Claude Ruiz Picasso, administrador de uma fazenda e filho do famoso pintor Pablo Picasso (1881-1973), recebeu uma carta assinada por Pierre Le Guennec, um eletricista francês aposentado, em 14 de janeiro de 2010. Ao abrir o envelope, Ruiz Picasso deparou-se com 26 fotografias de obras de seu pai nunca antes vistas. A típica assinatura do gênio espanhol não estava em nenhuma delas, mas o traço era reconhecidamente de Pablo Picasso (1881-1973). 

 

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Tesouro escondido: nature morte à la pipe (1912), uma das obras que estavam com o eletricista.

Sem data e sem a assinatura do mestre

 

Cerca de nove meses depois, o tal eletricista e sua esposa, Danielle Le Guennec, 68 anos, apareceram nas instalações da Administração Picasso, em Paris, com uma mala contendo obras e cadernos com desenhos totalmente inéditos do célebre pintor. 

 

Os trabalhos foram avaliados e foi descartada a hipótese de falsificação, devido à competência, à variedade de técnicas e ao uso de determinados números nas obras que nenhum falsificador teria aptidão para reproduzir. O tesouro foi datado do período entre 1900 e 1932, fase considerada pelos especialistas como a mais fértil do artista, e avaliado em € 60 milhões (cerca de R$ 135 milhões). 

 

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Pierre Le Guennec: eletricista teria recebido uma fortuna em quadros, mas família de Picasso o acusa de roubo

 

O total do acervo recém-descoberto reúne 30 litografias, colagens, aquarelas e 200 desenhos, além de uma caricatura do crítico André Salmon e arabescos de estudos para As Três Graças, de 1923. A pergunta que agitou o mundo esta semana e que não cala na mente dos seis herdeiros do artista é: como o eletricista conseguiu obter estas obras sem assinatura e data de produção?

 

“Foi muito simples”, disse Danielle Le Guennec, em entrevista ao The New York Times. “Meu marido trabalhou em três propriedades de Picasso no sul da França: uma vivenda em Cannes, um castelo em Vauvenarges e uma casa de campo em Mougins (a cidade onde o pintor morreu em 1973).” 

 

Ela contou que um dia Picasso chamou Pierre. “E, sem nenhuma explicação, deu-lhe uma caixa e nunca lhe explicou nada”, disse Danielle. A caixa permaneceu por 40 anos na garagem dos Guennec. O eletricista só resolveu autenticar o conteúdo da caixa este ano porque começou a se preocupar com a herança que deixaria aos filhos. A família do artista não acredita na história do eletricista. 

 

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Picasso em seu ateliê em Vallauris, sul da França. Ele não deixava nenhuma obra sair

de seu estúdio sem sua assinatura ou sem estar datada

 

Picasso jamais deixava sair um quadro de seu estúdio sem ser assinado ou registrado com data. Os herdeiros se reuniram e decidiram apresentar uma denúncia por posse ilegal, no escritório central da Luta Contra o Tráfico de Bens Culturais. O órgão da polícia francesa então capturou a coleção na casa de Le Guennec e o mantém em um cofre, em Nanterre.

 

Thomaz Saavedra, consultor, no Brasil, da casa de leilões inglesa Bonhams, disse à DINHEIRO que, diante do tamanho do acervo produzido por Picasso, 271 obras não causarão um tsunami ao mercado das obras do pintor. “Não acredito em queda da cotação de seus quadros. Pelo contrário. 

 

Acredito que essa enxurrada de obras vai sim aguçar o apetite do colecionador, acostumado a pagar mais de US$ 100 milhões pelos quadros dele”, diz Saavedra. Ele também não acredita que o pintor tenha dado todas essas obras de presente. “Deixo para a Justiça uma solução para esse assunto”, disse Claude Picasso.