19/05/2004 - 7:00
Impossível entrar na sede da Cia. Melhoramentos, em São Paulo, e não ficar intrigado com a decoração do local. As reuniões da diretoria, por exemplo, são feitas na mesa de jantar que pertenceu ao fundador da empresa, o alemão Alfried Weizsflog. Tem quase 100 anos. A chapeleira continua lá, ao lado da porta, para os distintos cavalheiros pendurarem chapéus e bengalas. À entrada de cada sala, misteriosas pias encaram o incrédulo visitante, que não sossega até que alguém vem explicar: ?Aqui os funcionários lavavam as mãos quando voltavam da fábrica.? Tudo não passaria de simples curiosidade se essas peças de museu não refletissem o jeito de ser da Melhoramentos até bem pouco tempo atrás: uma empresa lenta, dividida em uma porção de pequenos negócios que tinham mais a ver com a história afetiva da família do que com a realidade do mercado. Mas isso, ao contrário da decoração do escritório central, faz parte do passado. ?O grupo está mais ágil, mais enxuto?, reconhece Eduardo Macedo, diretor-superintendente contratado para colocar a emoção de lado e concentrar-se no que, de fato, sempre deu dinheiro à companhia: a produção de papel e celulose.
E assim está sendo feito. Os Weiszflog abriram mão do dia-a-dia da empresa, de uma gráfica, de nove livrarias e deixaram de fabricar produtos como talões de cheque, blocos de notas, molduras para quadro e até cercas de fazenda. Já não era sem tempo: a Melhoramentos acaba de voltar ao lucro após 10 anos consecutivos no vermelho e cresceu 30% em 2003, chegando a um faturamento de R$ 437 milhões. A empresa passou os últimos anos se reestruturando para absorver a compra da concorrente Kimberly-Clark, concluída em 1994. A aquisição foi um bem e um mal para a Melhoramentos. Com ela, a companhia dobrou sua capacidade de produção, mas assumiu as dívidas da Kimberly (US$ 11 milhões) e passou a fabricar produtos novos da noite para o dia. Sem falar no choque cultural. De um lado, uma multinacional americana, com executivos de várias nacionalidades e estilo moderno de administração. De outro, um grupo familiar, discreto e conservador. ?Não foi fácil digerir a compra?, diz Macedo. Desse tempo, sobrou uma dívida com o governo federal: R$ 100 milhões, renegociados no Refis.
O executivo, no entanto, já tem motivos para respirar aliviado. A Melhoramentos vem crescendo mais do que a média do mercado e roubando participação da concorrência na venda de papel. Isso graças a uma melhor distribuição, corte de custos e reforço de marca. A empresa passou a investir três vezes mais em marketing e voltou a fazer campanha na TV após sete anos no anonimato. Deu-se até ao luxo de contratar um artista plástico para criar as novas embalagens dos lenços de papel da marca Softy?s. O crescimento foi tanto que acabou fugindo ao controle. A companhia hoje não produz o suficiente para atender à demanda do mercado ? fecha o mês com estoque negativo de 100 mil peças de papel. Mas ainda há muito pela frente. Sobretudo no que se refere ao aumento da participação em mercados mais estratégicos. O grupo é líder em venda de lenços e guardanapos, produtos responsáveis por apenas 15% das receitas da Melhoramentos Papéis. Os outros 85% ficam com papel higiênico e toalha, categorias em que ela ocupa a terceira e segunda posição, respectivamente. ?O próximo passo é diminuir o desperdício da matéria-prima. Somos auto-suficientes em celulose. Se conseguirmos aproveitá-la melhor, sobrará para investir?, diz Macedo. Mas algumas coisas não vão mudar: a decoração antiga da sede e a permanência da Editora Melhoramentos nas mãos dos Weizsflog. Foi o início de tudo, e nela ninguém mexe.