07/08/2008 - 7:00
DINHEIRO ? Algumas de suas previsões indicam que o petróleo ainda poderá chegar a US$ 500 ou até mais. Em que elas se baseiam?
MATTHEW SIMMONS ? A resposta é muito simples: Na lei da oferta e da procura. As previsões de preços que eu faço estão relacionadas com o fato de que a produção de petróleo parou de crescer. Na verdade, ela está até caindo. Enquanto isso, os sinais de expansão da demanda, provocados por países como Índia, China e outros emergentes, são evidentes. E nada indica que essa demanda esteja chegando ao seu limite.
DINHEIRO ? Mas isso basta para provocar uma elevação tão aguda do barril?
SIMMONS ? Se você levar em conta os custos atuais para ampliar a produção em 100 mil barris/dia ou para construir uma refinaria com capacidade para processar 600 mil barris de petróleo, verá que as contas não são absurdas. No primeiro caso, o custo estimado é de US$ 20 bilhões. No segundo, estamos falando em algo ao redor de US$ 35 bilhões. Isso explica por que os investimentos não crescem na velocidade necessária. E também nos leva a perceber que um acréscimo de US$ 50 ou US$ 60 nas cotações do petróleo até o fim deste ano é plenamente possível.
“A Petrobras é eficiente, mas o potencial das reservas de Santos não foi testado”
DINHEIRO ? Mas, neste caso, o preço atingiria um teto de US$ 200, não?
SIMMONS ? Isso pode acontecer ainda em 2008. Pelas mesmas razões que eu já mencionei, nada impede que, dentro de alguns anos, as cotações cheguem a US$ 600 o barril.
DINHEIRO ? Os países do Oriente Médio, que têm reservas gigantescas, não poderiam aumentar sua produção para suprir a demanda?
SIMMONS ? Os campos de petróleo remanescentes no Oriente Médio não são tão bons quanto aqueles já explorados. Em alguns casos, o óleo é muito pesado. Em outros, o petróleo fica sob rochas extremamente sólidas, o que aumenta o custo de extração. E o mais importante é que nenhum deles tem a dimensão dos campos supergigantes que permitiram ao mundo utilizar combustíveis baratos por tanto tempo.
DINHEIRO ? No seu livro sobre a região, o sr. fala sobre uma espécie de crepúsculo da era do petróleo no Oriente Médio. É isso mesmo?
SIMMONS ? Exatamente. Tanto é verdade que os países da região, a despeito das suas reservas, vêm tendo dificuldades para ampliar a produção.
DINHEIRO ? Muitos analistas argumentam que uma recessão nos Estados Unidos irá equilibrar a curva da oferta e da demanda, reduzindo os preços. O sr. discorda?
SIMMONS ? Uma recessão nos Estados Unidos, como a que se apresenta neste momento, seria capaz apenas de reduzir a demanda global em 1% ou 2%. Se ela vier a ser mais aguda, talvez haja uma redução de 4% ou 5% durante um trimestre ou mais. Mas isso é ainda muito insignificante quando se leva em conta a velocidade de expansão do consumo em mercados como os da Rússia, do Oriente Médio, da China, da Índia e da América Latina.
DINHEIRO ? Mas depois de chegar perto de US$ 150, o barril caiu com as notícias negativas sobre o estado de saúde da economia americana.
SIMMONS ? Nos últimos períodos acentuados de alta, houve momentos em que os preços, por alguma razão caíram, alimentando falsas esperanças de que a suposta bolha teria estourado. Depois, os preços retomaram a trajetória coerente com os fundamentos, que era a alta.
DINHEIRO ? É isso que irá acontecer?
SIMMONS ? Na minha avaliação, sim. Há pouco mais de um mês, o barril atingiu a cotação de US$ 136. Dias depois, caiu a US$ 121,50. Passaram mais dois dias e a cotação chegou a US$ 140. Isso demonstra que o grau de volatilidade nas negociações de curto prazo aumentou significativamente. E boa parte da queda verificada dias atrás decorre apenas do pedido de falência de uma trading de petróleo localizada em Oklahoma, nos Estados Unidos, mas as pessoas ainda levarão muito tempo para entender o que ocorreu (a empresa se chama SemGroup e não conseguiu honrar dívidas de US$ 3,6 bilhões). O fato mais importante, que deve ser levado em conta em qualquer análise, é que as condições de oferta e procura não mudaram nas últimas semanas.
DINHEIRO ? O Brasil anunciou descobertas importantes recentemente, como nos campos de Tupi e Carioca, com reservas que podem chegar a 8 bilhões de barris. Isso muda o cenário?
SIMMONS ? O Brasil já é uma das grandes forças do mundo do petróleo, em especial no domínio das tecnologias de perfuração em águas profundas. Além disso, a Petrobras, embora seja estatal, é uma companhia muito bem administrada. O problema é que as descobertas da bacia de Santos ainda terão de passar pelo teste da realidade. Para explorar a bacia, será preciso colocar lá mais da metade das plataformas em operação no mundo e manejar de forma adequada todas essas estruturas. Só então será possível checar qual é o verdadeiro potencial desses novos campos brasileiros.
DINHEIRO ? Recentemente, uma nova empresa brasileira de petróleo, a OGX, fez seu IPO e captou mais de R$ 6 bilhões. Isso não revela um grande potencial?
SIMMONS ? Não tenho informações suficientes para comentar o caso OGX. Na verdade, não tenho qualquer noção sobre seu verdadeiro potencial.
DINHEIRO ? Quais seriam as conseqüências políticas de uma alta tão expressiva do petróleo, como esta que o sr. prevê?
SIMMONS ? Com o barril perto de US$ 130, já estamos observando reações malucas e ilógicas em todas as esferas de governo nos Estados Unidos. Além disso, do ponto de vista econômico, os níveis atuais de preços estão criando ciclos de prosperidade em alguns setores da agricultura, como o etanol de milho, e até mesmo da indústria americana, que estavam parados há muito tempo.
DINHEIRO ? Há quem diga que a alta do petróleo coloca em xeque o american way of life, baseado numa mansão no subúrbio e no transporte individual num SUV. O sr. concorda?
SIMMONS ? Existem alternativas a isso. Uma delas é que, mesmo vivendo pode ser muito útil em sistemas de aquecimento.
“O etanol é uma parte pequena da solução para o problema energético global”
DINHEIRO ? Mas isso substitui o petróleo?
SIMMONS ? É muito difícil e é exatamente por isso que as minhas previsões indicam o barril a US$ 600. O mundo tem hoje 900 milhões de carros com motores que consomem derivados de petróleo em suas estradas e as novas tecnologias ainda levarão um certo tempo para chegar ao mercado. Na verdade, ainda é um desafio criar baterias que viabilizem efetivamente os carros elétricos.
DINHEIRO ? E que papel terão os biocombustíveis, como o etanol?
SIMMONS ? Os biocombustíveis podem ser uma solução para mercados menores, nos quais a chamada agroenergia não compete diretamente com a cadeia de produção alimentar. Caso contrário, a alta dos preços criaria conflitos internos. De qualquer forma, eles continuarão sendo apenas uma parte pequena da solução global, enquanto não avançarem as pesquisas em torno do etanol celulósico, que seria muito mais eficiente do que as alternativas atuais.
DINHEIRO ? Como o sr. avalia a política americana de incentivos ao etanol de milho?
SIMMONS ? O etanol de milho é um produto extremamente pobre do ponto de vista energético. Além de competir com os alimentos, ele utiliza um sistema de produção mecanizado que consome uma grande quantidade de combustíveis derivados de petróleo. Estes custos cresceram tanto que os fazendeiros já perdem dinheiro e ainda fazem parte de uma cadeia produtiva que encarece os alimentos.
DINHEIRO ? E o etanol brasileiro de cana?
SIMMONS ? É uma alternativa muito mais eficiente, mas que funciona apenas em regiões mais quentes e úmidas, em que a cana de açúcar se desenvolve. O etanol de beterraba, por sua vez, é uma alternativa ruim, por utilizar muita energia no seu processo produtivo.
DINHEIRO ? Os Estados Unidos deveriam reduzir a sobretaxa que impõem às exportações brasileiras, como propõe o candidato John McCain?
SIMMONS ? Essa tarifa é idiota. Mas, para ser sincero, não sei exatamente o que McCain pensa sobre o etanol brasileiro. Mas tanto ele quanto Barack Obama ainda não conseguiram enxergar a gravidade da questão energética e não montaram times de assessores competentes nesta área. Portanto, não se deve esperar muito nem de um nem de outro.