixo alguns exemplos de aplicação:
• Gestão autônoma de fraudes e riscos: agentes de IA monitoram transações em tempo real, aprendem padrões de comportamento e bloqueiam operações suspeitas automaticamente — reduzindo falsos positivos e acelerando liberações legítimas.
• Atendimento e resolução de disputas em tempo real: agentes conversacionais integrados ao sistema de pagamentos analisam históricos, conciliam dados entre adquirente, emissor e cliente, e resolvem estornos sem intervenção humana.
• Otimização dinâmica de taxas e rotas de pagamento: a IA ajusta automaticamente a rota da transação (gateway, adquirente ou meio de liquidação) com base em custo, risco e performance, maximizando margem e aprovação.
• Gestão proativa de clientes e merchants: como uma evolução do NBA (next-best-action), agentes monitoram o comportamento de uso e interagem proativamente para oferecer upgrades, renegociar taxas ou prevenir churn, agindo como “gerentes virtuais de relacionamento”.
Por que isso importa para meios de pagamento?
• Autorizações de pagamento e prevenção de fraude podem deixar de ser “regras fixas” e passar a ser “agentes que aprendem” — melhor conversão + menor risco. • A experiência de pagamento pode se tornar mais personalizada: oferecer o método certo, no momento certo, para o cliente certo, com base em perfil, contexto e histórico.
• Do outro lado, exige governança robusta: transparência de decisões de IA, fallback humano, monitoramento constante.
Ativos digitais, stablecoins e infraestrutura cross-border
Outro eixo forte do Money20/20 foi a convergência entre os pagamentos tradicionais e o universo dos ativos digitais. A discussão deixou claro que o setor está migrando de uma lógica de sistemas isolados para um ecossistema interoperável, no qual stablecoins, rails alternativos e infraestruturas blockchain convivem com os meios de pagamento convencionais.
O foco não é mais “cripto versus tradicional”, mas como combinar o melhor dos dois mundos: a eficiência e liquidez das redes tradicionais com a programabilidade e liquidação instantânea dos ativos digitais. Essa convergência está transformando, sobretudo, os pagamentos internacionais, com uso crescente de stablecoins reguladas e infraestruturas cross-border tokenizadas que reduzem drasticamente custo, tempo e complexidade.
Essa integração já é visível em vários movimentos do mercado:
• Visa e Mastercard estão testando o uso de stablecoins como USDC em seus próprios settlement rails, permitindo liquidação quase instantânea entre emissores e adquirentes em diferentes países.
• O J.P. Morgan expandiu o uso do JPM Coin e da rede Onyx para pagamentos corporativos e liquidação de transações em tempo real entre filiais globais — um avanço que aproxima o sistema bancário tradicional da lógica on-chain.
• E no varejo, fintechs de e-commerce começam a aceitar pagamentos tokenizados ou em stablecoins, convertendo automaticamente para moeda local via APIs — tornando o uso de ativos digitais invisível para o consumidor final, mas vantajoso para o merchant.
Por que isso importa para meios de pagamento?
• Se você opera ou vai operar em múltiplos países/regiões, a eficiência de pagamentos crossborder pode dar vantagem competitiva (menos custos, melhor tempo de liquidação).
• A adoção de stablecoins ou rails alternativos pode trazer novas oportunidades — ou riscos — dependendo da regulação e aceitação.
• Mesmo para pagamentos domésticos, a lógica “internacional” (interoperação, liquidação eficaz, moeda digital) começa a influenciar as expectativas de mercado.
Método invisível de pagamento e experiência “embutida” (embedded payments)
Um ponto evidente durante o evento foi o movimento de o pagamento “desaparecer” da jornada do cliente — ou seja, o usuário não quer “ir pagar”, ele quer continuar comprando, e a transação acontece quase em segundo plano.
Embora o tema não seja novo — vem sendo debatido na indústria há pelo menos uma década —, o que muda agora é o grau de maturidade tecnológica e a escala de adoção. A experiência de pagamento fluido está se tornando o novo padrão, especialmente com a combinação de IA, biometria, tokenização e pagamentos instantâneos.
Exemplos práticos desse movimento incluem:
• Pagamentos por aproximação invisíveis, como os das Amazon Go Stores, onde o cliente apenas entra, escolhe e sai — e o pagamento é processado automaticamente.
• Superapps e carteiras digitais que integram pagamento e experiência, como Apple Pay, Google Pay e WeChat Pay, tornando o ato de pagar quase imperceptível.
• Experiências omnichannel no varejo, em que a identidade digital e o histórico de compra permitem reconhecer o cliente e processar o pagamento de forma contínua entre canais físico e digital.
Por que isso importa para meios de pagamento?
• A conversão (checkout) depende muito de quão suave e invisível é o pagamento: menos cliques, menos fricção, menos abandono.
• O merchant/cliente final vai preferir métodos que “já sabem quem é”, “já decidem método”, “já autenticaram” — menos passos.
• Isso exige integração forte (plataforma, banco, meio de pagamento) e foco em UX, identidade digital, tokenização. Um infraestrutura robusta de APIs é essencial para essa integração.
Privacidade vs personalização: o novo equilíbrio
Outro tema que ganhou destaque no evento — e merece atenção especial — foi o equilíbrio entre personalização e privacidade. O grande desafio agora é usar dados dos clientes para criar experiências de pagamento mais inteligentes e relevantes, sem comprometer a confiança, segurança e transparência.
Alguns exemplos práticos:
• Bancos digitais e emissores de cartões estão usando IA para ajustar limites de crédito, parcelamento e cashback em tempo real, de acordo com o comportamento de consumo e perfil de risco — sempre com consentimento explícito do cliente.
• Gateways e adquirentes aplicam modelos de machine learning para identificar a melhor rota de aprovação de pagamentos, equilibrando risco e conversão, mas mantendo anonimização total dos dados sensíveis.
• Superapps e carteiras digitais utilizam dados contextuais (como localização e histórico de uso) para oferecer meios de pagamento mais convenientes — por exemplo, sugerindo PIX, NFC ou QR code conforme o cenário, sem expor o histórico completo do usuário.
• Empresas de infraestrutura de dados, por sua vez, estão investindo em tecnologias de privacidade diferencial e data clean rooms, permitindo que múltiplos players colaborem em análises sem compartilhar dados brutos.
Por que isso importa para meios de pagamento?
• Uso de dados para prever método ideal, antecipar riscos, personalizar ofertas — isso agrega valor. Mas se o cliente se sentir “monitorado”, “sem controle”, pode rejeitar.
• Confiança é pilar — pagamentos dependem disso. Qualquer fricção ou desconfiança reduz adoção.
• Isso implica em governança, consentimentos, clareza, segurança de dados.
Conclusão & implicações práticas
Esses insights são extremamente relevantes — e o impacto sobre o setor de pagamentos já é tangível.
O grande desafio agora é colocar em prática essas inovações e gerar transformação real nos negócios. Abaixo, compartilho algumas sugestões para começar essa jornada:
• Visão estratégica: O ambiente de pagamentos está acelerando para “inteligência + dados + experiência integrada”. E o mercado de meios de pagamento precisa situar-se nessa evolução para manter relevância.
• Cliente/merchant no centro: O meio de pagamento não é o fim — é a peça que permite ao merchant vender mais, ao cliente pagar melhor. Qual o valor agregado que a Entrepay entrega (conversão maior? custo menor? experiência fluida?).
• Adaptação contínua: O ambiente regulatório, tecnológico, competitivo está mudando rápido (ex: ativos digitais, rails internacionais). Estar preparado significa testar cedo, falhar rápido, ajustar.
• Execução e foco: Os temas como IA, pagamentos invisíveis, infraestrutura internacional) são muito abrangentes, mas o diferencial será a execução com foco.
• Parcerias: Muitas das inovações dependem de ecossistema (bancos, fintechs, plataformas). Vale mapear parceiros estratégicos ou construir capacidades internas.
*Líder da área de Produtos e Inovação da Entrepay, com mais de 15 anos de experiência em meios de pagamento e tecnologia financeira
