Peça para o dono dos Laboratórios Medley resumir em uma frase a trajetória de seu grupo, e a definição sairá mais ou menos assim: ?Deixamos a rabeira do grid de largada para conquistar a pole position?. O paralelo com o mundo do automobilismo não é ao acaso. O dono e principal executivo do Medley é Alexandre Funari Negrão, o Xandy Negrão, 49 anos, bicampeão brasileiro de marcas e pilotos e que hoje corre na categoria Stock Car. Em suas mãos, o pequeno fabricante de Campinas transformou-se no maior produtor de genéricos do País e no segundo grupo brasileiro do setor farmacêutico, perdendo apenas para o Aché. Dados do IMS Health revelam: o Medley foi o laboratório que mais cresceu no setor em 2001. O desempenho da equipe de Xandy Negrão num mercado dominado por multinacionais obedece a uma receita simples: não há nenhuma patente inovadora nem investimentos milionários em pesquisas. A fórmula combina uma atuação agressiva no segmento dos genéricos e parcerias bem montadas com fabricantes estrangeiros na linha farma (produtos tradicionais). ?Para competir com os grandes é preciso detectar rapidamente as oportunidades. E largar na frente?, ensina o piloto dos genéricos.

Foi assim, largando na frente, que Negrão descobriu o rentável negócio dos genéricos. ?Quando o ministro José Serra falou pela primeira vez sobre os tais remédios mais baratos eu voei para Brasília?, conta o empresário. ?Queria saber se o projeto realmente sairia do papel para que eu pudesse mergulhar de cabeça. Ouvi dele: vá em frente?. E foi. Conseguiu uma linha de financiamento de R$ 20 milhões com o BNDES, juntou outros R$ 20 milhões do cofre da empresa e preparou as máquinas para a produção. Hoje, o Medley vende cerca de 25 milhões de caixas de medicamentos genéricos por ano. ?Nós temos 110 produtos catalogados. Este ano vamos lançar outros 50?, revela Negrão.

Parcerias. Na outra ponta das operações ? a linha farma ? a saída para enfrentar os grandes era justamente unir-se a eles. O Medley fazia alguns produtos de boa aceitação no mercado, mas não havia nenhum hit saindo das máquinas de Campinas. Num acordo de co-marketing com a americana Abbott, o Medley descobriu uma droga potente em vendas: o Plenty, usado no tratamento da obesidade. O
remédio é derivado do princípio ativo sibutramina, desenvolvido pela Abbott. A parceira também produz o Reductil a partir desta molécula. A estratégia é simples: os laboratórios fazem o mesmo remédio, sob estampas diferentes. Este é o acordo de co-marketing, usado para diluir custos. Juntos, os dois vendem 27 milhões de cápsulas ao ano. O modelo deu tão certo que a dinamarquesa Novo Nordisk decidiu fazer o mesmo com um medicamento destinado a diabete tipo 2. E ainda cedeu à Medley os direitos de vender um produto para reposição hormonal.

No ano que vem, o piloto empresário abre novo laboratório em Brasília, o terceiro do Medley. A unidade vai produzir medicamentos de reposição hormonal, anticoncepcionais e fotoprotetores para uso clínico. Mais uma vez a parceria com estrangeiros se faz presente. Os protetores solares serão feitos em conjunto com a espanhola Esdin. ?Investiremos

R$ 5 milhões nesta fábrica?, diz Negrão. Outra novidade é o reforço na área de propaganda. Até aqui, o Medley investia no trabalho de campo junto aos médicos, para mostrar seus produtos, e em equipes de carros de corrida. É uma estratégia que se mostrou competente, mas limitada. Por isso, Negrão decidiu abrir novos canais de divulgação. Lançou o Medley na tevê com propagandas institucionais e passou a comprar cotas de patrocínio de programas esportivos. Este ano, a verba publicitária será de R$ 10 milhões. Com esses esforços, de marketing e produção, o Medley espera aumentar o faturamento para R$ 300 milhões este ano, contra os R$ 230 milhões de 2001. ?o Medley conseguiu dar a mesma força de vendas para os genéricos e os medicamentos tradicionais. Não há grupo brasileiro com esta sinergia nas operações?, diz o consultor Marcos Macedo, especialista no setor farmacêutico.

Esta poderia ser mais uma história de herdeiro que assume um grupo enxuto, com grandes perspectivas, e só tem o trabalho de dar continuidade à saga iniciada pela família. ?Eu só herdei dívidas e um laboratório prestes a fechar as portas?, conta o herdeiro. O Medley foi fundado em Campinas nos idos de 1930 pelo avô de Negrão. O pai assumiu anos mais tarde e até o início da década de 80 tudo parecia bem no pequeno laboratório. Nesta época, Xandy Negrão ganhava a vida como piloto de corrida. Em 1986, a luz vermelha acendeu no Medley. ?A empresa tinha dívidas monumentais, com bancos e agiotas, o patrimônio do grupo estava comprometido e só havia duas saídas: ou entrava em concordata ou fechava as portas?, conta Xandi Negrão. ?Me reuni com a família, assumi o comando e pedi concordata.? O avó morreu logo em seguida e o pai foi para o Nordeste. Negrão tirou o capacete, vestiu terno e gravata e partiu para a corrida contra os credores. Torrou parte dos imóveis da família para pagar dívidas, vendeu marcas do Medley, demitiu 220 dos 300 funcionários e, dois anos depois, saiu da concordata. Precisava voltar a crescer. Nesta época, o governo instituiu um programa de compra de remédios através da Central de Medicamentos. Eram grandes volumes de venda e o Medley conseguiu se tornar fornecedor do Estado. O caixa aumentou, a empresa recuperou a credibilidade e, em 1992, surgiu a primeira parceria com um grupo internacional. Negrão comprou a marca Parensini (antiinflamatório) do Merril Lepetit e conquistou o direito de comercializar outros produtos. O fantasma da quebra estava definitivamente afastado. Em 1999, surgiu o projeto dos genéricos. A partir daí, a história já é conhecida.