19/06/2015 - 19:30
O papa Francisco é uma figura admirável. Gosta de futebol, a mais importante entre as coisas menos importantes do mundo, como disse o técnico italiano Arrigo Sacchi (embora, no Brasil, a frase seja creditada ao dramaturgo brasileiro Nelson Rodrigues). Sua paixão é tamanha que creditam ao pontífice o título da Taça Libertadores da América conquistado pelo San Lorenzo, seu time de coração, no ano passado: ele teria rogado por uma intervenção divina. Até Jorge Mario Bergoglio ser eleito papa, o tradicional time argentino nunca havia chegado à final da principal competição continental, em 54 anos de história.
Mas Francisco também se preocupa com as coisas mais importantes e não se abstém de deixar clara sua posição – o que não significa, necessariamente, mudar os dogmas da Igreja Católica. Temas polêmicos, como casamento de pessoas do mesmo sexo, adoção por casais homossexuais e divórcio receberam sua atenção. Dessa vez, ele resolveu fazer duras críticas à relação do homem com o meio ambiente. E não poupou ninguém, dos países às empresas. Na carta encíclica, um documento pontifício que atualiza uma doutrina católica e define as posições da Igreja sobre temas da atualidade, divulgada na semana passada, pela primeira vez na história do catolicismo, o papa fala sobre ecologia.
João Paulo II e Bento XVI abordaram o tema, mas sem a posição firme e crítica de Francisco sobre o meio ambiente. Ele critica a política internacional de fachada, os acordos globais descumpridos e questiona o capitalismo selvagem e seu rastro de destruição, que não se preocupa com a exploração dos recursos naturais, o desperdício de alimentos ou as alterações climáticas. As empresas são chamadas de predadoras, sem piedade. Francisco exagera ao culpar todos, mas não deixa de ter uma boa dose de razão. De fato, um número considerável de empresas abraça causas ambientais apenas como ferramenta de marketing.
Preocupam-se com a limpeza de sua imagem e com as palavras bonitas que estão impressas nos cartazes mostrando como foi possível compensar toneladas de gás carbônico jogados na atmosfera. O capitalismo não aceita santinhos, muito menos caridade.
É valioso unir a palavra sustentabilidade de alguns selos verdes ratificando a ajuda a uma causa nobre. E o impacto do projeto? Poucos se importam. Preservar só vale a pena quando os lucros
chegam numa proporção muito mais alta.
Se todos os projetos sustentáveis que já foram divulgados fossem sérios, haveria a redução das emissões dos gases de efeito-estufa, como ficou acordado na proposta assinada por 189 países, entre eles o Brasil, no Protocolo de Kyoto, em 1998.
Entre 2005 e 2012, porém, as emissões cresceram mais de 16%. Há quem minimize o lado quantitativo e prefira destacar que, sem esse documento, a situação estaria pior. Francisco alerta para as Polianas que o mundo não é cor-de-rosa e muito menos verde, como se quer vender. Os políticos ficarão frente a frente com as críticas do papa na assembléia geral da ONU, em setembro deste ano, quando a redação final da encíclica será apresentada. Mas não se espere deles uma confissão de culpa. Como os empresários, eles concordam com causas verdes que rendam votos. Francisco só está atento à realidade e às falsas imagens que são vendidas como milagrosas. O papa é pop, o papa não poupa ninguém – os Engenheiros do Hawaii perdoem a reconstrução.