Rua França Pinto, Vila Mariana, São Paulo. Um oásis de tranqüilidade perto da tresloucada Avenida Paulista. Numa casa cercada por um belo jardim oriental enfeitado com cabeças de dragão se esconde uma fábrica de sonhos. É ali que Walbercy Ribas, 60 anos, dá vida a seus personagens de animação. A lista é imensa e inclui ícones da propaganda nacional como a Barata Rodox, o Homem Azul do Cotonete, os Gatos da Eternit e o Grilo Feliz da Sharp. Os cerca de dois mil comerciais produzidos pela Start Desenhos Animados, a empresa de Ribas, conquistaram 50 prêmios em festivais brasileiros, americanos e europeus. Com um currículo desses, e tendo nas mãos uma companhia que, guardadas as proporções, poderia ser comparada à Pixar (de Procurando Nemo e Vida de Inseto), era de se esperar que Ribas estivesse com o ?burro na sombra?. Longe disso. ?É difícil ficar rico trabalhando com animação em um país como o Brasil, onde a criação não é valorizada?, desabafa. Mas ele continua tentando. Seu novo projeto é a continuação da saga do carismático grilo. Batizado de O Grilo Feliz ? A Aventura Continua, o filme está orçado em R$ 3,6 milhões e será feito com imagens em terceira dimensão, a mesma técnica usada pelos estúdios americanos. O lançamento, programado para o final do ano, e a campanha de divulgação deverão consumir mais R$ 1,3 milhão.

O primeiro a apostar na idéia foi o BNDES, que em dezembro comprou uma cota de patrocínio no valor de R$ 500 mil. O restante, Ribas está tentando captar junto a investidores por meio das leis Rouanet e do Audiovisual, de incentivo à cultura. Ao contrário de 2001, quando debutou na telona com o O Grilo Feliz e enfrentou sozinho, na base da paixão, o intrincado mundo do cinema, Ribas, agora, tem parceiros de peso. A começar pela Fox Filmes, que atuará como co-produtora. O desenhista também está negociando com uma emissora de televisão brasileira, cujo nome mantém em sigilo, a exibição dos dois episódios. ?Não vamos repetir os erros do passado, quando só depois de concluir o filme é que fomos atrás de uma distribuidora?, diz Juliana Ribas, 27 anos, filha do artista e produtora executiva da Start. Ela funciona como uma espécie de consciência crítica de Ribas, administrando o orçamento e o cronograma do longa-metragem com ?mão de ferro?. Assim, Ribas fica livre para fazer o que mais gosta: criar. Ele confessa que nunca foi bom com números e gestão. Tem sido assim desde que entrou para o mundo animação. Foi há 30 anos, quando esse ex-seminarista de Ribeirão Preto deixou o interior de São Paulo para tentar a sorte na capital. Arrumou um emprego numa produtora de comerciais e, a pedido de um colega, começou a desenhar. A carreira surgiu ao acaso. Em pouco tempo o autodidata Ribas descobriu-se um excelente animador. E não parou mais de criar.

 

Agora ele está de olho na trajetória internacional do grilo. A Televisa acaba de assinar contrato para exibir o primeiro episódio no México, EUA e Canadá. Mas Ribas, sempre cuidadoso com os temas de suas produções, foi obrigado a fazer concessões. O filme terá cenas de romance e de luta para atrair o público pré-adolescente. O roteiro inclui ainda uma forte crítica social. ?O louva-deus Faz-Tudo ameaça o plano do grilo de criar uma escola de música para crianças carentes?, adianta. Mas tudo tem limite, diz Ribas. ?Poderia fazer produtos descartáveis como os heróis japoneses. Em vez disso, prefiro produzir pouco mas com padrão alinhado com o que há de melhor nessa área?.

Ao contrário das gigantes do setor, a Start está totalmente ancorada no talento de seu dono. ?Preciso de apenas quatro auxiliares (entre os quais o filho Rafael, de 24 anos) para dar conta do recado?, diz Ribas. É uma estrutura enxuta, que ele consegue manter fazendo animação para comerciais. A lista de clientes inclui agências de publicidade do Brasil, México e Reino Unido e marcas como Kellog?s, Nestlé, Nabisco e Kodak. Juntos, eles rendem R$ 570 mil por ano à Start. O empresário acredita que a magia do grilo e a força dos parceiros (Fox e Televisa) ajudarão a amolecer o coração dos executivos das companhias que investem na área cultural. É o que esperam os fãs do grilo.