Jorge Paulo Lemann, um dos empresários mais audaciosos e bem-sucedidos do País, que fez da Brahma a maior cervejaria da América Latina, vive um pesadelo. E dos grandes. A primeira aquisição feita pela Garantia Participações, seu fundo de investimentos, corre o risco de virar pó. Trata-se da Artex, empresa têxtil comprada em 1993 e mais tarde transferida à Toalia, numa associação entre o GP e a Coteminas, companhia mineira do senador José Alencar. Pelo acordo, assinado em 1997, cada um dos sócios passou a ter 50% do negócio. Quatro anos depois, o fundo capitaneado por Lemann teria direito a trocar sua participação por ações da Coteminas, de acordo com uma fórmula vinculada aos indicadores financeiros da Toalia. O prazo termina em dezembro, mas para a Coteminas a empresa não vale nada. Zero. Lemann esperava receber algo entre R$ 80 milhões e R$ 120 milhões, ou cerca de 15% da companhia mineira. Como a distância é enorme, o caso foi entregue aos advogados e será decidido pela Justiça. Lemann acha que levou uma rasteira.

?A Coteminas geriu mal e desvalorizou a Toalia de forma intencional para incorporá-la por um valor irrisório?, diz o advogado Francisco Costa e Silva, ex-presidente da Comissão de Valores Mobiliários, que defende o GP. Embora os dois sócios tenham partes iguais no empreendimento, a administração da Toalia, que, além da marca Artex, possui fábricas em Blumenau e João Pessoa, ficou com a Coteminas. A empresa mineira tem três dos cinco votos no conselho. Isso foi feito propositalmente e na base da confiança, segundo o GP, para que a companhia fosse tocada por profissionais do ramo. Até porque o Garantia vinha de experiências frustradas na Artex ? a empresa acumulou prejuízos depois de trapalhadas gerenciais cometidas por executivos recrutados no mercado, mas que entendiam pouco do setor têxtil. Com a associação, Lemann pensava que a Artex finalmente ficaria em boas mãos.

Só que os problema começaram, segundo o advogado Costa e Silva, quando a Coteminas deu as costas para o GP e deixou de cumprir algumas cláusulas previstas no acordo de acionistas da Toalia. A empresa só poderia ter dívidas de longo prazo, com recursos captados no BNDES, até um teto de US$ 16 milhões. Deveria ainda fabricar 12 mil toneladas mensais de produtos têxteis. Mas não foi bem isso o que aconteceu. Hoje a Toalia deve quase R$ 190 milhões, a taxas de curto prazo, e o grande credor é a própria Coteminas. A suspeita do GP é que a empresa de José Alencar, um dos possíveis candidatos a vice-presidente na chapa de Luís Inácio Lula da Silva, tenha tomado dinheiro no BNDES a juros baixos e repassado os recursos, com custo altíssimo, à Toalia, numa manobra clara para desvalorizá-la.

Na Coteminas, a história que se conta é diferente. ?Aqui, nós apenas cumprimos contratos, trabalhamos dia e noite e nunca tomamos o que é dos outros?, filosofa, em estilo bem mineiro, Josué Christiano Gomes da Silva, presidente da empresa e filho do senador. ?Não fosse a gestão da Coteminas, as fábricas da Artex já teriam sido fechadas.? O executivo diz que irá processar todas as pessoas que tentaram minar a credibilidade da empresa. ?O nome é o nosso maior patrimônio?, afirma.

O fato é que, curiosamente, boa parte da reputação da Coteminas foi construída com um empurrão do Banco Garantia, quando a instituição ainda pertencia a Jorge Paulo Lemann, antes da venda ao Credit Suisse First Boston, em 1998. Foi o próprio Garantia que fez, em 1991, a abertura de capital e o lançamento de ações da empresa mineira. Durante muito tempo, a equipe do banco incensou Josué Christiano Gomes da Silva como um dos executivos mais profissionais e modernos do País. A Coteminas era a companhia que deslocaria todos os produtores nacionais, com um custo de produção inferior até ao dos fabricantes chineses. Com fábricas na área da Sudene, a empresa também se beneficia de uma montanha de incentivos fiscais. No auge, a Coteminas chegou a valer, em bolsa, mais de US$ 1 bilhão. Mas hoje tem uma avaliação próxima a R$ 620 milhões. Alguns acionistas minoritários já questionaram a suposta falta de transparência da empresa e o senador José Alencar foi justamente um dos poucos a votar contra a nova Lei das Sociedades Anônimas.