18/06/2003 - 7:00
Lequetreque, aquele frango meio atrapalhado que usa óculos de motoqueiro e virou o símbolo da Sadia, anda cheio de ciúme de uma tal de Daisy. Ou melhor, Miss Daisy. Desde que ela chegou à empresa em 1999, os executivos do grupo não fazem outra coisa senão pensar na novata 24 horas por dia. ?Miss Daisy é muito boa?, diz um gerente da empresa. ?Tem grande potencial?, endossa o diretor comercial. ?Ela é o símbolo de uma nova era para a Sadia?, derrete-se o diretor de marketing. Para quem ainda não teve o prazer de conhecê-la, vamos às apresentações: a ?senhorita? Daisy é a marca de tortas e mousses da Sadia. Com ela, a empresa fechou um ciclo que teve início em 1997 quando a então criadora de frango, peru e suínos passou a apostar nos produtos de maior valor agregado. Em outras palavras, quando a agroindústria Sadia se transformou na Indústria de Alimentos Sadia. A estratégia era simples: estar na mesa do consumidor o tempo inteiro, do café da manhã à ceia. O plano era começar o dia com a margarina Qualy, ir para o almoço com os produtos ?in natura? e massas frescas, pular para a mesa de jantar com pizzas, frios e derivados de frango (nuggets, hambúrgueres…) e invadir a ceia com sobremesas Miss Daisy. Na mosca: em quatro anos o faturamento da empresa saltou de pouco mais de R$ 2 bilhões para R$ 4,6 bilhões e as exportações explodiram. No balanço do primeiro trimestre de 2003, os industrializados apresentaram crescimento de 34,6% em relação a igual período do ano passado. Hoje, os tais produtos de maior valor agregado representam 78% das vendas de
R$ 729 milhões no mercado interno.
Na semana passada, a companhia deu mais um passo na sua estratégia de invadir a mesa do brasileiro. A ceia da empresa não estaria completa sem um item obrigatório em qualquer cardápio de sobremesas: o sorvete. Numa parceria com a La Basque, do banqueiro e empresário Aloísio Faria, a Sadia colocou no mercado, neste mês, seus potes de sorvete Miss Daisy com 360 gramas e três sabores: creme, chocolate e doce de leite. Ao todo, vai gastar R$ 1,5 milhão em desenvolvimento e marketing. A novidade foi apresentada ao setor em recente feira realizada em São Paulo. Para atrair os consumidores, a empresa mandou fazer um carrinho de sorvete da Miss Daisy. Os primeiros a se aproximarem foram os executivos da Kibon, preocupados com o novo concorrente.
Os próprios diretores da Sadia trataram de tranqüilizar os colegas da Kibon. ?Nós vamos disputar apenas o segmento premium?, avisou o diretor de marketing Gilberto Xandó. Portanto, não esperem ver sorveteiros com jalecos da Miss Daisy oferecendo picolés nas praias brasileiras. O carrinho do evento em São Paulo foi puro marketing. A Sadia, na verdade, está desafiando outro concorrente: a americana Häagen Dazs. O mais curioso desta história é que a empresa brasileira não tem a mínima idéia do tamanho deste mercado. Não há cifras conhecidas nem estatísticas de crescimento do segmento. A Häagen Dazs não revela seus resultados. Os pontos-de-venda também não ajudam muito a dimensionar o consumo. A estréia da Sadia, portanto, foi motivada pelo desejo de completar a linha de sobremesas, pela estratégia de investir em produtos de alto valor agregado e por puro instinto de que há um grande potencial pela frente. Uma coisa a Sadia sabe. Ao produzir aqui, conseguirá cobrar metade do que a americana pede pelos seus sorvetes importados. ?Mas o nosso produto está uma categoria acima?, diz Rodrigo Bertoncini, gerente da marca Häagen Dazs no Brasil. ?Eles vão, no máximo, brigar com a linha premium de Kibon e Nestlé e com a própria La Basque.?
A parceria com a La Basque é de longo prazo. Embora não revele detalhes do contrato, Xandó afirma que não há, pelo menos por enquanto, a intenção de fazer dentro da Sadia os sorvetes Miss Daisy. De acordo com o executivo, a empresa também não pretende usar a rede de lojas da parceira para vender o produto, tampouco montar sua própria cadeia de sorveterias. ?Estaríamos entrando num negócio fora de nossa especialidade. E isto é arriscado.? O que surge de concreto é a possibilidade de exportar os sorvetes. A idéia é começar com países vizinhos e depois ganhar o mundo. Nada que surpreenda. Afinal, a empresa se acostumou a fazer boa parte de sua receita no mercado externo. E Miss Daisy não vai fugir à regra. Agüenta, Lequetreque!