No artigo anterior, os leitores puderam acompanhar um diagnóstico das respostas que a pandemia do novo coronavírus está exigindo das lideranças do mundo corporativo. Com a fase da resposta emergencial superada e os ajustes da governança para sobrevivência no curto prazo equacionados, o fator determinante para que as empresas sejam bem sucedidas a partir do pós-Covid-19 é uma profunda reflexão estratégica com olhar à frente, na qual os CEOs devem assumir o papel de ‘Chief Reinventing Officer’ – ou seja, além de cuidarem das decisões executivas, precisam se dedicar à reinvenção dos negócios.

Esse movimento deve ser baseado em vários questionamentos essenciais e o desdobramento das ações deve ser alinhado de forma clara, sinérgica e integrada, com compromissos pactuados entre acionistas, dirigentes e gestores da empresa, além dos demais stakeholders do seu ecossistema.

É nesse momento que o papel do CEO como ‘Chief Reinventing Officer’ acontece na prática, de forma crucial para a construção do futuro da empresa. Ele precisa conduzir uma profunda reflexão embasada nos seguintes pontos fundamentais:

1- Definição clara de um novo propósito da empresa, da unidade de negócio ou da área funcional, capaz de inspirar as pessoas rumo ao futuro e reposicionar a organização perante o mercado. O que mudou na razão de ser da empresa como consequência desse período disruptivo e turbulento?

2- Reequilíbrio econômico-financeiro da empresa, da unidade de negócio ou da área funcional, com definição clara sobre sua situação de liquidez, padrão de endividamento e estruturação do capital, bem como ao que tange eventuais necessidades de monetização de ativos, parcerias estratégicas, linhas de crédito e financiamento, precificação, estrutura de custos, além do desejado grau de eficiência operacional.

3- Estratégia comercial com clareza na identificação dos clientes que a empresa se propõe a servir, incluindo o mapeamento de novos nichos, mercados, produtos e serviços que podem gerar oportunidades, decorrentes dos novos hábitos desenvolvidos pelos consumidores durante o período de quarentena e crise. Por exemplo, nos setores de entretenimento, lazer, educação online, telemedicina, e-delivery e meios de pagamento digital, entre outros, parece muito óbvio que existem novas demandas. E no seu negócio especificamente? O que o consumidor agora gostaria de desfrutar, mas era impensável antes? Quais novas categorias de clientes poderão ser alvo de novas soluções, a partir de competências já existentes ou que podem ser adquiridas rapidamente?

4- Definição dos resultados desejados, quantitativos como rentabilidade, faturamento, caixa, fatia de mercado e valuation, entre outros, quanto qualitativos, incluindo imagem e satisfação de clientes e colaboradores.

5- Organização do modelo de gestão e governança, com redefinição ou ratificação da filosofia de trabalho, estrutura, diretrizes, alçadas de decisão e processos organizacionais de controle, que deverão ser praticados para viabilizar os resultados desejados.

6- Elaboração do mapa de riscos por meio de análise minuciosa das áreas financeira, comercial, tributária, fiscal, ambiental, de saúde, segurança, relações governamentais, entre outras. As ameaças ou vulnerabilidades levantadas precisam ser controladas por planos de contingências e emergenciais. A questão chave é como mitigar riscos não percebidos antes e que, agora, são mais visíveis e podem impactar a empresa no futuro?

7- Prioridades no curto prazo, para fechar o ano de 2020; de médio prazo, para os exercícios de 2021 e 2022, e visão de longo prazo, contemplando o período entre 2023 e 2025.

Uma crise dessas proporções não permite postura protocolar de quem está no comando. A liderança precisa se posicionar e essa agenda estratégica é necessária para tranquilizar e engajar pessoas, clientes, parceiros, e investidores. Apresentar iniciativas, de forma estruturada e coerente, será fundamental para alinhar e comprometer os stakeholders com uma visão compartilhada, tanto das providências de curto prazo quanto sobre o futuro. Só assim aumentaremos a taxa de sucesso na execução, o eterno “calcanhar de Aquiles” da estratégia.

Adicionalmente à missão hercúlea de reinventar suas empresas, os líderes inspiradores também podem e devem se articular para estruturar propostas concretas que podem ser apresentadas a entidades de classe, formuladores de políticas públicas, entidades governamentais e institutos de pesquisa científica. Essa frente visa contribuir com o seu setor de atividades e a sociedade como um todo, tendo o cuidado de evitar qualquer tempero ideológico ou preferência política.

O papel de Chief Reinventing Officer (CRO) desponta como primordial para as lideranças das empresas que pretendem buscar o melhor desempenho, assim que a pior onda da crise passar. Novos ventos começarão a soprar e a retomada privilegiará aqueles que estiverem mais preparados. Sob a perspectiva pessoal, os líderes também precisam cuidar da auto-liderança, conforme abordei em outro artigo nesta coluna.

Por tudo que envolve o cenário atual, mais do que nunca, é preciso se transformar para ser o agente da transformação que sua empresa necessita e que o momento exige!